Papaia, polpa de açaí, Gurvinder, Ari, cães à procura de explosivos, "o melhor é fugires": Xuxas, o julgamento - dia 1

2 abr, 13:30

Rúben Oliveira, conhecido por "Xuxas", é apontado com um dos maiores narcotraficantes portugueses. Está em prisão preventiva na cadeia de alta segurança de Monsanto. O caso envolve ligações com organizações de narcotráfico do Brasil e da Colômbia

Arrancou no Juízo Central Criminal de Lisboa o julgamento de Rúben Oliveira e de mais 18 arguidos por associação criminosa, tráfico de cocaína e branqueamento de capitais. O arguido identificou-se, apontando que era empresário e que estava ligado a vários negócios. “Xuxas” disse que poderá falar durante o julgamento mas que não vai fazê-lo por agora.

Todos os arguidos saíram depois da sala, excetuando William Cruz e Gurvinder Singh, que prestaram declarações na sessão desta terça-feira. Gurvinder Singh, homem que tinha a empresa que importou a papaia onde a polícia encontrou mais de 300 quilos de cocaína, foi dos primeiros elementos da rede a ser detido – em fevereiro de 2022. Segundo o empresário, foi enganado pela organização criminosa, que o terá usado para introduzir a droga no país.

Em tribunal, o arguido contou que conhecia Rúben Oliveira (“Xuxas”) dos Olivais Sul, devido aos supermercados que possui, e que conheceu Luís Ferreira através deste, sendo-lhe apresentado como vendedor de fruta mais barata. Singh revela que fez algumas encomendas a este homem em 2021, não sabendo precisar quantas.

Confrontado pela juíza com o facto de existirem registos de importações de 2020 e 2021, Gurvinder Singh disse que mandou vir um primeiro carregamento de papaias, mas que não terá encomendado polpa de açaí nem o último carregamento de papaia, tendo sido Luís Ferreira quem passou os dados da empresa para mandar vir esta mercadoria.

O comerciante foi confrontado com o facto de ter dado informação a alguém que não conhecia e que nem o verdadeiro nome sabia. Justificou que terá sido para abrir ficha de cliente de onde vinha a mercadoria. Singh contou ainda que comunicava com Luís Ferreira, que trata como Ari, através de mensagens no Signal.

Explicou que fazia revenda e que conseguiu vender a primeira carga toda nas lojas e minimercados, garantido ter comprovativo de pagamento da mesma: “Combinei com o Ari (Luís Ferreira) que ele trazia a fruta mais barata, eu arcava com as despesas e ele ganhava uma comissão. O senhor Ari tinha os dados da empresa e importou o açaí, que se estragou, porque disse que ia levantar e não levantou.”

Esta mercadoria terá sido paga diretamente na alfândega por Luís Ferreira e no segundo carregamento de açaí Singh contou que foi contactado porque a fruta vinha pelo Aeroporto Humberto Delgado.

Gurvinder Singh disse que não sabia o que Luís Ferreira tinha mandado vir, uma vez que a alfândega nunca o tinha contactado antes.

E Rúben Oliveira? Singh começou por dizer que só o conhecia de forma superficial – apenas se cumprimentavam. Mais à frente, informou o tribunal que só falou com “Xuxas” quando chegou a carga a 14 de fevereiro de 2022, através do Signal ou WhatsApp. Disse que recebeu uma chamada, mas que não atendeu.

Segundo o arguido, recebeu uma mensagem a dizer “é melhor fugires” e que achou estranho, por isso apagou-a.

Após a pausa para almoço, a primeira sessão de julgamento foi retomada, às 14:00, com a juíza a questionar Gurvinder Singh sobre se o arguido não tinha estranhado que o "Ari tivesse mandado vir paletes de popa de açaí para que depois a carga ficasse na alfândega sem que ninguém a fosse levantar".

Gurvinder mais uma vez rejeitou qualquer tipo de culpa e garantiu que ligou a Rúben Oliveira (Xuxas) que lhe disse que, juntamente com Ari, iria buscar a mercadoria, mas que tal acabou por acontecer. O empresário indiano explicou que foi então que optou por carrinhas para recolher a “polpa de açaí” que permanecia no Aeroporto Humberto Delgado com José Cabral, agora também arguido. Gurvinder Singh assegura que esta foi a primeira vez que viu Cabral.

"Sinto-me envergonhado comigo próprio, dantes era respeitado pela comunidade mas agora chamam me traficante", culminou Gurvinder Singh.

No sítio errado à hora errada

William Cruz, que trabalha num stand de automóveis, contou detalhes do seu encontro com José Cabral, com quem teria combinado lanchar, deixando sempre a ideia de que não faz parte da organização e de que foi detido por estar no sítio errado à hora errada.

O arguido terá seguido José Cabral, que lhe disse que ia levantar uma mercadoria à zona de cargas e descargas do aeroporto. William Cruz disse que só soube o que tinha sido recolhido quando foi detido, responsabilizando o outro arguido pelo que aconteceu.

Antes de começar a sessão, cães pisteiros passaram revista à sala para detetar eventuais explosivos.

Vítor Parente Ribeiro foi o primeiro a começar a falar. O advogado de “Xuxas” apresentou vários factos que pretendia explicar, nomeadamente as informações recolhidas pelas autoridades francesas.

“Não estamos a fazer um julgamento público, limite-se ao que está na lei”, apontou a juíza, acrescentando: “Importa descobrir prova e descobrirmos a verdade.”

Ainda assim, Vítor Parente apontou que há que dar “especial atenção” à “personagem António Leão” e reiterou o pedido para que o tribunal não se deixe influenciar por forças exteriores ao processo.

Xuxas, apontado com um dos maiores narcotraficantes portugueses, está em prisão preventiva na cadeia de alta segurança de Monsanto desde junho de 2022.

O caso envolve ligações com organizações de narcotráfico do Brasil e da Colômbia.

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