Pensões antecipadas devem sofrer corte de 23% daqui a 15 anos, antevê Banco de Portugal

ECO - Parceiro CNN Portugal , Salomé Pinto
4 out 2023, 16:25
Mário Centeno (Lusa/Mário Cruz)

Fator de sustentabilidade pode aumentar quase 10 pontos face à penalização atual de 13,8% para quem começou a trabalhar em 2002 e se reforme antes da idade legal, estima o regulador da banca.

Quem se reformar antecipadamente daqui a 15 anos poderá perder quase um quarto da pensão a que teria direito, por efeito do fator de sustentabilidade, estima o Banco de Portugal (BdP) no boletim económico de outubro, divulgado esta quarta-feira. Se a este corte somarmos o da taxa de formação da reforma e a penalização de 0,5% por cada mês de antecipação, a redução poderá chegar aos 45%.

O corte pelo fator de sustentabilidade, que está nos 13,8%, poderá agravar-se em 10 pontos percentuais para 23%, antevê o regulador da banca, liderado por Mário Centeno.

“Estima-se que, para um indivíduo que entrou no sistema em 2002, essa redução possa ascender a cerca de 23%, tendo em conta as projeções para a esperança média de vida do Eurostat”, lê-se no relatório. Este é o cenário para um trabalhador que se aposente aos 65 anos, em 2038, ou seja, uma antecipação de três anos face à idade legal da reforma que o Banco de Portugal prevê que aumente para 68 anos, uma subida de um ano e oito meses face à baliza atual que está nos 66 anos e quatro meses.

Além deste corte, lembra a instituição liderada por Mário Centeno, “o sistema de pensões prevê outras penalizações para aqueles que optam por se aposentar antes da idade legal de reforma”. Ou seja, há ainda “uma redução na taxa de formação da pensão se os anos de carreira contributiva forem inferiores a 40 e uma penalização de 0,5% por cada mês de antecipação”.

“No seu conjunto, a redução na pensão inicial ascende a quase 45% para um indivíduo que decida antecipar a reforma em três anos, com 37 anos de carreira contributiva”, em 2038, de acordo com os cálculos do Banco de Portugal.

“O fator de redução corresponde a uma penalização de 0,5% por mês de antecipação e ascende a 18%, neste caso. A penalização por via da redução da taxa de formação por se considerar 37 anos de carreira contributiva é de 8%”, detalha.

“O fator de sustentabilidade desempenha um papel fundamental no sistema de pensões em Portugal, sendo utilizado para ajustar o valor das pensões com base na esperança média de vida da população”, indica o Banco de Portugal.

Este mecanismo foi introduzido em 2007 com a nova Lei de Bases da Segurança Social, passando a vigorar a partir de 2008. Atualmente aplica-se a todos os indivíduos que se reformem antes da idade legal de acesso à pensão, com exceção daqueles que aos 60 anos tenham uma carreira contributiva igual ou superior a 40 anos.

Existem ainda regimes especiais que permitem a reforma antecipada sem penalização, ou de acordo com regras específicas, como é o caso do desemprego de longa duração, de carreiras muito longas, de deficiência ou regimes específicos relacionados com a natureza da atividade profissional, ressalva o BdP.

O fator de sustentabilidade é determinado pelo rácio entre a esperança média de vida aos 65 anos em 2000 e no ano anterior à reforma e é aplicado à pensão estatutária, esclarece o supervisor. Ou seja, este instrumento é calculado dividindo o índice da esperança média de vida aos 65 anos de 2000 (16,63 anos) pelo valor apurado no ano anterior à reforma – por exemplo, este ano é de 19,61 anos -, subtraindo 1 e multiplicando depois por 100.

Corte pode subir pelo menos para 15,2% em 2024

Este ano, o Governo decidiu manter o fator de sustentabilidade nos 13,8%, apesar do aumento da esperança média de vida aos 65 anos. Se o Executivo aplicasse à atualização dos dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) em maio, o corte deveria atingir os 15,2%. Por isso, no próximo ano, a penalização deverá rondar pelo menos este valor.

Em 2021, o fator de sustentabilidade cortava em 15,5% o valor das reformas antecipadas. Em 2022, esse valor diminuiu para 14,06%, uma redução de 1,44 pontos percentuais, tratando-se do primeiro recuo desde que esta penalização começou a ser aplicada, em 2008. Ainda assim, o fator de sustentabilidade está longe dos valores de 2013, quando se situava nos 4,78%.

A partir daquele ano e por imposição da troika, a fórmula de cálculo do fator de sustentabilidade foi alterada, passando-se a considerar a esperança média de vida de referência de 2000 e não de 2006, como até aí, tendo-se registado logo no ano seguinte, em 2014, uma forte subida para 12,34%.

Em novembro, se o INE voltar a confirmar o aumento da esperança média de vida para os 19,61 anos ou para um valor em torno desse patamar, até porque já lá vai o fim da pandemia da Covid-19, é quase certo um agravamento do corte para quem se quiser reformar mais cedo.

Bonificação da reforma

O sistema possui também incentivos ao prolongamento da carreira. “Um indivíduo que se reforme depois da idade legal terá acesso a uma pensão bonificada. O valor dessa bonificação varia com o número de anos de contribuições, sendo que por cada mês a mais em relação à idade legal de reforma beneficia de um aumento de 1% no montante da pensão”, sublinha o BdP.

“A idade máxima para a bonificação são os 70 anos e o valor da pensão não pode ser superior a 92% da melhor das remunerações de referência que serviram de base ao seu cálculo”, de acordo com o relatório.

Se se reformar aos 71 anos, ou seja, um prolongamento da carreira por três anos, a bonificação é de 1% por cada mês que ultrapasse a idade legal de reforma com o limite de 70 anos, atingindo assim uma valorização da pensão em 24%, segundo as contas do Banco de Portugal.

Despesa cai à boleia das perdas dos futuros pensionistas: reforma vai valer apenas 44% do salário

A instituição liderada por Mário Centeno estima que a despesa com pensões de velhice em Portugal diminua a partir de 2035, depois de aumentos de 2,9 pontos percentuais (p.p.) do PIB entre 2000 e 2022. Este fenómeno é explicado pela degradação das pensões futuras. A Comissão Europeia estima que, em 2070, as novas reformas valham apenas 44% do último salário.

O agravamento dos custos com reformas nos últimos 22 anos esteve concentrado no período até 2014, até ao último do resgate financeiro operador pela troika. Nos anos seguintes, verificou-se uma ligeira redução que acabou por ser totalmente anulada nos anos afetados pela pandemia da Covid-19.

Se considerarmos a evolução da despesa das pensões com o sistema dos funcionários públicos, o aumento, entre 2000 e 2022, foi mais pronunciado, de 4,2 pontos percentuais do PIB.

“Nas projeções da Comissão Europeia, apresentadas no Ageing Report de 2021, é esperado que, mantendo as regras atuais, a despesa total em pensões de velhice aumente mais 1,3 p.p. do PIB até 2035, mas se reduza posteriormente apesar do envelhecimento da população”, escrevem os economistas do BdP.

Este alívio é explicado pela degradação das pensões. “O efeito do aumento da proporção de idosos na população ativa é contrariado pela redução das pensões médias face ao PIB por trabalhador”, indica o BdP.

Ou seja, uma análise ao rácio entre a pensão no momento da reforma e o último salário, designado por taxa de substituição, ajuda a compreender este fenómeno, salientam os economistas.

Em Portugal, a taxa de substituição das pensões, calculada em termos brutos, foi de 74% em 2019, a segunda taxa mais alta da área do euro, mas a Comissão Europeia estima que a taxa se reduza mais de 30 p.p. para 44% até 2070 e que fique em linha com a média da Área do Euro.

“Esta redução resulta das alterações legislativas que ocorreram a partir de 2002 e cujo efeito completo apenas se irá verificar quando se reformarem os indivíduos que iniciaram as suas carreiras após a introdução destas alterações”, justifica o BdP.

Dinheiro

Mais Dinheiro

Mais Lidas

Patrocinados