Da Reboleira a Harrisburg, uma carreira a viajar

11 out 2017, 23:10
Rodolfo Minguens

Antigo jogador do Estrela da Amadora e do FC Porto acabou a carreira de jogador cedo, zangado com o futebol, mas acabou por regressar mais determinado que nunca como treinador. Apenas com 40 anos, já trabalhou na Grécia, Brasil, Polónia, Irão e está agora nos Estados Unidos

Rodolfo Miguens, antigo jogador do Estrela da Amadora e do FC Porto, acabou a carreira cedo, zangado com o futebol, depois de uma série de lesões que lhe condicionaram a parte final da carreira. Decidiu virar mesmo as costas ao desporto rei e foi estudar. Começou um curso de Turismo, mas a verdade é que o bichinho ficou lá e, em pouco mais de seis meses, Rodolfo estava de volta, mais determinado do que nunca. Trocou o curso de turismo pelo futebol, com especialização em futebol, e, desde que voltou, não parou de viajar. Já trabalhou na Grécia, no Brasil, passou pela Polónia, esteve no Irão e, agora, está nos Estados Unidos. Esta é a história de um jovem treinador que já tem uma enorme experiência acumulada. Desde os primeiros pontapés na bola, Rodolfo trabalhou com treinadores com marca no futebol português como Fernando Santos, Jorge Jesus, José Mourinho, Artur Jorge, Jorge Paixão e Toni.

«Tem sido uma carreira agitada, tem sido um acumular de experiências. As oportunidades de viajar para um lado e para o outro têm surgido e eu não tenho dito que não, até porque acho importante para a minha carreira ir conhecendo outras culturas. É isso que me tem feito viajar. Tenho trabalhado com vários treinadores, é importante ir absorvendo um bocadinho de cada um, é isso que tenho tentado fazer, para depois, quando estou sozinho, como é agora o caso, colocar em prática», começa por nos contar o nosso protagonista desde Harrisburg, capital da Pensilvânia, nos Estados Unidos.

Uma conversa telefónica que nos permitiu viajar pela impressionante carreira de Rodolfo que, com apenas 40 anos, já tem muito para contar. Uma história que começa bem no coração da Reboleira, mesmo em frente ao Estádio José Gomes. «Eu morava com os meus pais e com as minhas irmãs na Reboleira, em frente ao estádio do Estrela, a minha mãe ainda mora lá. Foi aí que eu cresci. Cresci a ver o Estrela quando era miúdo», começa por nos contar Rodolfo que começou a dar os primeiros pontapés na bola aos oito anos. «O Estrela marca não só a minha carreira, mas marca também a minha vida. Era só atravessar a rua e estava dentro do estádio. Passei a sentir o clube, a vivenciar todos os jogos, todos os treinos, a ver grandes jogadores do Estrela, ainda na II Divisão. Foi um clube que me marcou muito, ainda tenho saudades desses tempos. Entrei lá com oito anos, fiz a formação toda e fique até aos 21 anos. Assinei contrato profissional aos 17 e depois saí aos 21 para o FC Porto. Fiz também as seleções todas dos sub-15 até aos sub-21. Nos juniores o meu treinador era o Miguel Quaresma, atual adjunto do Jorge Jesus», recorda.

Miguel Quaresma acabará por ter, como vamos ver, forte influência na futura carreira de treinador de Rodolfo. Mas estávamos ainda na passagem de Rodolfo pelo Estrela. Concluída a formação, Rodolfo integrou a equipa principal, num percurso ascendente que começou com Fernando Santos e terminou com Jorge Jesus. Dois «mestres» «muito diferentes». «Foi uma experiência ótima. Só posso dizer bem do Fernando Santos, saí dos juniores e comecei a jogar diretamente na equipa principal. Foi ele que me fez subir aos seniores. Comecei a lá ir ainda como júnior e no primeiro ano como sénior ainda fiz a segunda fase do campeonato nacional de juniores quando acabou a Liga. Depois fiquei definitivamente nos seniores e a jogar. Para mim não podia ter sido melhor».

De Fernando Santos a Jorge Jesus, antes de Bosman

Ainda antes dos dezoito anos, Rodolfo já jogava ao mais alto nível. Rapidamente ganhou força no plantel, chegou a titular, mas a relação de amor com o clube acabou de forma precipitada, no primeiro ano de Jorge Jesus, com Rodolfo a recorrer à Lei Bosman para deixar a Reboleira. «O Jorge Jesus era um treinador bastante diferente, mas para mim foi uma época conturbada. Tinha tentado renovar com o Estrela nesse ano, o atual presidente não queria. Acabei por ter um conflito e acabei por recorrer à Lei Bosman, que na altura ainda era recente, apareceu o FC Porto e acabei por sair. Ainda estive a treinar à parte no clube por três meses, nessa altura já queriam renovar comigo, mas já tinha tudo certo com o FC Porto para a época seguinte. Ainda joguei toda a primeira parte da época com Jesus, até janeiro, depois fiquei a treinar à parte», recorda.

O compromisso com o FC Porto ficou definido quase um ano antes e, entretanto, Fernando Santos já era o «engenheiro do Penta» nas Antas. «Tenho ideia que quando o Fernando Santos entrou no FC Porto eu já tinha contrato para a época seguinte. Já era um Fernando Santos muito diferente em termos de treino como é normal, as coisas evoluem e ele também evoluiu. Em termos de personalidade, era o mesmo, muito forte, uma pessoa que sabe bem o que quer, com regras bem vincadas. Foi bom, voltei a aprender muito com ele». Dias difíceis para Rodolfo que chegava a um FC Porto com expetativas em alta, que se preparava para atacar o «hexa».

«O FC Porto já era Penta e procurava o Hexa. Foi uma época complicada com muitos regressos ao clube. Voltou o Rui Barros, o Domingos, o Folha. Era um plantel muito experiente, difícil para um jovem como eu, mas houve mais coisas que não vale a pena estar agora a comentar. Foi um ano atípico no FC Porto e acabei por ter poucas oportunidades». Fernando Santos tinha um plantel extenso, com muitos jovens, mas dava primazia aos mais experientes. Rodolfo acabou por jogar mais na equipa B onde despontavam outros valores. «Estavam lá Ricardo Carvalho, Ricardo Sousa, Ricardo Silva, Romeu e o Miklos Fehér. Acabámos todos por jogar na equipa B, o mister Fernando Santos achou que era melhor para nós. Eramos muto jovens e não podíamos parar. Foi nessa altura que também estava a aparecer o Bruno Alves, o Hélder Postiga, o Tonel. Foi interessante, a equipa B tinha muita qualidade».

Com pouco espaço no FC Porto, Rodolfo acaba por rodar, primeiro no Beira-Mar, depois no Varzim. Na Póvoa volta a jogar com regularidade e, na segunda época, volta a dar nas vistas, chamando a atenção de José Mourinho que tinha acabado de chegar ao FC Porto. «Faço uma época no Beira-Mar com o António Sousa e na época seguinte sou emprestado ao Varzim. Tinha quatro anos de contrato com o FC Porto e a minha segunda época coincide com o Mourinho no FC Porto». As portas das Antas [ainda não havia Dragão] voltam a abrir-se para Rodolfo, mas com uma condicionante que acabou por não verificar-se. «No final da época fui chamado por Mourinho e fiz dois jogos particulares, primeiro com a Académica e depois com o Penafiel. O mister chamou-me à parte e explicou-me que se o Paredes fosse vendido no final da época eu integrava o plantel. Se por acaso o Paredes não fosse vendido, tinha duas situações: ou ficava na equipa B à espera de uma eventual saída do Paredes ou chegava a acordo com o FC Porto para sair».

Três lesões no mesmo joelho

Paredes não foi vendido e Rodolfo não quis esperar. «Falei com o senhor Reinado Teles, na altura tinha o interesse de outros clubes, mas ele aconselhou-me a integrar o Varzim, que era satélite do FC Porto, de forma a que o FC Porto pudesse continuar a acompanhar-me. Rescindi e assinei em definitivo pelo Varzim do mister José Alberto Costa». É já na Póvoa que a carreira de Rodolfo sofre o primeiro revés, precisamente nas Antas, frente ao FC Porto: uma lesão no joelho esquerdo. Ainda em recuperação, chega a acordo com a Académica, com a garantia que ia estar bem para o arranque da nova época. Em Coimbra conheceu mais uma referência. «O Artur Jorge ainda começou a época, fez pelo menos a três primeiras jornadas, mas depois foi para o CSKA Moscovo. Deixei depois de jogar com o Vítor Manuel, mas voltei a jogar com o mister José Carlos Pereira. Quase no final da época voltei a lesionar-me no mesmo joelho. Num treino, levei uma pancada e voltei a lesionar-me». Segundo revés.

«Recuperei nas férias, ainda começo a época na Académica, mas na terceira jornada, em Vila do Conde, frente ao Rio Ave, sofri uma entrada de lado, fiquei com o pé preso no chão e voltei a lesionar-me». Terceiro revés, sempre no mesmo joelho. «Estive oito meses a recuperar dessa lesão e só voltei a treinar no final da época, quando o meu contrato estava a acabar».

Depois de três lesões e sem clube, Rodolfo desanimou, mas ainda teve uma nova oportunidade, a partir de uma série de coincidências que o levaram a treinar com a recém-formada equipa do Sindicato de Jogadores. Na altura era ainda uma novidade e para Joaquim Evangelista, presidente do Sindicato, ter um jogador do primeiro escalão na equipa era a melhor forma de promover a nova iniciativa. Foi Rebelo, antigo companheiro do Estrela, que abriu as portas a Rodolfo que, logo a seguir, recebeu um convite de um empresário para ir a França participar num torneio da FIFPro, a associação que reúne os sindicatos de jogadores de toda a Europa. «Foi uma série de coincidências. Um empresário que assistiu ao treino do Sindicato pediu-me para ir ao Torneio da FIFPro que ia decorrer em França. Felizmente as coisas correram bem e, logo após o primeiro jogo, com a equipa de Inglaterra, recebi convites do Xanthi da Grécia e do Clermont de França».

Rodolfo escolhe o clube francês. «Estava recuperado da lesão, passei nos testes médicos sem problemas e assinei pelo Clermont onde joguei com alguns jogadores que estavam a terminar a carreira. Joguei com o Jocelyn Gourvernec, atual treinador do Bordéus, com o Frédéric Brando, que tinha jogado na época áurea do Marselha, e com o Bernard Diomède, que tinha sido campeão do Mundo pela França. Lembro-me que era uma cidade repleta de portugueses que me acolheram muito bem», destaca. Foi a primeira e única experiência de Rodolfo no estrangeiro, como jogador, mas outras estariam para vir como treinador.

«Estava saturado do futebol»

Aqui acaba de facto o primeiro capítulo desta história de Rodolfo. Apesar de ter mais um ano de contrato com o Clermont, Rodolfo, aos 29 anos, estava saturado. Tinha acumulado uma série de frustrações, relacionadas com as lesões, mas não só. «Fiquei um bocado saturado de tudo, das lesões todas que me tinham assombrado nos últimos três anos. Fiquei triste por ver a minha carreira ficar assim, também não me queria arrastar e decidi terminar. Estava saturado psicologicamente com tudo o que me tinha acontecido. Como foi um ano que terminei sem lesões, achei que era o momento indicado para sair. Não queria voltar a passar pelo suplício de ser operado outra vez, decidi terminar. Falei com o presidente e disse-lhe que não ia jogar mais».

Capítulo fechado.

Rodolfo nem queria ouvir falar em futebol. Ia mesmo mudar de vida. «Nem queria ver mais o futebol à minha frente, estava saturado das pessoas, de tudo o que estava relacionado com o futebol. Decidi tirar Turismo e dar um novo rumo à minha vida. Fiz o primeiro semestre na Universidade Lusófona», começa por contar. A mudança de rumo não demorou muito tempo. O bichinho estava lá e não foi preciso muito para o futebol recuperar Rodolfo. «Ao terminar o primeiro semestre, começaram a aparecer uns flyers sobre treino desportivo, na altura da Declaração de Bolonha e das novas oportunidades. Comecei a ler aquilo e só me lembro de ir à secretaria anular a matrícula e matricular-me em desporto com especialização em futebol». Um impulso que acabou por voltar a mudar a vida de Rodolfo. «Liguei à minha mulher, ela ficou um bocado assustada com este novo rumo. Andei a preparar-me para as provas, a fazer ginástica, mas depois ligaram-me da faculdade a dizer que já tinha currículo suficiente e não precisava de fazer as provas específicas. Entrei diretamente e fiquei todo contente», conta.

Tão contente, que voltou a jogar. Enquanto estudava, voltou a dar pontapés na bola, primeiro no Igreja Nova, depois no Linda-a-Velha, ali perto de casa. Rodolfo estava definitivamente de volta ao futebol e há um período em que acumula os estudos, com os jogos e treinos, uma vez que na parte final do curso já trabalhava com equipas de formação, primeiro no Damaiense, depois no Pêro Pinheiro, no CIF e ainda no Casa Pia. «Cheguei a ir ao Chipre para voltar a jogar, mas não quis ficar. Queria jogar para manter a forma enquanto estudava. Comecei o curso de desporto, jogava, treinava, fazia mil-e-uma-coisas, saía de casa às sete da manhã e voltava à meia-noite». A vida de Rodolfo estava num turbilhão. «Tive de deixar o Igreja Nova que obrigava a deslocações e já não tinha tempo para assumir essas responsabilidades. Fui para o Linda-a-Velha que era perto de casa, já dava treinos na Escola do Carlos Queiroz, que tinha uma ligação ao Manchester United, era coordenador dos escalões de formação do CIF, jogava no Linda-a-Velha, era o dia todo a correr de um lado para o outro. Às vezes tinha dez minutos para deslocar-me de um lado para o outro».

A caminho de Atenas...

No meio desta azáfama, sem tempo para respirar, Rodolfo ainda restabelece a ligação com o FC Porto, assumindo a responsabilidade da parte técnica do projeto Dragon Force em Lisboa e, já com o mestrado concluído, começa também a colaborar na faculdade como docente, como assistente do professor Jorge Castelo. Os contatos que foi abrindo ao longo da formação, abriram-lhe portas para um inesperado convite da Grécia. Jesualdo Ferreira tinha acabado de deixar o Panathinaikos e Rodolfo foi convidado a integrar a nova equipa liderada por Fabri Gonzalez, um treinador espanhol que tinha ganho nome depois de levar o Granada da III Divisão ao primeiro escalão do futebol espanhol.

A viagem para Atenas seria a primeira de muitas que Rodolfo ia fazer nos anos seguintes, mas seguramente uma das mais marcantes. Em Atenas, Rodolfo viveu de perto os duelos quentes com o rival Olympiakos. «Lembro-me de um episódio terrível. O primeiro jogo no Karaiskaki [como também é conhecido o estádio do Olympiakos], foi uma coisa impressionante. Desde levarmos com gás pimenta no túnel, a termos ficado presos num elevador, a bombas no autocarro, acontreceu de tudo. Chegámos a andar à porrada, entre aspas, com equipa técnica do Olympiakos. São experiências que ficam para a vida».

Uma experiência que ficou para a vida, mas que foi curta, poucos meses depois Rodolfo estava de volta a Portugal. «Acabou a época, ia entrar um treinador grego, eles queriam que eu ficasse, mas achei que era melhor sair com o Fabri». O regresso a Portugal coincidiu com um período difícil para Rodolfo, ditado pela morte do pai. Mais uma vez o futebol apareceu para ajudar. «Estava em casa, tinha de fazer alguma coisa para não deixar ir-me abaixo e recebi um convite de um antigo colega para ir trabalhar com os juniores do Belas. Foi muito bom, fez-me bem na altura, trabalhar com miúdos que precisavam de ajuda. Também me fez crescer».

De Belas ao Paraná

É nesta altura que volta a surgir um convite inesperado, graças aos «velhos» contatos dos tempos do Estrela. Um convite para integrar a equipa técnica do Paraná, no Brasil. Uma equipa que era liderada por Milton Mendes, um treinador que acaba de ser despedido do Vasco da Gama, mas que na altura também dava os primeiros passos na carreira, na Série B do campeonato brasileiro.

«O Raúl José e o Miguel Quaresma eram amigos do Milton Mendes e propuseram-me essa situação. Falei com o Milton e chegámos a acordo, eu também estava interessado em conhecer novas culturas e ganhar experiência. Foi muito diferente, cultura nova, métodos de treino diferentes, pessoas diferentes. Encontrei lá pessoas com experiência, como o Darlan Schneider que tinha sido o preparador físico do Scolari e com quem mantenho uma boa relação até hoje. O diretor desportivo era o Roque Júnior, que foi capitão da seleção do Brasil e jogou no Milan».

Na Polónia com Paixão

Rodolfo continuava com o ritmo da faculdade e, mal terminou a experiência no Brasil, já estava a receber uma sondagem para rumar à Polónia, mais uma vez pela mão de Miguel Quaresma. Um convite para assumir a condução da equipa B e coordenar a formação do Zawisza Bydgoszcz. Mas o destino colocou-lhe mais um treinador português no caminho. «O clube na altura estava à procura de um treinador para a equipa principal e vieram falar comigo porque queriam um treinador português. Surgiram vários nomes, um deles foi Jorge Paixão que eu já conhecia. Quando ele assina eu já lá estou e ele convida-me para ir para a equipa principal».

Tal como a Grécia, o futebol polaco também se destaca pelo fanatismo dos seus adeptos, talvez os mais violentos da Europa. Rodolfo foi testemunha disso mesmo num episódio em Wroklaw que também marca a sua carreira. A equipa técnica do Zawisza, liderada por Jorge Paixão, contava, além de Rodolfo, com Filipe Silvério e com o brasileiro Hermes. Os quatro treinadores, como era habitual, aproveitavam os jogos fora de casa para, a seguir ao jantar, para dar um passeio, conhecer a cidade e beber um café fora do hotel. Os três portugueses e o brasileiro, deixaram o hotel, vestidos com o equipamento do clube e acabaram por ser confundidos com um grupo de adeptos. «Íamos jogar contra o SLASK onde jogavam os irmãos Paixão e entrámos numa gelataria para comprar um gelado. Estávamos equipados com os polos do clube, com um pequeno logotipo da equipa e alguém numa varanda atirou um cigarro contra nós. Não demos muita importância, continuámos a andar, mas eles saíram rodearam-nos e começaram a meter-se connosco e a querer bater. O Hermes tentou acalmar a situação, mas achámos melhor voltar ao hotel».

Num ápice o pequeno grupo de adeptos do SLASK crescia a olhos vistos. Rodolfo e companhia, em passo apressado de volta ao hotel, voltaram a ser apertados mais à frente. Hermes, o destemido brasileiro, consegui explicar que não eram adeptos, mas sim treinadores. «Eles então disseram-nos, fujam já que que vem aí o núcleo duro da claque para vos bater. Indicaram-nos uma rua e desatámos a correr. Só me lembro de olhar para trás e ver uma multidão em fúria a correr na nossa direção». Sem tempo para chegar ao hotel, a equipa técnica do Zawisza Bydgoszcz refugiou-se num pequeno café. «A senhora ajudou-nos a escondermo-nos lá num canto e eles andavam lá fora à nossa procura. Passado um tempo, quando as coisas acalmaram, entrámos nuns táxis que a senhora chamou e conseguimos chegar ao hotel». Ufa…

No final da época, Jorge Paixão deixa a Polónia e regressa a Portugal para treinar o Olhanense. Rodolfo ainda hesita, mas decide acompanhar o treinador para o Algarve, mas também por pouco tempo. Depois da Grécia, Brasil e Polónia, Rodolfo rumou para a Ásia, mais precisamente para o Irão, para integrar a equipa técnica de Toni à frente do Tractor, na longínqua Tabriz. «Eu tinha sido treinador do neto do mister Toni na Dragon Force e também fui colega de mestrado do António, o filho de Toni». A relação com a família Oliveira estendeu-se ao elemento mais proeminente que acabaria por deixar marca no Irão. «Lutámos pelo título até ao fim, perdemos o campeonato nos últimos dez minutos. Estávamos a ganhar 3-1 em casa, se ganhássemos eramos campeões, mas empatámos 3-3. O Toni é uma pessoa muito adorada no Irão, não só em Tabriz, mas em todo o país. As pessoas gostam muito dele. É uma pessoa muito humana, no Irão dão valor a isso, ele não tem problemas em estar com as pessoas, em falar com toda a gente. Eles acham isso gratificante», recorda Rodolfo.

Mais uma experiência diferente para Rodolfo, depois da Grécia, Brasil e Polónia, o antigo médio estava num país muçulmano. «Mais uma cultura diferente, não tenho queixas nenhumas. É uma vida diferente, não há a vida social a que estamos habituados, mas as pessoas são muito humanas. É um bocado mau para as nossas mulheres viverem lá, mas as pessoas são muito acolhedoras. Temos uma noção errada do Irão, eu não me posso queixar, sempre me aceitaram bem».

Rodolfo gostou tanto do Irão que ficou por lá por três épocas, mesmo depois de Toni ter saído. «Fiquei duas épocas no Tractor e depois fiz mais uma noutro clube da mesma cidade. Na altura saí com o Toni, mas passado um mês o clube ligou-me a pedir para voltar, falei com o Toni, ele não se opôs e decidi voltar. Fiz mais uma época e depois outra no Machine Sazi que tinha um projeto engraçado», conta.

Mais uma travessia do Atlâtico

De regresso a Portugal, ao fim de três anos, Rodolfo mal teve tempo para por os pés em Lisboa, e, pela segunda vez na carreira, voltava a atravessar o Atlântico, desta vez rumo à pequena cidade de Harrisburg, capital da Pensilvânia. «O presidente do clube é português, é o Tiago Lopes, que tinha sido um dos fundadores da Escola Carlos Queiroz em Lisboa onde trabalhei. Através de uns amigos em comum, falámos, eu também estava interessado num projeto onde mais tarde pudesse levar a minha família, falámos e chegámos a acordo», conta o nosso viajante.

Mais uma realidade completamente diferente de todas as outras experiências. «Estou na USL (United Socer League) que corresponde à II Liga dos EUA, a seguir à MSL (Major Soccer League). Havia a NASL (North America Soccer League) que era a fundadora do soccer do histórico Cosmos, mas essa liga foi despromovida para terceira liga do país. A USL é uma das ligas com maior crescimento a nível mundial, tem 32 clubes», começa a contar, numa altura em que a qualidade da chamada telefónica perde qualidade. Passamos a ouvir Rodolfo com cortes, mas ainda ouvimos o nosso protagonista dizer: «Estou nos Estados Unidos, mas em termos de ligações é pior do que o Irão».

Retomada a chamada, Rodolfo fala-nos ainda da nova experiência. «Harrisburg é uma cidade pacata, é a capital onde o Donald Trump veio comemorar os primeiros dias do seu mandato. É uma cidade conhecida pela Hershey, uma famosa marca de chocolates que são fabricados aqui perto. Também têm uma equipa de baseball que tem um estádio onde nós jogamos». A equipa de Rodolfo joga, assim, no capo dos Senators, a equipa de baseball, mas com um relvado adaptado ao soccer.

«Tem aquele diamante do baseball, mas eles cobrem isso com relva natural e transformam aquilo num campo de futebol, sem problemas. O futebol americano é que tem aquelas linhas todas, mas a USL proibiu agora jogos nesses campos com marcações de futebol americano, querem começar a criar uma cultura do soccer e não querem campos com marcações. Estão a profissionalizar a liga toda e isto está a ficar engraçado. Tem já muitos jogadores conhecidos nesta liga, tem o Didier Drogba, o Joe Cole, o Schafer, que era do Wolfsburgo, e muitos jogadores que passaram na Premier League e agora estão aqui. A liga está a crescer muito».

A época para o Harrisburg City Islanders acabou na véspera desta conversa, com uma derrota que afastou a equipa de Rodolfo dos play-offs. Mais uma vez Rodolfo tem o futuro totalmente em aberto. Em cima da mesa está a possibilidade de ficar pelos Estados Unidos, num projeto em que possa trazer a família, mas Rodolfo também está de olho numa oportunidade para voltar a trabalhar em Portugal. «A breve trecho também gostava de voltar ao meu país. Tive aquela experiência no Olhanense, mas gostava de voltar a criar raízes em Portugal. Para sair outra vez tem de ser uma situação bem pensada, que possa incluir a família», destaca ainda.

Acaba aqui, para já, a história deste globetrotter português que, apesar de ter desistido do curso de Turismo, ainda não parou de viajar, com passagem por seis países diferentes nos últimos cinco anos.

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