Medina acusa Durão e membros do atual Governo de denegrirem Portugal em Bruxelas

5 abr, 11:38

Ex-ministro das Finanças alega que o objetivo final era atacar o PS - mas às custas da reputação do país. Fernando Medina acusa ainda o PSD de estar a lançar suspeitas sobre o estado das contas públicas não porque as contas públicas têm problemas mas porque o PSD percebeu que não pode cumprir o que prometeu em campanha. "Insólito", diz. "Não se pode governar um país na base da fezada. De excedente a défice é um instantinho"

Naquela que foi a primeira entrevista depois de sair do Governo, concedida ao Observador, Fernando Medina acusa Durão Barroso, pessoas "deste Governo" e "responsáveis de outros partidos" de terem denegrido a imagem de Portugal em Bruxelas com o intuito final de atacar o Partido Socialista. 

"Se algo me causa um profundo incómodo foi ver as vezes em que responsáveis do PSD e de outros partidos fizeram tudo em Bruxelas para penalizar Portugal, nomeadamente quando foi da saída do procedimento de défice excessivo. Isto é: estavam em campanha ativa contra o seu próprio país só para penalizar o PS. Durão Barroso iniciou a moda, fazendo a denúncia do país para o primeiro procedimento de défice excessivo, e também o PSD e elementos muito ativos do PSD - alguns estão neste governo - fizeram isso quando António Costa chegou ao Governo", acusa. Não identificou ninguém pelo nome, mesmo depois de ser questionado sobre se se estava a referir a Paulo Rangel: "Chegaram ao Governo", disse apenas.

Fernando Medida alega que fez o contrário e que defendeu perante os parceiros europeus a credibilidade de Luís Montenegro. "O que procurei fazer junto dos meus colegas é aquilo que eu acho que um ministro deve fazer, proceder à defesa do seu país e à proteção do seu país. Eu fiz precisamente aquilo que acho me cabe fazer, que é defender a posição do país", diz.

"É só cometer um erro" e "num instantinho" teremos problemas

Mas as críticas não se ficam por aqui. Fernando Medida acusa o PSD de ter prometido "tudo a todos", sem fazer contas e através de um "programa eleitoral profundamente despesista, insólito e que seria irrealizável sem comprometer a sustentabilidade das finanças públicas".

"Todo o conceito do país rico, abundante em dinheiro, disponível para ser gasto em tudo e em todos os problemas foi criada pelo PSD na campanha eleitoral. O PSD apresentou um cenário macroeconómico irrealista e ao contrário do que se faz - que é prever como é que a economia vai andar e perceber quais são as margens que existem para se adotar novas medidas. O PSD fez ao contrário. O PSD prometeu tudo a todos. Prometeu cerca de 7.250 milhões de euros em novas medidas. Prometeu mais do dobro do que aquilo que o PS prometeu em 4 anos. O PSD prometeu o IRC, descidas do IRS, foi não haver tributação no trabalho suplementar, foram mexidas em todo o lado", afirma o antigo ministro das Finanças, referindo que as promessas feitas pelo PS teriam um custo de "3.300 milhões da despesa para os quatro anos".

Para Medina não há dúvidas de que "a ideia de que o país tem capacidade para pagar algo desta natureza foi uma ideia criada exclusivamente pelo PSD" e deixa o alerta: "Passarmos de um país que tem um excedente a um país que tem uma situação de procedimento de défices excessivos é um instantinho, é só cometer um erro". "E, por isso, o que sempre alertei é: por favor, não se cometa esse erro".

Medina argumenta que, "ao contrário do que o PSD disse, as projeções económicas não são uma questão de confiança ou de fé na economia", até porque "não se pode governar um país na base da fezada". "As projeções são aquelas que decorrem do melhor conhecimento que temos num contexto de enorme incerteza sobre o que é que vai acontecer. E depois há, e nós esperamos todos, que vencer as projeções. Tomar medidas para vencer as projeções. Tem de se governar na base do que é o melhor que se sabe e com prudência."

Silogismo: "Sou de esquerda", logo "sou de contas certas"

Questionado sobre se o excedente não foi "excessivo" - como chegou a dizer Carlos César, presidente do PS -, Fernando Medina responde que, como político de esquerda, sempre se preocupou em ter dinheiro para garantir o funcionamento de um Estado Social. "Eu sou um grande defensor da política de contas certas porque sou um político de esquerda. E disse, aliás, na minha primeira entrevista, quando assumi funções, algo que deixou algumas mentes um pouco surpreendidas - que as contas certas são uma política de esquerda. Verdadeiramente um político de esquerda que protege e que procura defender o Estado Social e o seu alargamento é que se preocupa em ter os recursos financeiros para o pagar e para obter o Estado Social que seja sustentável ao longo do tempo. É evidente que o Estado Social, tendo fragilidades, elas têm de ir sendo sucessivamente colmatadas. E aquilo que tem sido feito e que foi feito ao longo dos anos, na recuperação do Estado Social, no seu alargamento e no seu crescimento, é muitíssimo significativo em todas as áreas."

Sobre o futuro, Medina diz que não sabe "como é que o Governo" vai trabalhar, mas considera que "as grandes questões que o novo ministro das Finanças tem sobre a mesa são questões políticas de fundo que têm que ver com a própria forma como o PSD se apresentou a estas eleições". Ou seja, o grande problema do próximo Governo vai ser cumprir aquilo que prometeu "a todos"

"Já alertei várias vezes, antes das eleições, também depois das eleições, para o que me parece ser um caminho de altíssimo risco para a trajetória de manutenção de equilíbrio nas nossas contas públicas e a redução da dívida pública. Quais são os instrumentos para concretizar as medidas e em que tempo e em que modo? Só o novo Governo saberá. Eu não conheço o desenho de nenhuma medida em concreto e por isso não posso dizer como é que pretendem fazer e o novo Governo dirá."

Reforçando a ideia de que o programa do PSD "financeiramente não tem sustentação" - e que o PS tem dito disso "desde o dia em que apresentaram o programa eleitoral" -, o antigo ministro das Finanças considera que "algumas das promessas são mesmo más" e que "era bom que não as concretizassem, mas [Montenegro] voltou a insistir nelas [na tomada de posse]", como é o caso da redução do IRC - "que vai consumir um volume de cerca de 1.500 milhões de euros de recursos públicos".

Deixando claro que, tal como o PS já tinha afirmado, é "praticamente impossível" que o Orçamento do Estado para 2025 seja viabilizado, o antigo ministro das Finanças diz ainda que o valor que o PSD quer alocar ao IRC vai ter grande importância nas contas do país.

"1.500 milhões de euros é muito dinheiro em qualquer orçamento, mesmo de países maiores que o nosso. Quando se escolhe uma prioridade desse tamanho, isto tem implicações em deixar de se fazer outras coisas que têm muita importância. Ideologicamente, insere-se numa linha que o PSD tem seguido ao longo de muitos anos, que é a arte do pensamento mágico. É uma coisa que, aliás, eu aprecio bastante na direita portuguesa: do ponto de vista da política económica, a originalidade da direita é tendente a zero."

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