Pai das gémeas tratadas no Santa Maria tem dívida de milhões ao fisco brasileiro

24 nov 2023, 22:38

Pai foi julgado à distância por estar a acompanhar as filhas em Lisboa. Advogado de defesa sublinhou situação de desemprego e fragilidade financeira. Avô das crianças também tem historial na justiça brasileira.

O pai das gémeas luso-brasileiras tratadas no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, em 2020, tem uma dívida de quase 70 milhões de euros ao fisco brasileiro. Pelo menos é isso que revela o portal oficial com os maiores devedores ao Estado Federal, bem como uma sentença judicial de 2021 de um tribunal de São Paulo.

Na altura, o pai das gémeas, Samir Assad Filho, foi julgado à distância por estar em Portugal a acompanhar as duas filhas após receberem o medicamento mais caro do mundo, que custa dois milhões de euros, através do Serviço Nacional de Saúde, numa polémica revelada pelo Exclusivo da TVI que levou a Procuradoria-Geral da República (PGR) a anunciar agora a abertura de um inquérito.

Desempregado em Portugal

O caso em julgamento em 2021, em São Paulo, a aguardar decisão da segunda instância, envolve crimes contra o fisco brasileiro por omissão de lucros, informação falsa e fraude às finanças.

O advogado de Samir pediu uma pena mínima e justificou-se, em parte, com a vida financeiramente difícil e de desemprego do pai em Portugal para acompanhar as filhas. 

“Com relação à pena de multa, [o advogado] requereu que seja fixada no mínimo legal já que o réu está desempregado e residindo em outro país em razão do tratamento de suas filhas que sofrem da doença genética rara (atrofia muscular espinhal), portanto, evidenciada a condição de fragilidade financeira", pode ler-se na sentença que condenou Samir Assad Filho.

Na altura, o pai vivia com as filhas numa vivenda em São Domingos de Rana, no concelho de Cascais.

Dívida de 67 milhões de euros

O processo aguarda agora por uma decisão depois do recurso. Em causa estão alegados crimes relacionados com uma empresa de importação de produtos eletrónicos. O pai das gémeas é acusado de dever ao fisco 372 milhões de reais pela atividade da empresa durante dois anos (2010 e 2011).

No site com a lista de devedores ao Estado Federal brasileiro a dívida atribuída hoje a Samir Assad Filho ronda os 360 milhões de reais, ou seja, ao câmbio de hoje, cerca de 67,5 milhões de euros.

Em resposta ao tribunal, o arguido argumentou que não era ele a gerir a empresa e a sentença de 2021, na primeira instância, conclui o contrário: “As provas produzidas nos autos deixam clara a responsabilidade do acusado pelos factos que lhe são imputados, constituindo elementos mais do que suficientes para condenação penal".

Nas últimas duas décadas, Samir Assad Filho foi sócio de várias empresas, não apenas no Brasil, mas também numa empresa com sede na Zona Franca da Madeira, conhecida pelos seus benefícios fiscais. Contudo, desde que foi criada, em 2020 (já depois do tratamento das filhas), a empresa só tem dado prejuízos, com zero receitas e alguns milhares de euros de prejuízos.

Em 2017, dois anos antes de vir para Portugal à procura do tratamento para as filhas, a mãe das gémeas também passou a ser sócia (com 50%) de uma empresa com sede em Mortágua.

O negócio de venda de cosméticos e produtos eróticos tem tido prejuízos nos últimos anos e em 2022 Daniela Martins desfez-se da participação na empresa.

Recorde-se que os médicos do hospital de Santa Maria contactados pela TVI estranharam a aparente riqueza do casal, dizendo que chegaram a Lisboa com empregadas.

A TVI tentou, sem sucesso, falar com o pai da gémeas.

Avô em fraude de milhões com obras em central nuclear

Além do problema judicial do pai em São Paulo, também o avô das crianças teve problemas com a justiça no Brasil, sendo condenado há cinco anos no âmbito de um caso com origem no megaprocesso Lava Jato.

Em causa estavam alegados crimes de fraude, lavagem de dinheiro e organização criminosa com obras fictícias, nunca feitas, de milhões de reais, com subornos, numa central nuclear brasileira.

Durante o julgamento, o avô das crianças (tal como o tio) acabou a ter uma colaboração premiada com a justiça, vendo reduzida a pena.

A decisão da primeira instância refere que "as circunstâncias em que se deram os atos de lavagem de capitais revelam a criação de uma sofisticada e complexa estrutura empresarial voltada para a prática de crimes, a qual de maneira 'eficiente' promoveu a circulação clandestina de altas somas de dinheiro".

Além disso, diz o documento consultado pelo Exclusivo da TVI, “a culpabilidade do condenado Samir Assad é elevada (...) Embora se tratasse de pessoa abastada, optou por praticar delitos de maneira 'profissional'".

O tribunal concluiu que por causa do esquema criminoso a Eletronuclear (uma empresa brasileira de capitais públicos) teve prejuízos de 33 milhões de euros que os três condenados teriam de pagar como indemnização.

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