Corrupção, e-mails e compra de votos, versão olímpica

6 out 2017, 13:22
Carlos Arthur Nuzman

Presidente do Comité Olímpico Brasileiro detido, atribuição dos Jogos de 2016 sob suspeita. Os contornos de mais um escândalo de corrupção ao mais alto nível no desporto

Há pouco mais de um ano Carlos Arthur Nuzman discursava triunfante na cerimónia de encerramento dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Nesta quinta-feira foi detido por suspeitas de corrupção na candidatura brasileira. Ele é o presidente do Comité Olímpico Brasileiro (COB) e foi o responsável pela organização do Rio 2016 e esta é uma história que fala de um embrenhado esquema de ligações suspeitas e dinheiro por baixo da mesa a troco de votos. Uma sombra negra, mais uma, ao mais alto nível em torno das grandes organizações desportivas e das suas teias de poder e influências.

Agora há mais uma investigação concreta. Depois da FIFA e das suspeitas na atribuição dos últimos Campeonatos do Mundo, o processo de atribuição dos Jogos Olímpicos ao Rio de Janeiro foi apanhado no meio da mega-investigação Lava Jato e numa das suas ramificações, a que as autoridades brasileiras chamam Unfair Play, Jogo Sujo.

As suspeitas sobre Nuzman tinham sido tornadas públicas em setembro, quando as autoridades fizeram buscas na sua casa. Foi interrogado e privado do passaporte. Agora foi mesmo detido, ele e Leonardo Gryner, o seu braço-direito e que foi o diretor de operações do Comité Organizador do Rio 2016. São, segundo um comunicado da Polícia Federal brasileira, suspeitos de «corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa», e a detenção, temporária, acontece porque há suspeitas de que tenha tentado ocultar bens neste período.

Nuzman, 75 anos, é antigo jogador de voleibol e preside ao COB há 22 anos. A investigação acredita que será ele o «ponto central de conexão» de um esquema de um esquema «altamente sofisticado e de âmbito internacional», que envolve muita gente: do antigo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, detido desde junho, a Lamine Diack, antigo membro do Comité Olímpico Internacional e presidente da Federação Internacional de Atletismo, também ele detido por suspeitas de corrupção e encobrimento no caso das suspeitas de doping de Estado na Rússia. Diack, figura central do atletismo nas últimas décadas, teria em troca feito prometer valer a sua influência para garantir ao Rio os votos necessários.

Quanto aos dados concretos divulgados, há e-mails entre Nuzman, Gryner e Papa Diack, filho de Lamine Diack, que indiciam o pagamento dois milhões de dólares a três dias da decisão de atribuição da sede dos Jogos Olímpicos de 2016, em setembro de 2009. O Rio corria contra Chicago, Tóquio e Madrid e levou a melhor sobre a candidatura espanhola na votação final.

Esses pagamentos teriam sido feitos pelo empresário Arthur Soares, a quem chamam «Rei Arthur», suspeito em muitos dos casos que envolvem Sérgio Cabral e fugido à polícia desde setembro, quando as autoridades pediram o arresto de mil milhões de reais (271,2 milhões de euros) do seu património.

O jornal Globo cita a procuradora Fabiana Schneider a deixar clara a linha de acusação do Ministério Público Federal brasileiro: «Enquanto os medalhistas olímpicos buscavam a tão sonhada medalha de ouro, dirigentes o Comitê Olímpico guardavam o seu ouro na Suiça. A realização dos Jogos foi abastecida com dinheiro público.»

A investigação está em curso. E não fica por aqui, porque as suspeitas sobre o Rio 2016 e também sobre a atribuição dos Jogos Olímpicos seguintes, Tóquio 2020, não são novas. Já há um processo a decorrer em França, associado precisamente às investigações sobre Diack.

E desportivamente, o que acontecerá? Em setembro, aquando das primeiras suspeitas públicas sobre Nuzman, o presidente do Comité Olímpico Internacional tinha reagido com cautela. «Mudámos o processo de candidatura, temos novas regras, mas isso não nos torna imunes. Nenhuma organização é, nenhuma lei é perfeita. Vamos agir em cima das infrações. Isso é o que se pode esperar. Neste caso em particular, quando as evidências forem fornecidas, vamos agir. Agimos um ou dois dias depois das evidências sobre o senhor Diack», afirmou.

Agora, depois da detenção de Nuzman, a reação do COI continua a ser dizer que está atento. «A Comissão de Ética deu de imediato início a diligências, após ter tido conhecimento das acusações e investigação em curso. Em face dos novos indícios, a Comissão de Ética pode considerar medidas adicionais, prevalecendo em qualquer caso a presunção de inocência de Nuzman.»

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