Não foi um grande início de ano para a segurança da aviação, com uma colisão na pista do aeroporto de Haneda, em Tóquio, e uma porta de um 737 Max 9 da Alaska Airlines a explodir no ar e a ganhar manchetes, com poucos dias de diferença, e com mais quatro acidentes fatais envolvendo aeronaves regionais e executivas nas semanas seguintes.
A Boeing, fabricante do 737, tem estado particularmente sob escrutínio quando se descobriu que a explosão se deveu a problemas de fabrico e alguns viajantes estão agora a optar ativamente por evitar reservar voos em aviões Max 9.
Compreensivelmente, a ansiedade em relação a voar está em alta – mas há algum motivo para preocupação?
“Não acredito que nos devamos preocupar”, diz Geoffrey Thomas, especialista em segurança da aviação e editor-chefe da Airline Ratings, que publica uma lista anual das companhias aéreas mais seguras do mundo.
“Certamente a Boeing teve alguns problemas de produção, que está a resolver, e isso não é uma boa imagem. Mas o ponto principal é que existem tantas verificações em vigor agora, que não acredito que alguém deva se preocupar. Eu certamente não hesitaria em embarcar numa aeronave Boeing.”
O 737, acrescenta Thomas, ainda tem um histórico de segurança melhor do que o 747.
“E ninguém hesitaria em embarcar num 747”, diz ele. “Uma das questões da aviação, com o passar do tempo, é que os fabricantes e as companhias aéreas aprendem com os próprios erros e implementam sistemas para garantir que não os volta a cometer. Então, estatisticamente, com o tempo, voar fica cada vez mais seguro e mais seguro.”
Numa análise recente, a Airline Ratings identificou uma lista de aeronaves que podem ser consideradas as mais seguras para voar, nunca tendo sofrido nenhum acidente com vítimas mortais. Entre elas estão os Boeing 787 e 777-300ER e os Airbus A220, A320neo e A380.
A lista das companhias aéreas mais seguras do mundo é encabeçada pela Air New Zealand, Qantas, Virgin Australia, Etihad Airways, Qatar Airways, Emirates, All Nippon Airways, Finnair e Cathay Pacific.
Mais seguro do que conduzir
“A aviação é o meio de transporte mais seguro”, diz Anthony Brickhouse, professor de segurança da aviação na Embry-Riddle Aeronautical University, na Flórida.
“Se olharmos para os números, vemos que corremos mais riscos de sofrer um acidente enquanto conduzimos para o aeroporto do que a voar a 38.000 pés. Eu digo às pessoas, ‘se conseguir chegar ao seu voo, a parte mais perigosa do seu dia ficará para trás’.”
Os passageiros, acrescenta Brickhouse, deveriam prestar menos atenção exatamente em que aeronave estão a voar e concentrar-se em coisas que podem controlar, como sua segurança pessoal ao embarcar.
“Por exemplo, prestando atenção durante o briefing de segurança e sabendo onde ficam as saídas de emergência, ou não voando com crianças ao colo”, afirma.
A Administração Federal de Aviação dos EUA [FAA, da sigla em Inglês] e o Conselho Nacional de Segurança nos Transportes, observa Brickhouse, estão a investigar a explosão do Max 9 e o facto de a aeronave estar de volta ao ar significa que eles completaram todas as inspeções necessárias para garantir que seja o mais seguro possível.
Na colisão na pista de Tóquio, um Airbus A350 da Japan Airlines atingiu um Dash 8, um avião regional turboélice operado pela Guarda Costeira de Tóquio, matando cinco dos seus seis tripulantes.
No ano passado, uma série de quase acidentes em aeroportos dos EUA motivou uma investigação por parte da FAA.
“Se houver uma certa tendência que continua a ocorrer, a menos que se façam mudanças bastante significativas, essa tendência infelizmente vai transformar-se num acidente”, diz Brickhouse. “E eu acho que é realmente importante que estejamos a fazer o que estamos a faze, a analisar todos esses perigos no ambiente aeroportuário, para aprender o máximo que pudermos e para que possamos evitar esse desastre que pode estar à espreita.
“Infelizmente, com o acidente da Japan Airlines, perdemos cinco pessoas na aeronave militar, mas todos conseguiram escapar da aeronave civil. Do ponto de vista da segurança, ainda podemos distinguir o que deu certo e o que não deu.”
Após o acidente, o Japão modificou alguns procedimentos relativos ao controle de tráfego aéreo, como ter funcionários a monitorizar constantemente os sistemas de radar terrestre que alertam sobre possíveis colisões na pista.
No entanto, isto levou a pedidos de um aumento significativo de trabalhadores, uma vez que se acredita que a medida vai colocar ainda mais pressão sobre os funcionários já sobrecarregados.
Perto de zero
O último relatório de segurança da IATA, a associação comercial das companhias aéreas mundiais, afirma que, em 2022, houve um total de 39 acidentes de aviação comercial no mundo, com 158 mortes a bordo – o que equivale a um acidente a cada 0,83 milhões de voos.
“Acidentes são raros na aviação”, disse Willie Walsh, diretor-geral da IATA, num comunicado que acompanha o relatório.
“Ocorreram cinco acidentes fatais entre 32,2 milhões de voos em 2022. Isso diz-nos que voar está entre as atividades mais seguras que uma pessoa pode realizar. Mas, embora o risco de voar seja excecionalmente baixo, não é nulo.
“A análise cuidadosa das tendências que estão a surgir, mesmo com esses níveis muito elevados de segurança, é o que tornará o voo ainda mais seguro. O relatório deste ano, por exemplo, diz-nos que precisamos de fazer alguns esforços especiais nas operações turboélice em África e na América Latina.”
A IATA afirma que, nos últimos 10 anos, a indústria melhorou o seu desempenho geral de segurança em 48%.
Um estudo realizado por Arnold Barnett, professor de estatística no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, concentra-se exatamente no histórico cada vez melhor de segurança da aviação. O estudo, que ainda não foi publicado, dá continuidade ao que ele divulgou em 2020, mas analisa dados de voos mais recentes, até 2022.
A principal conclusão é que, no período entre 2018 e 2022, o risco mundial de morte por embarque era de um em 13,4 milhões - o que significa que se escolhêssemos um voo completamente ao acaso e simplesmente o amanhássemos, as nossas hipóteses de morrer num acidente de avião ou num ato terrorista são de cerca de um em 13 milhões.
Para colocar isto em contexto, há uma hipótese muito maior de morrer num ataque de tubarão, ou de dar à luz quadrigêmeos, do que morrer num acidente de avião.
Isto representa também uma melhoria significativa em relação ao período de 2008 a 2017, em que o risco era de um em 7,9 milhões, e uma queda dramática em comparação com o período de 1968 a 1977, em que o risco era de uma morte em cada 350.000 embarques.
“No último meio século, temos agora apenas cerca de 1/38 da probabilidade de morrer num acidente de avião, em comparação com os níveis dos finais dos anos 1960 e 1970”, diz Barnett.
Probabilidade remota
No entanto, partilhando as preocupações da IATA, alerta que o mundo não é homogéneo e que há regiões que sofrem uma maior taxa de acidentes, particularmente países em desenvolvimento na Ásia, em África e na América Latina.
“Atualmente, há uma morte a cada 2 milhões de embarques, o que é superior à média mundial de uma em 13 milhões”, acrescenta.
Por outro lado, nos países onde o estudo considera mais seguro voar – incluindo Austrália, Canadá, China, União Europeia, Israel, Japão, Nova Zelândia, Noruega, Suíça, Reino Unido e Estados Unidos – o risco cai para uma morte em cerca de 80 milhões de embarques.
“Conheço pessoas que têm medo de voar, e esse é um sentimento muito intenso para algumas delas, mas acho que preocupar-se em voar correndo o risco de morte é semelhante a recusar-se a ir ao supermercado porque o teto pode desabar”, acrescenta Barnett.
Quando o risco se aproxima suficientemente de zero, devemos efetivamente tratá-lo como zero, diz Barnett.
“Não acho que, a cada momento que estamos a andar na rua, presumamos que a morte pode ser iminente porque um meteoro pode atingir-nos de repente ou assim. A probabilidade desses eventos é tão remota que simplesmente os tratamos como impossíveis. E acho que voar, estatisticamente, está nessa categoria.”