Tratamento de abusadores da Igreja deve ter “caráter de obrigatoriedade”, defende Rute Agulhas

Agência Lusa , DCT
17 fev, 08:12
Rute Agulhas (João Relvas/Lusa)

Rute Agulhas sinalizou ainda que nos objetivos do grupo para 2024 está um roteiro pelas dioceses do país para conhecer as realidades locais e reforçar a importância do encaminhamento para apoio psicológico das vítimas e dos suspeitos agressores. “Podem ainda não ter cometido um crime de natureza sexual, mas manifestar alguma dificuldade de ajustamento a esse nível e, portanto, também [atuar] numa lógica preventiva”, concluiu.

A coordenadora do Grupo VITA, Rute Agulhas, defendeu que a intervenção terapêutica junto de pessoas que cometeram abusos sexuais no seio da Igreja Católica deve ser obrigatória, reconhecendo que apenas uma pessoa está atualmente nesta situação.

Em declarações à Lusa, nas vésperas da entrega à Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) da proposta de reparação financeira às vítimas de abusos sexuais em contexto eclesiástico, na segunda-feira, a psicóloga admitiu que após oito meses de atividade do Grupo Vita existe apenas uma pessoa a ser acompanhada psicologicamente como agressor e que tal não é uma surpresa, face à tipicamente baixa motivação destes elementos para procurar ajuda.

“Devia ter este caráter de obrigatoriedade”, referiu Rute Agulhas, sublinhando: “Apelamos também sempre aos bispos, aos institutos religiosos, enfim, às estruturas da Igreja, para que, de alguma forma, pressionem as pessoas em que possa haver esta suspeita de terem cometido ou de estarem a cometer crimes de natureza sexual no sentido de aceitarem um processo de ajuda terapêutica”.

De acordo com a psicóloga, os alegados agressores sexuais costumam procurar justificações, culpabilizando as vítimas e desculpabilizando os seus comportamentos, pelo que é crucial haver uma motivação externa que se sobreponha à ausência de vontade do indivíduo.

“Esta motivação externa pode exatamente ser esta abordagem mais coerciva da própria Igreja, no sentido de obrigar de alguma forma estas pessoas a pedir ajuda, para que depois o terapeuta possa, com tempo, criar algumas condições para começar a haver alguma motivação mais interna. Mas sabemos que esta motivação interna, pelo menos numa primeira fase, é muito baixa”, explicou.

O caso sob tratamento na ótica de abusador chegou ao Grupo VITA, segundo a coordenadora, precisamente através da pressão exercida pelo instituto religioso ao qual esta pessoa estava ligada, o que atesta a necessidade de uma ação mais forte da Igreja Católica portuguesa.

“Numa primeira fase, a Igreja poderia ter este papel muito importante de encaminhamento destas pessoas para um processo terapêutico, ainda que as pessoas, numa primeira fase, digam que não querem ou que não precisam, mas, pelo menos, para dar uma oportunidade num contexto terapêutico de isto poder ser abordado de uma outra forma”, realçou.

Rute Agulhas sinalizou ainda que nos objetivos do grupo para 2024 está um roteiro pelas dioceses do país para conhecer as realidades locais e reforçar a importância do encaminhamento para apoio psicológico das vítimas e dos suspeitos agressores. “Podem ainda não ter cometido um crime de natureza sexual, mas manifestar alguma dificuldade de ajustamento a esse nível e, portanto, também [atuar] numa lógica preventiva”, concluiu.

Criado em abril de 2023, o Grupo VITA pode ser contactado através da linha de atendimento telefónico (915090000) ou do formulário para sinalizações no ‘site’ www.grupovita.pt.

O Grupo VITA surgiu na sequência do trabalho da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica, liderada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, que ao longo de quase um ano validou 512 testemunhos de casos ocorridos entre 1950 e 2022, apontando, por extrapolação, para um número mínimo de 4.815 vítimas.

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