Um "serial killer pedófilo" ("se eu dissesse que abusou de 50 é pouco") e outros casos de abusos nos escuteiros e em excursões da Igreja

13 fev 2023, 17:23

Vários relatos chegam de acampamentos de escuteiros. Um deles fala num "serial killer pedófilo" que terá abusado de 100 menores ESTE ARTIGO CONTÉM CONTEÚDO EXPLÍCITO QUE PODE CHOCAR OS LEITORES

"Perguntei-lhe se tinha medo e ele a chorar disse que sim e eu disse-lhe para ele se deitar na minha cama e assim dormíamos os dois e adormecemos, mas ele demorou tanto tanto a parar de chorar": um homem que hoje ainda não está na casa dos 40 anos nunca mais vai esquecer o verão de 2000 - nem ele nem dois amigos.

Estavam numa viagem de finalistas do sexto ano organizada pelo professor de Religião e Moral Católica, que os acompanhou e a toda a turma. Este testemunho é inédito e foi recolhido no inquérito online da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica. Nunca antes esta pessoa tinha falado sobre o caso.

Que se saiba, pelo menos ele e os seus dois colegas de quarto foram abusados durante a viagem: "Éramos os mais tímidos, talvez os mais medrosos", conta, sugerindo que isso possa ter justificado o interesse do professor, então com 30 ou 40 anos e que hoje ainda é vivo.

Exibição de zonas genitais, masturbação, beijos ou sexo oral foram algumas das coisas que o professor fez às três crianças. "Eu fui uma noite, o F noutra e o H foi duas vezes (a primeira e a última da viagem)", lembra, deixando um cenário em que um dos seus colegas "não aguentou".

"Chegou a meio da noite e vinha a chorar a chorar e estava sentado na cama dele no nosso quarto. Ele não disse nada e eu também não contei que já tinha sido vítima disso na noite anterior, desse tarado. Então perguntei-lhe se ele tinha medo e ele a chorar disse que sim e eu disse lhe para ele se deitar na minha cama e assim dormíamos os dois e adormecemos, mas ele demorou tanto tanto a parar de chorar", afirma o testemunho, que se refere ao professor como tarado uma outra vez.

"Massagens na tenda" dos escuteiros

Entre os vários testemunhos recolhidos pela comissão, vários são os que relatam casos de abusos em acampamentos e agrupamentos de escuteiros. Um deles dá conta de um padre com cerca de 30 anos que chamava os jovens à sua tenda para fazer "massagens". Chamava-os a todos e perguntava "quem não estaria cansado" depois de tantas caminhadas.

Hoje um adulto do sexo masculino, uma das testemunhas relata abusos sofridos já este século, quando tinha 15 anos. Entre ele e o padre houve beijos, masturbação e toque em zonas genitais. "Era em silêncio. Ia subindo pelo corpo, das pernas até cá acima, começando a aproximar-se dos genitais, onde acabava por tocar."

Nesse acampamento aconteceu por várias vezes e também existiram tentativas posteriores. Dos relatos recebidos, refere a comissão, pode comprovar-se que este não terá sido caso único. De resto, a própria vítima se pergunta "quanto terão sido tocados desta forma abusiva por ele?".

A maioria dos casos sinalizados envolve pessoas do sexo masculino, mas também há mulheres que sofreram abusos sexuais em instituições católicas e que decidiram relatar os seus casos. Com efeito, os números indicam uma maior prevalência de vítimas do sexo feminino em relação aos relatórios divulgados por outros países (mais de 30% das vítimas são mulheres).

É o caso de "F", que aos 16 anos foi vítima de abusos por parte do chefe dos escuteiros com quem estava a acampar. Nascida na década de 1970, contou no inquérito online que o alegado abusador tinha entre 25 e 27 anos.

É um dos casos em que o suposto agressor continua no ativo (a comissão enviou 25 casos destes ao Ministério Público, não se sabendo se este será um deles) e isso é o que mais indigna a vítima, que foi forçada a tocar em zonas erógenas do corpo e a dar beijos nas mesmas zonas. À comissão conta que se trata de alguém com "papel de relevo em situações da Igreja", sendo também "um conceituado professor universitário".

Uma outra vítima, um homem nascido na década de 1970, afirma que todos os membros do seu agrupamento foram vítimas de um padre nos anos 90. "Se eu disse 50 é pouco. 100 é de certeza mais próximo, até porque depois o psicopata foi para outro agrupamento mais perto de Lisboa", lembra sobre o padre a quem chama "serial killer pedófilo".

"Abusava. Dizia que eu tinha um órgão muito grande e que o queria ver, mexer, chupar", acrescenta, falando em exposição a zonas genitais, beijos, masturbação e até sexo oral. Abusos que se prolongaram, neste caso, durante pelo menos um ano e meio.

Igualmente da década de 1970, "M" tinha 11 anos quando começou a ser regularmente abusado por um chefe de agrupamento de escuteiros. Abusos que se prolongaram durante um ano e chegaram mesmo a decorrer no barco do alegado abusador.

Tirava-lhe fotografias do corpo, nomeadamente dos genitais. O passeio de barco, esse era um "prémio" para os "bons escuteiros", alguns dos quais chegaram mesmo a viajar para a Europa.

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