De noite, um ataque aéreo matou crianças. De dia, abriu-se um corredor humanitário: o que aconteceu durante a madrugada?

8 mar 2022, 08:20
Bombardeamento em Sumy, Ucrânia

A cidade de Sumy, com mais de 200 mil habitantes, foi alvo de um ataque aéreo que matou pelo menos 9 pessoas, incluindo duas crianças, durante a noite. Ao mesmo tempo, a ONU exigiu que sejam criados corredores seguros para que possa ser entregue ajuda humanitária nas zonas de conflito na Ucrânia

O avanço das tropas russas na Ucrânia abrandou “significativamente” durante a madrugada, antecipando um cessar-fogo limitado, anunciado pelo Kremlin, para permitir a abertura de corredores humanitários em cinco cidades. Incapazes de obter grandes vitórias militares, as forças russas estão a realizar uma campanha de bombardeamentos indiscriminada que está a aterrorizar moradores das cidades ucranianas e, segundo o governo de Volodymyr Zelensky, a recorrer a “saques e violações da Lei Humanitária Internacional sobre Conflitos de Guerra”.

A cidade de Sumy, uma das mais atingidas pela artilharia russa na última semana, foi uma das que Moscovo decidiu impor um cessar-fogo local e temporário a partir das 07:00 horas de Lisboa. Contudo, durante a madrugada, os habitantes viveram “uma batalha desigual contra o inimigo”, como descreveu o governador da região, Dmytro Zhyvytskyy, na sua conta oficial de Telegram.

 

 

Zhyvytskyy relatou que aviões russos bombardearam alguns locais da cidade, provocando vários feridos e pelo menos dez mortos, incluindo crianças. Sublinhando que “crianças estão a morrer”, o autarca questiona: “De que tipo de guerra e de que regras em geral podemos falar quando o exército russo mata, destrói, lança bombas em civis?!”

A interrogação do autarca de Sumy é condizente com o ambiente vivido noutras cidades onde decorre esta manhã um cessar-fogo temporário. Em Kiev e em Kharkiv, por exemplo, o Estado-Maior General das Forças Armadas ucraniano alertou para o facto de militares russos estarem a conduzir ações violentas contra moradores locais, nomeadamente forçando-os a abandonar as suas casas.

 

 

Até ao momento, segundo a ONU, já morreram pelo menos 406 civis na Ucrânia, entre os quais 27 crianças. As Nações Unidas estimam ainda que mais de 1,7 milhão de pessoas, principalmente mulheres, crianças e idosos, tenham deixado o país desde o início da invasão. Ao mesmo tempo, mais de 100 mil ucranianos já se juntaram às fileiras.

 

Refugiados ucranianos na Polónia (AP Images)

 

A grande maioria dos que saem do país atravessam a fronteira com a Polónia, sendo que, nesta altura, as maiores filas estão nos postos de controlo de Shehyni e de Krakivets. Mas os processos burocráticos têm dificultado o acolhimento de refugiados, especialmente no Reino Unido, onde um total de 589 pessoas já entraram no território a partir de Calais. Nesta fronteira-franco britânica, segundo a BBC, o Reino Unido recusou entrada a 286 ucranianos.

Por outro lado, o subsecretário-geral da ONU para os Assuntos Humanitários, Martin Griffiths, exigiu esta noite que sejam criados corredores seguros para que possa ser entregue ajuda humanitária nas zonas de conflito na Ucrânia. O apelo do responsável da ONU aconteceu durante mais uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da organização, em Nova Iorque. "Os civis em locais como Mariupol, Kharkiv, Melitopol e noutros lugares precisam desesperadamente de ajuda, especialmente de material médico para salvar vidas", alertou Griffiths. "Muitas modalidades são possíveis, mas devem ter lugar em conformidade com as obrigações das partes ao abrigo das leis da guerra", acrescentou.

Japão agrava sanções, China reforça narrativa de Putin e Rússia diz que Ucrânia se bombardeou a si mesma 

O Japão anunciou também durante a madrugada que vai impor mais sanções contra a Rússia e a Bielorrússia, incluindo o congelamento de bens detidos por uma série de membros do governo e outras entidades, mas também a proibição de exportações de equipamento de refinação de petróleo para a Rússia. No caso da Bielorrúsia, fica proibida a exportação de produtos de dupla utilização, anunciou o equivalente ao ministro da Presidência do Conselho de Ministros. 

Também são cada vez mais as grandes empresas japonesas que se estão a retirar do mercado russo. Mas não será o caso da Uniqlo, a maior cadeia japonesa de pronto a vestir, que tem lojas em todos os continentes.

Já na China, e ao fim de duas semanas de ambiguidade, colou-se finalmente à narrativa de Putin, contra os Estados Unidos e contra a NATO. Em declarações aos jornalistas à margem da sessão do Congresso Nacional Popular da China, o responsável pela diplomacia chinesa, Wang yi, reafirmou a “amizade sem lilmites” entre os dois países e garantiu que parceria entre Pequim e Moscovo está “sólida como uma rocha”, sem “interferências de terceiros”.

Mais surpreendente foram as palavras do embaixador da Rússia nas Nações Unidas, Vasily Nebenzya, que, na reunião de emergência do Conselho de Segurança, acusou os ucranianos de se estarem a bombardear a si próprios. Na reunião em Nova Iorque, declarou que civís estão a ser mortos por "radicais" ucranianos. As declarações provocaram a indignação de alguns representantes de outros países.

Na mesma reunião, a representante permanente dos EUA, Linda Thomas-Greenfield, contrariou esta versão e disse ser "evidente que o senhor Putin tem um plano para brutalizar a Ucrânia". "O custo humanitário da guerra do Presidente Putin contra a Ucrânia está a aumentar. As crianças estão a morrer, as pessoas estão a fugir das suas casas - para quê?"

Tendência continua: petróleo sobe, mercados em queda

Os mercados de ações estão em queda novamente esta terça-feira, sem sinal de um abrandamento do impacto económico provocado pela guerra. O petróleo Brent, referência na Europa, voltou a subir 2,48% para 126,26 dólares - um valor atingido após a subida violenta esta segunda-feira quando chegou a ultrapassar brevemente os 139 dólares.

Na Austrália, o índice do mercado de ações ASX200  terminou a cair 0,83% e no Japão, o Nikkei caiu mais 1,5%. Também em Seul, o Kospi caiu 0,7% . Os mercados chineses sofreram, igualmente, o mesmo destino, com Xangai a cair 1,36%. 

Estes valores foram atingidos enquanto congressistas democratas e republicanos nos EUA anunciaram estar de acordo para aprovar uma lei que proíba a importação de petróleo russo. Estas iniciativas legislativas bipartidárias também deverão atingir todas as restantes importações de produtos da Rússia e da Bielorrússia. As proibições deverão ser aprovadas já esta semana.

Em retaliação, porém, a Rússia ameaçou cortar o fornecimento de gás natural, acenando com um aumento dos preços que pode chegar aos 300 dólares por barril de crude.

Do petróleo à alimentação, os alertas sobre as consequências do maior conflito em solo europeu desde a Segunda Guerra Mundial partiram também da Alemanha, onde o ministro da Agricultura, Cem Oezdemir, afirmou que o fornecimento de alimentos na União Europeia pode enfrentar um período de escassez e o preço pode aumentar, especialmente nos países - como Portugal - que batalham contra a seca.

"O fornecimento de alimentos na Alemanha e na União Europeia é seguro, mas uma escassez maior pode ser esperada em alguns países fora da UE - especialmente onde a escassez já reina devido a questões como a seca", disse o ministro, acrescentando que "os aumentos de preços de produtos agrícolas também não podem ser excluídos nas nações industrializadas."

As declarações de Oezdemir foram feitas depois de ter sido anunciado que a Alemanha irá oranizar uma reunião virtual de ministros da agricultura dos países do G7 para discutir o impacto da invasão da Ucrânia na segurança alimentar global. Um dos objetivos será a implementação de estratégias para estabilizar os mercados de alimentos.

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