Análise: Partido Comunista chinês acha que os censores não estão a censurar o Weibo o suficiente

CNN , Análise de Nectar Gan e Steve George
9 jan 2022, 10:00
 Weibo, a versão altamente censurada do Twitter na China, foi multado em milhões de dólares por não censurar o suficiente

Weibo, a resposta da China ao Twitter, há muito que é um alvo principal da rigorosa censura online, graças à sua vasta audiência e capacidade para ajudar a influenciar a opinião pública.

Mas aos olhos do Partido Comunista chinês não está a censurar o suficiente – e tem de pagar um preço, literalmente.

Na terça-feira, 14 de dezembro, o Weibo foi multado em 470 mil dólares por disseminar repetidamente "informação ilegal" violando as leis e regulamentações do país, incluindo a lei da cibersegurança e uma lei de proteção de menores.

Não é, de todo, a primeira vez que o Weibo é atingido com uma multa tão pesada do Governo. Nos primeiros onze meses deste ano, o gigante das redes sociais foi multado 44 vezes por transgressões, num total de 2,2 milhões de dólares, segundo a Administração do Ciberespaço da China (CAC), uma agência governamental sob o controlo do partido.

Weibo disse, em comunicado, que "aceita sinceramente a crítica" do regulador e estabeleceu um grupo de trabalho como resposta à penalização.

A última punição do Weibo chegou apenas duas semanas depois de o Douban, um popular site para análise de filmes, livros e música, ter sido multado em 236 mil dólares, por motivos semelhantes – juntando aos 1,4 milhões em coimas que acumulou até novembro deste ano por alegadas violações de conteúdos.

As empresas chinesas de Internet há muito que estão sujeitas a ataques do Governo, com os seus executivos a serem muitas vezes convocados pela CAC por "críticas e retificação". Mas é raro os reguladores do Governo admoestarem abertamente plataformas por fazerem um mau trabalho na censura, afirmam os analistas.

"O primeiro passo da censura é que não se pode falar da censura. Não é permitido divulgá-la, a não ser que seja ordenado [pelo Governo]," disse Eric Liu, um analista do China Digital Times, um website de notícias baseado nos EUA que rastreia a censura na China.

Ao anunciar as penalizações ao Weibo e ao Douban, Liu disse que o Partido Comunista "trazia a questão a público" propositadamente – salientando que uma punição tão dura pode tornar-se uma ocorrência regular.

Para além dos censores do Governo, as empresas chinesas de Internet também contratam moderadores dedicados a policiar as suas próprias plataformas, removendo conteúdos considerados ilegais ou prejudiciais pelo Partido – o que vai de pornografia, violência e fraude a crítica ao Governo ou outras informações que o Partido considere "politicamente sensíveis" ou "moralmente decadentes", tal como conteúdo LGBTQ.

Liu, o analista, trabalhou previamente como censor de conteúdos no Weibo de 2011 a 2013. Durante este período, compilou mais de 800 ficheiros de ordens de censura para a empresa. Mas, hoje em dia, diz que as ordens de reguladores da Internet são emitidas mais discretamente via canais mais seguros, tornando muito mais difícil para os funcionários as divulgarem.

"Ora, é a censura da censura. Os censores também estão a ser vigiados," afirmou.

Com o Presidente Xi Jinping, o Partido apertou o controlo da Internet, encarando-a como suscetível de infiltração Ocidental. Há pouco mais de uma década, o Weibo organizava debates sobre várias questões sociais e intelectuais públicos de tendência progressista conseguiam angariar muitos seguidores.

Mas isso mudou com Xi. Hoje, as vozes mais progressistas foram silenciadas. Tópicos como feminismo, o movimento LGBTQ e a defesa ambiental são cada vez mais encarados com suspeição como marionetas da influência Ocidental, com os censores a tentarem acompanhar uma lista cada vez maior de "palavras sensíveis" ou termos banidos.

Quando Liu trabalhava no Weibo, a empresa tinha cerca de 200 moderadores de conteúdo, afirmou. Liu espera que o número se tenha multiplicado, visto que agora a plataforma tem agora mais de 500 milhões de utilizadores ativos.

"Quando o tráfego da rede aumenta, aumenta também a pressão sobre a censura. Dentro da Grande Muralha, toda a gente enfrenta censura cada vez mais rígida – é como a inflação, afirmou, referindo-se ao sofisticado sistema de censura online do país.

"A censura está a expandir-se para todo o lado, o que significa que as empresas têm de contratar mais pessoas." E isso pode tornar-se um grande fardo financeiro, sobretudo para empresas mais pequenas, acrescentou Liu.

Sarah Cook, diretora de pesquisa para a China na ONG norte-americana Freedom House, disse que as últimas multas fazem parte de uma campanha em curso do Partido Comunista para "pressionar as empresas tecnológicas a controlarem com maior rigor o conteúdo das suas plataformas."

"É uma tarefa quase impossível para as plataformas, dada a escala de utilizadores e das 'linhas vermelhas' em constante mudança, mas este género de multas periódicas e esforços de 'retificação' mantém-nas alertas e incentivam-nas a obedecerem à censura do Partido Comunista."

Apesar de o regulador de Internet não especificar o conteúdo que desencadeou as penalizações para o Weibo e o Douban, os analistas acham que podem estar relacionadas com o escândalo do #MeToo que envolveu a tenista chinesa Peng Shuai.

Peng, 35, acusou publicamente o antigo vice-primeiro-ministro Zhang Gaoli de agressão sexual no Weibo, a 2 de novembro. A publicação foi apagada em menos de 30 minutos e a conta no Weibo foi bloqueada nas pesquisas, mas os printscreens da publicação continuaram a circular pelas redes sociais e em grupos privados de conversação, antes de terem sido censurados. E apesar dos melhores esforços dos censores para eliminar todas as discussões e até a mais leve referência às alegações dela da Internet, de tempos a tempos, continuam a surgir alusões e debates encapotados, incluindo no Weibo e no Douban.

"Aparentemente, o Weibo foi penalizado dessa vez pelo escândalo de Peng Shuai, que é a maior campanha de censura do ano," afirmou Liu. Mas as autoridades chinesas nunca irão admitir que houve censura no caso Peng, acrescentou.

"Todos sabemos que algumas publicações foram censuradas, mas já ninguém se atreve a perguntar porquê. Até mesmo discutir que publicações foram censuradas já se tornou um ato muito assustador e de provocação."

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