F.C. Porto-Nacional, 5-2 (crónica)

5 nov 2002, 00:56

Cuidado: não incomodar o dragão! O Nacional pagou cara a ousadia. Despertou o dragão e queimou-se nas chamas da irritação portista.

Não há muitos jogos assim, acelerados, efervescentes, capazes de manter a bancada em constante palpitação, apesar da fácil detecção de duas invariantes, que dispensam uso de lupa ou análise microscópica. O incontornável Deco é, seguramente, a mais relevante, a concessão de novo golo (o sétimo) pela defesa portista na transformação de um livre é a restante. Pelo meio, sobressaem sete momentos da mais pura celebração, um punhado de queixas da arbitragem, mas nenhum lapso que possa ser directamente relacionado com qualquer dos momentos altos do encontro.

Deco, sempre Deco, pode, só por si, concentrar um amontoado de instantes escaldantes, na delícia do drible labiríntico com que deixa um magote de adversários atónitos e na absurda facilidade com que se revela capaz de enganar uma equipa inteira no exíguo espaço de uma cabina telefónica. Encantava já, quando Adriano ousou tocar para a baliza deserta, com Baía perdido no caminho. O Nacional festejava, mesmo desconfiando ter irritado solenemente o adversário, que, parecia sagrado e escrito, lhe cairia em cima no reflexo imediato.

Cantos, livres, tabelas, triangulações. Deco orquestrava, mesmo não estando só. Levava desgraça na ponta das botas, fosse no drible, que deixava metade do opositor a meio de um ataque de nervos, fosse na marca de canto, de onde faria a bola esbarrar na trave, fosse na transformação de livres, método que lhe permitiu festejar a autoria do quarto golo do F.C. Porto. O Nacional, que pressionara adiante, encolhia-se agora, estremecendo a cada ameaça portista, incapaz de decompor tão vasto reportório do adversário, que lhe parecia mais ameaçador do que nunca.

A vantagem madeirense, que mais não servira se não para espicaçar o adversário, foi curta, tal como o empate. O F.C. Porto era equipa a mais para o Nacional, que, não há muito tempo, vencera o Benfica. E a equipa de Mourinho desferia apenas os primeiros pontapés daquela que pode muito bem ter sido a mais doce e encantadora exibição a que o Estádio das Antas assistiu esta época.

Postiga, Maniche, Costinha, mais tarde também Alenitchev, acentuavam a variedade da maravilha azul e branca, sempre servida em maiores doses pelo brasileiro de dribles impensáveis, a quem a plateia chama «novo Pelé». O mesmo que colocaria, ao pontapé, a bola na «gaveta» com a simplicidade de quem aproxima o copo de água dos lábios e sorve tranquilamente dois tragos. Depois de decepcionar Viena, que mal pôde esperar para o ver desfazer equipas, Deco recuperou os dotes mágicos e voltou a fazer o inimaginável, reconduzindo, no melhor da exibição, o F.C. Porto à liderança, que deixou de ser sua apenas por dois dias.

António Costa equivocou-se vezes de mais, poupou, inclusive, uma pequena série de jogadores da visão do cartão amarelo, em especial quem pisou os calcanhares e outras partes delicadas da fisionomia de Deco, mas não se lhe pode apontar lapsos directamente relacionados com o desfecho. Para compor o leque de erros, o árbitro de Setúbal teve o azar de contar com o mau auxílio dos seus assistentes, apressados no erguer da bandeirola em falsas situações de fora-de-jogo.

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