opinião
Jornalista,editor de Sociedade

Desembarque na Madeira em voos da TAP: "Somos da PJ e viemos incomodar. Desculpem"

21 fev, 22:21

Cunha Rodrigues, antigo procurador-geral da República, voltou à carga para insistir que “os aviões militares não são uma empresa de transportes” ao serviço da justiça, a propósito da operação da Madeira. Só não explica, como nenhum dos outros 50 peritos em logística e planeamento operacional que passam pelas televisões, como teriam feito se fossem eles a mandar. Se ficavam sossegados em Lisboa, e de forma educada logo notificavam os suspeitos para esclarecimentos junto às piscinas naturais de Porto Moniz, sem a indelicadeza de irem encontrar dezenas de milhares de euros em notas nas mãos de autarcas, ou diamantes nas gavetas dos mesmos; ou se, pelo contrário, embarcavam 140 inspetores carregados de equipamentos em voos comerciais da TAP – o que seria espetacular para o efeito surpresa desejado. De certeza que a mãe do autarca, na manhã seguinte, ainda teria 46 notas de 200 euros num envelope da Câmara Municipal do Funchal. Não seria melhor terem desembarcado na ilha com uma tabuleta “Somos da PJ e viemos incomodar, desculpem”?

Será que “os aviões militares não são uma empresa de transportes” porque os alvos são os senhores que mandam na soberana região da Madeira, mas cujos eventuais crimes de corrupção lesam todos os que também sustentam as obras públicas nas ilhas? Porque sobre a estreita relação da Polícia Judiciária com a Força Aérea e a Marinha no combate ao tráfico de droga, que tem décadas de constantes ações de vigilância no ar e assaltos a embarcações no mar, nunca se ouviu a ninguém uma palavra de indignação. Será que os aviões militares, do Estado, não é ao serviço dos superiores interesses do Estado que podem estar quando são precisos para a forma mais eficaz de combate a crimes que lesam o erário público em centenas de milhões de euros? 

Será razoável, justo e sensato, que um juiz conselheiro já jubilado, que liderou o Ministério Público, fale em “operação excessiva” no âmbito de três inquéritos cujos contornos e complexidade desconhece tal como todos nós? É alguém que não conhece nada dos processos que sabe se 80 buscas são excessivas? Será normal que esse tipo de apreciações caia em conversas de tabacaria? Serão 140 inspetores pessoas a mais para executar 80 buscas, para além de que deviam ter desembarcado em aviões da TAP, desarmados e com uns bonés da Green Peace?   

Fez mais sentido uma só operação, em larga escala, de recolha definitiva de prova para três inquéritos com equipamentos de rastreio e apreensão de documentos digitais; ou teria feito mais sentido a PJ deslocar-se à Madeira duas ou três vezes (na TAP, sempre) para ir buscar tudo o que precisasse? E, a propósito disso, Sr. Conselheiro: se não fosse o transporte militar, como teria chegado a Lisboa, em meia dúzia de horas, a tonelada de prova recolhida e apreendida nas buscas da Madeira, de modo a ser revista e catalogada a tempo de ser apresentada ao tribunal em sede de interrogatórios judiciais?    
Bater na ação do Ministério Público virou moda, pelo que não faz e agora também pelo que faz. Se há tantas críticas justas a fazer, em relação às injustas, como é aqui o caso, seria exigível algum decoro a quem tem especiais responsabilidades. Intoxicam a opinião pública, fragilizam a Justiça, e sabemos todos quem ganha e esfrega as mãos com isso.

Colunistas

Mais Colunistas

Patrocinados