Dos sete retalhistas contactados pelo ECO apenas a Mercadona divulgou alguns nomes dos seus fornecedores de marca própria. "O secretismo é comercial", afirma o diretor-geral da APED.
Com a escalada da inflação, as marcas próprias têm vindo a ganhar peso nas compras das famílias, representando mais de 40% da quota de mercado. Portugal é já o quarto país europeu que mais consome estes produtos, que chegam a representar até 80% da oferta dos principais supermercados a operarem no mercado nacional.
Contudo, o “secretismo” em volta dos fornecedores destes artigos é grande: dos sete retalhistas contactados pelo ECO, apenas a Mercadona divulga os nomes dos fornecedores. Ao ECO, o Ministério da Economia recorda que a lei de defesa do consumidor dita que a distribuição deve “informar o consumidor de forma clara, objetiva e adequada” sobre “as características principais dos bens”, bem como “a identidade do fornecedor e o preço total do bem”.
Numa altura em que o orçamento das famílias portuguesas está pressionado pelo aumento das taxas de juro para quem tem crédito à habitação, bem como pela subida do custo de vida, apesar de a inflação vir a dar sinais de abrandamento – que terá desacelerado para 1,6% em novembro, um mínimo em mais de dois anos – tem-se vindo a registar um crescimento das marcas próprias da distribuição.
Desde o início do ano até 8 de outubro, as vendas do mercado de grande consumo em volume cresceram 12,8%, face ao período homólogo, para 10.298 milhões de euros, segundo os dados do Scantrend da Nielsen IQ. Neste período, as marcas da distribuição já representavam 44,4% do total de vendas. Ainda no que toca as marcas próprias, o setor da alimentação ocupa as preferências, com 51,3% da quota de mercado, enquanto a quota de mercado na higiene do lar e pessoal cai para 39,2% e para 22,7% nas bebidas.
Esta tendência é, aliás, sinalizada pelos sete retalhistas ouvidos pelo ECO. Só na área alimentar, no ano passado, a marca própria do Continente atingiu os 925 milhões de euros, o que representa um aumento de 20% face aos 775 milhões de euros registados em todo o ano de 2021. E nos últimos três anos, estas vendas cresceram “quase 50%”, acrescenta a retalhista. Por sua vez, no final do terceiro trimestre deste ano, a marca própria do Pingo Doce “representava cerca de 28% das vendas totais” da empresa, o que contrasta com os 26,5% no final de 2022.
"No fim do dia quem beneficia desta concorrência entre retalhistas é o consumidor porque tem uma maior variedade de produtos, uma maior liberdade de escolha e, sobretudo, preços mais competitivos para fazer as suas compras”, diz Gonçalo Lobo Xavier, diretor-geral da APED.
Em linha com a Auchan, onde a marca própria “representa menos de 30%” das vendas, e com o Intermarché que está “muito perto de atingir os 26%” da faturação total, o que contrasta com os 20% alcançados entre 2020 e 2021. O peso da marca de distribuição é ainda mais expressivo no Lidl e no Minipreço, representando cerca de 80% e 53,69% das vendas, respetivamente, das empresas. O ECO questionou ainda a Mercadona, mas a retalhista de origem espanhola não divulgou essa informação.
Com milhares de referências expostas nas prateleiras dos supermercados, estes produtos tornam-se especialmente atrativos em momentos de crise, por serem mais baratos. Mas, afinal, quem os produz? Dos sete principais supermercados a operarem em Portugal contactados pelo ECO, apenas a Mercadona divulga os nomes dos fornecedores de marca própria. E a maioria rejeita também adiantar o número de fornecedores (ver tabela abaixo).
O “secretismo” não é exclusivo do mercado português, dado que também em Espanha este é também um dos segredos mais bem guardados das cadeias de distribuição, como recentemente escreveu o El País. Ao ECO, fonte oficial da Mercadona justifica a decisão de incluir a identificação dos fornecedores dos produtos nos rótulos das embalagens, com a sua “política de transparência”. Conta com “1.000 fornecedores portugueses”, entre os quais a Imperial, a Quinta de Jugais, a Casa Relvas ou a Lactifeita. Além disso, disponibiliza o “telefone de apoio ao cliente da empresa em todos os rótulos para facilitar o seu contacto com a empresa, caso seja necessário”.