FC Porto: duas ou três dúvidas após ler a entrevista de Fernando Gomes

25 nov 2023, 21:17
Estádio do Dragão, Porto (Getty)

Há coisas que não conseguem perceber-se

Fernando Gomes veio trazer mais alguma informação sobre a negociação em curso com uma empresa norte-americana, que permitirá, diz ele, um encaixe financeiro importante.

Nas palavras do administrador, esse encaixe financeiro será utilizado para «dar um pontapé» nos capitais próprios negativos, tornando-os muito menos negativos: Fernando Gomes é mais conservador do que Pinto da Costa e não fala em torná-los positivos.

Fê-lo através de duas entrevistas – a O Jogo e ao Jornal de Notícias – que permitem obter várias respostas e deixam, ainda assim, algumas dúvidas.

Mas vamos por partes.

  1. Antes de mais, Fernando Gomes garante que a Legends será responsável por procurar um investidor para o naming do estádio, explorar o serviço de catering e tudo o que tenha a ver com a experiência do adepto, frisando que será «um peso-pesado do mesmo universo» que ficará com a exploração comercial da marca FC Porto. Embora não o tenha dito, tudo aponta que esteja a falar da Sixth Street, um fundo de investimento privado criado por antigos quadros da Goldman Sachs e que recentemente adquiriu uma posição maioritária na própria Legends.
  2. A Sixth Street, que nos últimos tempos fez contratos semelhantes com o Real Madrid e o Barcelona, por exemplo, vai adiantar uma quantia não divulgada de dinheiro, que permitirá diminuir os capitais próprios negativos da SAD, e por arrasto do próprio FC Porto. Ao mesmo tempo, partilha uma percentagem dos lucros gerados pela exploração comercial do Estádio do Dragão durante 15 anos. O que significa um negócio em tudo semelhante ao que fez com o Real Madrid: o único dos contratos da Sixth Street em que se sabe um pouco mais.
  3. A Sixth Street vai entrar no capital social da Porto Comercial. O que significa uma grande diferença em relação ao que fez nos gigantes espanhóis, mas ao mesmo tempo faz todo o sentido. Por duas razões. Por um lado, explica o interesse na exploração do Estádio do Dragão, que por muito que nos custe gera receitas muito inferiores ao que acontece no Santiago Bernabéu, no Camp Nou ou no Ettihad Stadium. Por outro lado, permite ao FC Porto um relevante impacto nos capitais próprios, já que a quantia adiantada será contabilizada de imediato e não diferida ao longo do contrato.

Ora depois de se conhecerem estes dados, fez-se um pouco mais de luz, sem dúvida, sobre o acordo que o FC Porto está a ultimar.

No entanto, e mesmo sabendo-se que a Porto Comercial tem um volume de negócios interessante e que consegue por norma lucros (ainda que baixos), sobram algumas dúvidas:

  1. Integrando a Porto Comercial o perímetro de consolidação da Porto SAD, está previsto ou há a perspetiva da participação minoritária na Porto Comercial poder ser convertida em participação minoritária na Porto SAD?
  2. No caso de resposta negativa, qual poderá ser o interesse de um fundo norte-americano na Porto Comercial, que é, recorde-se, uma subsidiária da Porto SAD, se não houver um reforço dos poderes e do valor dessa mesma Porto Comercial?
  3. Poderá no futuro a Porto Comercial ficar com a exclusividade da exploração da marca FC Porto (incluindo os direitos multimédia)?
  4. Como será feita pela Sixth Street a exploração comercial dos espaços publicitários do Estádio do Dragão, que foram vendidos à Altice até 2028, como parte do negócio relativo aos direitos de transmissão televisiva?
  5. Nesta sexta-feira, antes de se saber das entrevistas de Fernando Gomes, o Maisfutebol questionou a CMVM se já tinha recebido alguma informação da Porto SAD em relação a este negócio. A resposta da CMVM chegou este sábado, curiosamente depois das entrevistas serem publicadas, referindo que é competência da emitente «avaliar se o negócio é suscetível de influenciar o preço das suas ações» e que está a monitorizar todos os movimentos que possam ir contra este dever. Nesse sentido, o que é preciso mais para se obrigar a fazer essa comunicação oficial?

No fundo, o objetivo do FC Porto é claro: tranquilizar os sócios do FC Porto, transmitindo a ideia de que afinal as finanças estão bem. Há ali coisas que não fazem sentido: por exemplo, o argumento de que a pandemia é a culpada pelo estado financeiro da SAD, quando se sabe que foi a pandemia a conceder uma série de benesses (a possibilidade de abater o investimento realizado na formação, entre outros) que permitiram à SAD sair do fair-play financeiro.

Há coisas que não fazem sentido, portanto, mas há outras que fazem. Convém, no entanto, que sejam mais bem explicadas. Para que as pessoas fiquem de facto tranquilizadas.

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