Cães conseguem associar algumas palavras a objetos

CNN , Issy Ronald
14 abr, 12:00
18 cães e os seus donos participaram no estudo (Oszkar Daniel Gati)

Se acha que o seu cão sabe bem o que significa a palavra “biscoito”, o melhor é ler este artigo

Os cães conseguem compreender que certas palavras se referem a objetos específicos, segundo um estudo recente. Sugere-se assim que podem entender palavras de uma forma semelhante à dos humanos.

O estudo fornece a primeira evidência de atividade cerebral para este tipo de compreensão num animal não-humano, explicam as investigadoras. As conclusões da investigação enfrentaram o escrutínio de outros especialistas na área.

Há muito que se sabia que os cães conseguiam aprender comandos como "senta", "fica" ou "busca", respondendo a estas palavras com comportamentos aprendidos, muitas vezes com a ajuda de um biscoito canino. Contudo, tem sido mais difícil desvendar a sua compreensão das palavras.

Para entender a capacidade linguística dos cães, Lilla Magyari, professora associada da Stavanger University na Norguega e investigadora na Eötvös Loránd University na Hungria, e Marianna Boros, investigadora de pós-doutoramento na Eötvös Loránd University, inspiraram-se em pesquisas que analisaram a compreensão dos bebés antes de falarem. Decidiram replicar essas experiências com cães, explicaram.

Como principais autoras do estudo, desenvolveram uma experiência na qual 18 donos diziam as palavras de objetos que os seus cães já conheciam. Depois, os donos seguravam o objeto correspondente ou outro diferente, enquanto pequenos discos de metal, presos sem magoar, nas cabeças dos cães, mediam a sua atividade cerebral, num processo conhecido como eletroencefalografia (EEG).

Desta forma, as cientistas observaram que a atividade cerebral em 14 dos 18 cães foi diferente quando lhes era mostrado um objeto que correspondia à palavra, quando comparado com outros em que a palavra que não correspondia. As investigadoras referiram que a atividade cerebral resultante era a mesma produzida por humanos em experiências semelhantes.

Investigadoras mediram a atividade cerebral dos cães (Grzegorz Eliasiewicz)

“O nosso objetivo é dizer que um cão compreende uma palavra. E isso significa que, na ausência do objeto, ativa aquilo a que chamamos representação mental”, disse Boros. “Podemos imaginá-lo como a memória daquele objeto”.

“Quando o dono mostra o objeto que não corresponde àquela representação mental, então há uma resposta cerebral muito típica, que observámos no cérebro do cão, que nos humanos é largamente aceite como um índice de compreensão semântica”

Houve um intervalo de dois segundos entre o momento em que os donos diziam uma palavra e o momento em que mostravam o objeto, uma condição que favorece a interpretação de que os cães compreenderam as palavras, mais do que simplesmente a terem associado ao objeto, argumentam as investigadoras no estudo.

As palavras que os cães conheciam melhor – segundo indicado pelos donos – também produziram um efeito de incompatibilidade maior quando era mostrado o objeto errado aos animais – algo que, para as investigadoras, reforçou a sua tese.

Experiência anteriores para testar a compreensão das palavras pelos cães envolveram a busca de objetos específicos quando solicitados, segundo um comunicado divulgado pela Eötvös Loránd University.

Este método sugeriu que os cães apenas procuravam o objeto, à escala desejada, por mero acaso. Contudo, como notou Magyari, os cães também podem estar desmotivados e distraídos durante os estudos.

Investigadoras testaram a compreensão das palavras pelos cães (Marianna Boros)

Ao usar eletroencefalografia (EEG), não houve necessidade de uma resposta comportamental. As investigadoras foram capazes de testar a “compreensão passiva” dos cães, uma vez que assim “talvez consigam revelar mais do que aquilo que são capazes de exibir ou mostrar”, juntou.

Mas a verdadeira dimensão da compreensão dos cães ainda é desconhecida, até pelas autoras do estudo, uma vez que os cães estavam a responder aos seus próprios brinquedos e objetos, que os donos levaram para o laboratório.

“Neste estudo, sabemos apenas que, quando ouviram as palavras, esperavam os objetos deles”, disse Magyari.

“Deste modo, não sabemos qual o nível de compreensão que os cães têm sobre a relação entre as palavras e os objetos, se também reflete um conhecimento categórico. Ou seja, se sabem que a palavra bola se refere a muitas coisas com a forma de bola ou apenas à sua própria bola. Isto é algo que os próximos estudos precisam de analisar”.

Clive Wynne, professor na Arizona State University e diretor do laboratório Canine Science Collaboratory, disse à CNN que esta experiência tinha um conceito “inteligente”. Contudo, admitiu, mostrou apenas que os cães entendiam um “estímulo” seguido de uma “consequência importante”, em vez do significado intrínseco da palavra.

Os donos seguraram objetos para testar a compreensão dos seus cães (Oszkar Daniel Gati)

Este especialista fala ainda do intervalo dado na experiência [entre dizer a palavra e mostrar o objeto]. “Se for para condicionar, pode haver um intervalo de alguns segundos”. E destacou que apenas palavras conhecidas provocariam uma resposta e explicariam o maior efeito de incompatibilidade.

Wynne referiu que os cães não possuem duas áreas do cérebro cruciais para uma compreensão da linguagem como fazem os humanos, não partilhando, por isso, os padrões da eletroencefalografia, como destacado pelas investigadoras.

“Se afirmamos que o padrão das ondas cerebrais evidencia a compreensão das palavras, é necessário o padrão seja o mesmo”, resumiu Wynne.

O estudo foi publicado na revista Current Biology a 22 de março.

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