Auditoria confirma que foi Lacerda Sales que marcou a consulta das gémeas no Santa Maria

13 dez 2023, 15:07
(António Lacerda Sales (Carlos M. Almeida/Lusa)

Confirmando que foram 10 os utentes que receberam o tratamento em causa, a auditoria refere que apenas duas crianças - as gémeas - foram referenciadas pelo secretário de Estado

A auditoria ao Hospital de Santa Maria confirmou que foi o secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales, que marcou a consulta das gémeas tratadas naquela unidade para a atrofia muscular espinhal tipo 1.

A CNN Portugal teve acesso ao documento, confirmando que foi o então governante a intervir no caso, sendo que a presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) já tinha confirmado que este documento, onde António Lacerda Sales é referido três vezes, já está nas mãos do Ministério da Saúde e da Inspeção-Geral de Atividades em Saúde (IGAS).

Confirmando que foram 10 os utentes que receberam este tratamento, a auditoria refere que apenas duas crianças - as gémeas - foram referenciadas pelo secretário de Estado. "Apenas duas utentes com atrofia muscular espinhal, com medicação Zolgensma, foram referenciados pelo secretário de Estado da Saúde", lê-se. 

Esta mesma consulta foi marcada por via telefónica, tendo violado a portaria que regula o acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), sendo que esta portaria foi assinada pelo anterior ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes.

Esta mesma portaria tem força de lei e, como tal, pode ter implicações ao nível disciplinar, mas também penal, uma vez que pode estar em causa um titular de cargo público, podendo incorrer num eventual abuso de poder.

Ainda de acordo com a auditoria, as gémeas tiveram residência no Brasil até 22 de dezembro de 2019, tendo sido mudada a residência para Portugal no dia seguinte, por forma a receberem o Zolgensma, o medicamento mais caro do mundo, avaliado em dois milhões de euros por dose, o que veio a acontecer em junho de 2020.

Esta mesma auditoria confirma que, tal como a CNN Portugal já tinha avançado há um mês, as gémeas não estiveram presentes na primeira consulta, à qual foram apenas os tios e o pai.

Respondendo a várias dúvidas que foram suscitadas pelo corpo clínico do Santa Maria, que mostrou dúvidas sobre a vantagem de passar as gémeas para este medicamento, a auditoria concluiu que não existe demonstração científica que tenha sido terapeuticamente melhor passar do medicamento que estava a ser administrado para o Zolgensma.

"Concluiu-se que não existe demonstração de valor terapêutico de Onasemnogene Abeparvovec [nome clínico do Zolgensma] em relação a Nusinersen. Contudo, é reconhecido o efeito benéfico do fármaco", pode ler-se no documento, que ressalva que o Zolgensma tem um custo menor.

A auditoria entende ainda que tendo em conta as conclusões da avaliação farmacoterapêutica e farmacoeconómica, a "minimização de custos e do impacto orçamental", bem como a negociação de condições para a utilização do medicamento, "admite-se a utilização do medicamento em meio hospitalar".

Este mesmo relatório confirma que foram gastos quase 16 milhões de euros no tratamento de 10 crianças com esta doença desde 2019. Sobre a forma de pagamento do medicamento inovador Zolgensma, a presidente do Conselho de Administração do CHULN disse que é através de um "acordo de risco partilhado" entre o Infarmed e o laboratório, "baseado em resultados de vida real, monitorizados (...) e com pagamentos faseados durante os primeiros quatro anos a contar do início do tratamento, variando "consoante os resultados do tratamento".

"É em função disto que as crianças são monitorizadas. Se houver resultados positivos é paga a tranche, se não houver, não é paga e a empresa que acarreta com o custo", explicou Ana Paula Martins.

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