Conferência Episcopal Portuguesa debate esta sexta relatório dos abusos para decidir medidas. Comissão liderada por Pedro Strech vai entregar aos bispos um documento com os nomes do cerca de 100 padres ainda no ativo que são suspeitos de abusarem de menores
“É preciso esclarecer a questão do encobrimento”. Essa é uma das questões essenciais a debater, garante o Bispo Emérito D. Januário Torgal Ferreira, que esta sexta-feira está também presente na reunião dos bispos portugueses, que está a decorrer em Fátima, e durante a qual vão receber a lista dos cerca de 100 nomes de padres e religiosos que estão no ativo e que são suspeitos de abuso sexual de menores.
Os elementos da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa, liderada por Pedro Strecht, vão estar esta manhã a falar com os bispos. “Vamos entregar a lista com os nomes ao presidente da Conferência Episcopal, D. José Ornelas, e à tarde vamos entregar ao Ministério Público”, explica à CNN Daniel Sampaio, psiquiatra e um dos elementos daquela comissão, lembrando que ainda haverá encontros com as ministras da Justiça e da Solidariedade Social.
No entanto, o antigo bispo das Forças Armadas sublinha que é urgente ver esclarecida a acusação levantada por algumas pessoas sobre um alegado encobrimento destes abusos sexuais de menores por parte da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP). “Dizem que a CEP encobriu os casos e isso implica que todos nós, bispos, sabíamos do que se passava e eu, por exemplo, não sabia. É preciso perceber se alguém sabia e o que foi encoberto”, esclarece Januário Torgal Ferreira, dizendo que, ao longo dos últimos anos, os vários bispos nunca falaram abertamente entre si sobre este tema. “Temos de falar de forma aberta e honesta”, conclui.
Aliás, um dos assuntos que está a gerar mau estar entre alguns elementos da Igreja é a de os nomes poderem ser divulgados a todos os bispos e não apenas ao responsável das dioceses onde se encontram os padres abusadores, apurou a CNN Portugal junto de várias fontes. E alguns defendem mesmo que os nomes dos abusadores deviam ser entregues em envelopes fechados a cada um dos bispos.
Certo é que depois de receberam a lista e de falarem com os elementos da comissão que vão falar com a CEP, os longo do dia os bispos vão depois debater o que fazer perante os resultados do relatório de 486 páginas que estima existirem, pelo menos, 4815 vitimas de abusos sexuais por membros da Igreja, tendo validado 512 testemunhos. Testemunhos estes que dizem respeito a padres já falecidos, mas outros ainda vivos e em funções.
Uma das decisões que os bispos têm de tomar é o que vão fazer perante a lista de nomes. Há várias opções, como a suspensão dos sacerdotes ou a abertura de processos de investigação. No entanto, de acordo com fontes eclesiásticas, este pode ser um ponto sensível pois os bispos não podem ter acesso aos testemunhos que foram dados aos elementos da comissão, pois foram cedidos ao abrigo da confidencialidade. Uma situação que pode dificultar, referem aquelas fontes, um apuramento rápido do que sucedeu e da culpabilidade do alegado abusador. Segundo o Código de Direito Canónico, há regras a seguir para que os casos possam ser alvo de processo eclesiástico.
As medidas a tomar em relação a estes sacerdotes será um dos assuntos debatidos pelos bispos
Daniel Sampaio nota, porém, que cada um dos bispos já sabe quem são os alegados abusadores. “Os elementos que foram aos arquivos comunicaram-lhes quem eram os padres falados pelas vítimas”, recorda o membro da Comissão, salientando que espera que na reunião desta sexta-feira os bispos debatam questões como o apoio a dar às vítimas: “É importante uma rede de apoio no Serviço Nacional de Saúde para as vítimas que estão a pagar consultórios privados para terem apoio psicológico”. São respostas a questões como esta, diz Daniel Sampaio, que se espera que saiam da reunião da CEP. Até porque, nota, neste momento e depois de conhecido o conteúdo do relatório, “há vários movimentos católicos a exigir resposta da Igreja”.
Papa pede respostas para a "tragédia" dos abusos
Esta quinta-feira, o Papa decidiu lançar uma mensagem dedicada a todas as vítimas de abuso sexual. Na edição mensal de ‘O Vídeo do Papa’, considerou ser uma “tragédia” que ninguém deve ignorar ou desvalorizar.
“A Igreja não pode tentar esconder a tragédia dos abusos, quaisquer que sejam. Nem quando os abusos ocorrem nas famílias, em clubes, ou noutro tipo de instituições. A Igreja deve ser um exemplo para ajudar a resolvê-los, tornando-os conhecidos na sociedade e nas famílias”, avisou o Papa Francisco, que deixou um outro aviso sobre a importância de ser a Igreja a promover o apoio psicológico das vítimas, dizendo que tem de se “oferecer espaços seguros para ouvir as vítimas, acompanhá-las psicologicamente e protegê-las”.
As mensagens do Papa para o mundo chegaram a Portugal na véspera de os bispos portugueses se reunirem para analisar e decidir o que fazer com os dados do relatório divulgado em Fevereiro que revela os abusos que ocorreram no País, nos últimos 50 anos.
Ao longo do dia, os representantes das 21 dioceses do país vão debater que medidas devem ser tomadas, sendo certo que haverá alguma divisão entre os bispos. Até porque, como é sublinhado no relatório sobre os abusos sexuais, este tema e a forma de o abordar não reúne consenso entre os elementos mais importantes da Igreja nacional. Ou seja, se uns bispos parecem mais dispostos a admitir o conhecimento de casos e a necessidade de se tomarem medidas mais gravosas, outros são mais conservadores a lidar com o assunto.
Esta sexta-feira os bispos vão estar todos juntos numa Assembleia Plenária Extraordinária “dedicada, exclusivamente, à análise do relatório final da Comissão Independente para o estudo dos abusos sexuais”. O encontro vai começar às 10h00 e está previsto terminar às 17h00. Às 18h00 haverá uma conferência de imprensa, na Casa de Nossa Senhora das Dores, em Fátima.
“Esta é uma oportunidade para mudar de mentalidade e de pôr em prática as ideias do Papa”, defende o padre e vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa, José Pereira de Almeida, acreditando que toda esta situação irá levar a que se aposte mais na prevenção destes casos de abuso de menores no seio da Igreja. Além disso, acredita o especialista em Teologia Moral Social toda esta situação mostrou aos bispos que é preciso estarem mais próximos das pessoas.
Nos últimos dias, um grupo de católicos decidiu escrever mesmo uma carta aos bispos a pedir uma nova comissão para lidar com o problema dos abusos. Uma decisão que a CEP pode ser debater esta sexta-feira - dia em acaba a função da comissão liderada por Pedro Strecht que no último ano esteve a ouvir centenas de testemunhos que são conta que há abusos sexuais nos confessionários, nas sacristias e em muitos outros locais, por padres e religiosos da Igreja Católica.