PARTE I da entrevista do Maisfutebol a Vítor Matos, membro da equipa técnica do Liverpool
O Valadares perdeu um jogador, mas ganhou um treinador. Inspirado pelo FC Porto de Mourinho, Vítor Matos foi como que empurrado para uma carreira nos bancos de suplentes. Começou no clube gaiense e rapidamente chegou ao FC Porto através de Luís Castro e por lá se manteve durante cinco épocas.
Partiu para os chineses do Shandong Luneng em 2017 e regressou a casa, segundo o próprio, a convite de Rui Barros. No entanto, tornou a sair pouco mais de um ano após ter voltado. O convite do Liverpool feito por Pepijn Linders (outro ex-FC Porto) foi irresistível.
Vítor Matos tornou-se admirador e um dos braços direitos de Jurgen Klopp, além de responsável pelo desenvolvimento dos jogadores de elite do Liverpool. O português chegou a ser considerado a melhor contratação do clube por Pepijn Linders.
Parte II: «Em cinco minutos Klopp convence-te a conquistar o mundo com ele»
Parte III: Liverpool quase campeão: «Covid-19 não dá espaço a outros sentimentos»
Maisfutebol: Antes de falarmos do percurso como treinador, permita-me que recuemos à sua infância. A que idade começou a jogar futebol?
Vítor Matos: Sempre fui daquelas crianças que se pudesse jogar futebol 24 horas por dia jogava, quer na rua, na escola, em casa. Portanto, procurava sempre alguma forma para o fazer. De forma oficial, comecei a jogar aos 13 anos no SC Coimbrões que era o clube da minha localidade. Desde esse dia nunca mais me afastei do futebol.
Durante quantos anos jogou?
Fiz todo o percurso de futebol formação e foi precisamente no ano em que passei a sénior que surgiu a oportunidade de ser treinador. O que acabou por ser engraçado, porque treinei muitos dos meus colegas de equipa.
Quando percebeu que queria seguir a via de treinador?
Sempre tive uma paixão enorme pelo futebol. Fui estando ligado enquanto jogador do SC Coimbrões e no CF Valadares e, mais tarde, tive a felicidade de assistir a um grande momento do FC Porto em 2002/03 e 2003/04 com o José Mourinho. Estes dois anos marcaram-me pela forma como a equipa jogava, pela forma como tinha sido construída – penso que ainda tenho os jornais publicados antes e depois dos jogos da Champions League. Isso despertou-me enorme curiosidade, não só pelo trajeto do José Mourinho, como também em saber o que estava por trás de todo aquele sucesso, e consequentemente a vontade de ser treinador. Portanto, com 15 anos já tinha isso definido na minha cabeça. Continuei a jogar até ao primeiro ano de sénior, fui estudar para a Faculdade de Desporto. Mais tarde fui estudar para a Holanda, e quando regressei recebi convite para ser treinador.
Disse que foi para a Holanda.
Fui para a Holanda ao abrigo do programa Erasmus. Na altura, tinha bastante curiosidade sobre o Ajax e o seu projeto de formação bem como sobre a cultura holandesa no que ao futebol e ao treino diz respeito.
E como é que apareceu a oportunidade de ser treinador?
Comecei a carreira de treinador do CF Valadares. É uma história engraçada porque tinha ido estudar para a Holanda, mas já tinha começado a pré-época no clube. Quando voltei, o treinador principal perguntou-me se queria ser adjunto dele em vez de jogador. Essa foi, sem dúvida, a decisão mais acertada, porque de certeza que lhe fui mais útil enquanto treinador adjunto do que como jogador. No ano seguinte, o presidente do clube ofereceu-me a possibilidade de ser treinador dos sub-19, o que com aquela idade [ndr: 21 anos] foi uma experiência fantástica. No final dessa época surge o convite para ir para o Trofense, para o projeto de formação, no qual estive dois anos.
Depois apareceu o FC Porto. Como é que surgiu convite?
Quando ingresso no FC Porto as pessoas responsáveis pelo projeto de formação do clube eram o Luís Castro e o Professor Vítor Frade. O convite surge através do Professor Vítor Frade que me referencia para uma entrevista com o Luís Castro. Depois foi o processo normal de entrevista e de espera pela decisão final. Lembro-me como se fosse hoje do momento em que recebo o ‘sim’. Teve um significado imenso.
Esteve cinco épocas no FC Porto. Que funções desempenhou dentro do clube?
Acredito muito no que são as nossas vivências e na forma como nos preparam para o futuro. Nesse sentido, tive a sorte de ingressar num projeto de formação com um conjunto de treinadores e de pessoas fantásticas, com um conhecimento enorme de jogo e treino, e de todas elas terem muito vincada a cultura de clube. Iniciei as minhas funções no FC Porto como treinador do escalão de sub-9 e adjunto do escalão sub-13. O António Folha foi o primeiro treinador de quem fui adjunto nos escalões do campeonato nacional. Depois, tive uma evolução normal dentro da estrutura do clube, em função das relações que se foram criando e naquilo que o clube acreditava ser a função em que poderia contribuir mais. Fui treinador, treinador adjunto e observador. Isso ajudou-me a ter uma visão macro sobre todo o processo de formação, sobre todos os departamentos e na forma como estes se podem relacionar em função de um objetivo comum.
Acabou por sair do FC Porto para o Shandong Luneng. Porquê?
A decisão de ir para a China teve por base dois grandes fatores. A China surge num contexto que me permitiu uma maior independência financeira e avançar com um projeto de vida familiar com muito mais conforto. O outro fator foi pelo desafio de ir para uma cultura diferente e pelo grupo de pessoas que compunham o projeto.
Que funções desempenhou na China?
Fui coordenador do ciclo dos sub-9 aos sub-13 e ao mesmo tempo treinador dos sub-15 e sub-16.
Que balanço faz dessa experiência?
Foi uma experiência enriquecedora a nível pessoal e profissional. Pessoal pelas diferenças culturais e na forma que temos de entender aquilo que é importante para nós pode não ser importante para eles. Profissionalmente aprendi a relativizar, a separar o que é prioritário e o que é acessório. Permitiu-me perceber que com pequenas mudanças, conseguimos criar um grande impacto.
Por que razão regressou ao FC Porto?
O regresso ao FC Porto aconteceu de forma natural, por toda a relação que tenho com o clube e com toda a estrutura. Foi um regresso a casa, no fundo. Estava em final de contrato na China e já tinha decidido não renovar. Surgiu o convite do Rui Barros e da estrutura para ingressar na sua equipa técnica.
Quais foram os maiores talentos que encontrou na formação do FC Porto?
Preferia não responder a questões sobre jogadores de outros clubes, visto está a aproximar-se a época de transferências. Não quero criar nenhum mal-entendido aqui.