Em entrevista à CNN Portugal, o ex-presidente da Assembleia da República, admitiu que Luís Montenegro tem condições para formar Governo e e que o PS deve aproveitar este tempo para "refletir bastante e estudar as razões dos resultados". Criticou a PGR e garantiu que não será candidato a Presidente da República
Eduardo Ferro Rodrigues, ex-presidente da Assembleia da República, considera que, neste momento, após a derrota eleitoral nas eleições legislativas, "o PS precisa de refletir bastante e estudar as razões dos resultados, que são diferentes de idade para idade, e de zona do país para zona do país". Agora que vai ficar na oposição, "o PS tem de aproveitar este tempo para fazer algumas mudanças dentro do partido", sublinha Ferro Rodrigues, em entrevista à CNN Portugal, lembrando algumas iniciativas passadas - como o voto aberto aos simpatizantes, os gabinetes de estudo em todo o país ou os estados gerais - que foram "momentos de grande mobilização" em torno do partido mas que, entretanto, foram abandonadas.
Sobre a indigitação de Luís Montenegro como primeiro-ministro, Ferro Rodrigues considera que isso "é o mais natural". "Estou de acordo com a posição do secretário-geral do Partido Socialista, pois a AD tem condições para formar Governo liderado por Luís Montenegro", disse, sublinhando que Montenegro já assumiu a vitória e, neste momento, "o PS não tem condições para apresentar um programa de governo que não seja rejeitado pela direita e pela extrema-direita".
Ferro Rodrigues sublinhou que já não ocupa nenhum cargo e por isso "fala a título meramente individual e como líder de base do partido". No entanto, antevê que, muito provavelmente, o PS irá chumbar o próximo Orçamento de Estado: "Um orçamento de um partido de centro-direita como o PSD, ainda por cima com o CDS e com a necessidade pelo menos da abstenção do Chega estará muito longe das propostas do Partido Socialista", considera. "Não podem pedir ao principal partido da oposição para ser a muleta do Governo", concluiu.
Apesar de todas estas dificuldades, o histórico do PS não está preocupado com a sobrevivência do partido: "A sobrevivência do Partido Socialista está menos em causa do que a sobrevivência de outros partidos de esquerda que tiveram menos votos. O PS continua a ser a grande força da esquerda portuguesa", disse. "Neste momento estou mais preocupado com a situação do país do que com a do partido, nesta Europa em guerra, em que é necessário que haja governos com capacidade para utilizar os muitos fundos financeiros que ficaram disponíveis depois de uma negociação muito forte e muito bem sucedida do primeiro-ministro António Costa."
"O PSD e o CDS foram menos atingidos, é um facto. Mas a AD teve uma vitória pequena em relação ao Partido Socialista, portanto as dificuldade da AD e do PS vão ser relativamente paralelas".
Analisando os resultados eleitorais, Ferro Rodrigues sublinhou a inesperada baixa da abstenção: "Muita gente que não ia votar, porque estava descontente com o sistema, e desta vez optou por votar num partido que é radical que é claramente contra o sistema. Temos de ver como é que isso se combate, e esse combate não é apenas de um partido é de todo o sistema democrático", avisou.
"A ascensão dos populismos e da extrema-direita não é um fenómeno só europeu, aconteceu também na América e no Brasil. Portugal não está imune a esse vento com um pouco de insanidade política e que sopra um pouco por todo o lado", disse. "A ascensão da extrema-direita é algo muito preocupante e que merece um combate firme", repetiu. "A contenção do Chega é uma tarefa de várias instituições, do Presidente da República, do sistema judicial. Infelizmente o que verificamos é que houve muita gente, mesmo que não tenha querido, fez o jogo do Chega."
"O Chega beneficiou de uma situação inusitada em que há uma suspeita sobre o primeiro-ministro, e isso mobilizou um número de pessoas a votar na extrema-direita", admitiu. Na sua opinião, "os processos judiciais [Operação Influencer] tiveram de certeza influência nos votos", uma vez que estas "eleições decorreram por baixo de uma suspeita - infundada até agora - de práticas ilícitas do primeiro-ministro", lembrou. "A crise foi provocada por uma interferência grosseira do poder judicial (e mais em concreto da procuradoria geral da república) no poder político, que desestabilizou o estado democrático, além de desestabilizar o Governo. E o Presidente da República nada fez para que o primeiro ministro se mantivesse."
E deixou o alerta: "O que tem de se perguntar é porque é que quatro meses depois nada se sabe o primeiro-ministro ainda não foi ouvido"
Questionado sobre se tenciona candidatar-se à presidência da República, Eduardo Ferro Rodrigues deixou claro que não o irá fazer: "Eu respeito muito as pessoas da minha idade ou mais velhos, e não gosto do idadismo, mas acho que é uma questão de bom senso", justificou, lembrando que já tem 75 anos e que se ,por acaso fosse, Presidente terminaria o mandato "se ainda cá estivesse, com 81 anos": "A idade em si não é um problema, mas todos devemos ter consciência que não é a mesma coisa ter 50, 60 ou 70 anos, e ter o bom senso de afastar-nos", dando lugar aos mais novos.