Rui Vitória: «Mais tempo de desconto se calhar não é a melhor solução»

6 set 2022, 17:10
«Perguntei a Rui Vitória as razões da derrota com o Lokomotiv e a resposta surpreendeu-me: respondeu-me que não tinha visto o jogo. Na viagem de Lisboa para Moscovo dava para ver três jogos inteiros», Zarema Salikhova, mulher do dono do Spartak, que se opôs à contratação do português, 24 de maio

Treinador defendeu que é preciso «arranjar maneira para que o jogo seja fluido»; Por sua vez, Luís Godinho explicou as indicações que os árbitros têm para melhor tempo útil de jogo, mas admitiu que este se adaptam ao contexto onde estão inseridos

Rui Vitória defendeu que aumentar os tempos de compensação nos jogos de futebol não é 'o passo mais indicado» para melhorar o tempo útil, mas sim promover a qualidade nos 90 minutos.

«Temos de fazer um esforço para que, nos 90 minutos, se perca menos tempo. Mais 15 minutos de jogo [nos descontos] não é, se calhar, a melhor solução, porque estamos a jogar mais de 90 minutos e, com a carga existente de jogos, não é o ideal. É um passo para compensar, mas o ideal é fazer tudo o que está ao alcance para que o jogo tenha 90 minutos, no máximo 90+2, em vez de 90+10. Não me parece que seja o passo mais indicado», afirmou, durante o Football Talks, que decorre na Cidade do Futebol, em Oeiras.

Na companhia de Luís Godinho, João Marcelino e Tarantini, restantes membros do painel «Tempo útil de jogo: Questões e desafios», o selecionador do Egito prosseguiu o raciocínio.

«Temos de arranjar maneira para que o jogo seja fluido. As paragens têm impacto enorme no cérebro dos jogadores e torna-se mais difícil reativar a parte mental. Quanto mais pararmos, mais difícil será. O passo é 90 minutos em que as coisas funcionem», frisou.

Para o técnico, um bom jogo de futebol é aquele que «é dinâmico e em que não haja paragens constantes», para além de ser um encontro «que provoca emoção, com duas equipas a combater de forma determinada, leal e com qualidade nos processos».

«O grau de incerteza e emotividade é um trunfo muito grande da modalidade. A questão do jogo corrido só traz mais emotividade e cria um jogo mais dinâmico, vivo e alegre», argumentou.

Segundo Rui Vitória, «em Portugal, está a haver uma mudança - e ainda bem que existe – muito consistente do que se quer para o futebol».

«Tem a ver com a tolerância que temos para com uma decisão. Se continuarmos a deixar andar a bel-prazer, isto vai continuar assim e nada se faz. Se houver regras claras, com uma palavra de mudança desta atitude, em que se pressionam os jogadores, isto gradualmente vai melhorando», considerou.

Rui Vitória aponta que o salto que se deve dar é no aumento de intensidade dos jogos, o que fará o jogador «ser melhor e mais competente para jogar ao mais alto nível», até para encurtar a diferença de intensidade para com os jogos das provas da UEFA.

«Onde se perde mais tempo é nos golos, nos pontapés de baliza e nos cartões. Se há um jogo com cinco golos, se calhar há cinco minutos de comemoração. Se há um jogo com muitos cartões e pontapés de baliza, perde-se mais tempo. Há indicadores que dá para atuarmos, mas é preciso juntar as pessoas e haver vontade para mudar», concluiu.

Por sua vez, o árbitro Luís Godinho explicou que há «instruções claras para deixar o jogo correr» e que, se um juiz não apitar «pequenas faltas», tem de existir «aceitação do critério» por parte dos protagonistas, o que nem sempre acontece em Portugal. 

«Também gosto de apitar ‘à inglesa’. Temos um compromisso enorme em contribuir para o tempo útil, mas os intervenientes têm de fazer com que não haja motivos para essas interrupções. Apitar ‘à inglesa’ é que o jogo flua, que os bancos não deem azo a motivos de discórdia e que aceitem esse critério do árbitro. Em Portugal, nós apitamos muitas vezes ‘à inglesa’, mas a nossa mentalidade e cultura faz desvirtuar isso», explicou. 

Este fator leva a que, muitas vezes, os árbitros portugueses se adaptem ao jogo, e não o contrário, indo de encontro às pretensões dos restantes intervenientes: «Quando um interveniente muda do futebol português para o inglês, joga à inglesa e a mentalidade muda. As pessoas adaptam-se à competição e às equipas onde estão inseridos», realça antes de dar um exemplo prático.

«Estive este fim de semana num jogo de futebol grego, entre Aris Salónica e PAOK. No final do jogo, perguntei-me se eu era o único, durante o jogo, que queria o jogo fluido. Quis dar leis da vantagem, não quis apitar pequenas faltas, mas nenhum dos jogadores queria correr. Comecei a perceber que ninguém queria isso e adaptei-me ao jogo. Se era falta que queriam, eram faltas que marcávamos», acrescentou. 

Luís Godinho lembrou que, já esta temporada, se viu um guarda-redes a ser castigado com um cartão amarelo por perda de tempo logo na primeira parte, e que o tempo de compensação tem sido aumentado cada vez mais.

«Se todos estivermos predispostos a não condicionar o jogo, o critério do árbitro será sempre largo. É importante fazer ver que maior qualidade de jogo trará seguramente uma melhor arbitragem em Portugal», esclareceu. 

O fórum Football Talks decorre entre segunda-feira e esta terça-feira, na Cidade do Futebol, com um programa vasto assente em temas relacionados com os cinco pilares estratégicos identificados no Plano Futebol 2030 da FPF: Infância e Crescimento, Futebol para Todos e Todas, Qualidade do Jogo, Envolvimento e Sustentabilidade do Ecossistema.

 

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