O Governo vai estudar a proibição do uso de telemóveis nas escolas, depois de numa primeira fase optar pela recomendação da proibição. O movimento Menos Ecrãs Mais Vida gostaria que Fernando Alexandre tivesse ido mais longe, mas para as escolas e para os pais a decisão não é tão simples
Para uns é “um passo” mas o Governo devia ter sido mais firme; para outros é “pertinente” surgir sob a forma de recomendação e não deve passar disso. A proibição do uso de smartphones na escola para alunos até aos 12 anos foi anunciada esta quarta-feira pelo ministro da Educação Fernando Alexandre como uma recomendação que pode passar a proibição, mas as opiniões dividem-se.
“Há uma parte de nós que está contente, porque a medida pode abrir caminho para que existam mudanças”, começa por dizer à CNN Portugal Mónica Pereira, do movimento Menos Ecrãs Mais Vida, que tem vindo a reivindicar a proibição “completa” do uso de telemóveis no espaço escolar. Contudo, lamenta, “a autonomia continua a estar nas escolas”.
Apesar de ser “bom haver uma recomendação pela primeira vez”, Mónica Pereira lembra que tal não obriga as escolas a adotá-la e que o Governo devia ter sido mais firme, optando pela “proibição completa”. “É uma medida de recomendação, não vinculativa. Se as direções decidirem não estarem sensíveis, não irão fazer nada”, sublinha, lembrando que este não é caminho que os países europeus – e até a nível mundial – estão a tomar.
As recomendações do Governo são isso mesmo, recomendações, e para o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), Filinto Lima, ainda bem que assim é.
“Surge em jeito de recomendação, o que me agrada. Não fere a autonomia das escolas que tomarão uma decisão, como muitas já tomaram”, observa. Para Filinto Lima, que classifica a ação do Governo como “pertinente”, a recomendação “pode dar força a outras escolas de proibirem o uso do aparelho”. “Mas depende da realidade de cada escola”, avisa.
O presidente da ANDAEP acredita que “seria negativo haver uma proibição nesta fase”. “Não devemos proibir porque o fruto proibido é o mais apetecido”, reforça, lembrando que há até professores que usam os telemóveis como parte da metodologia de ensino: os telemóveis são “um instrumento de futuro” e as escolas estão “a preparar os alunos para o futuro”.
A solução está, de acordo com Filinto Lima, na “sensibilização e educação para o bom uso dos telemóveis”, o que se aplica não só aos alunos como aos pais. “Apelava aos pais para que ajudassem nessa sensibilização. É preciso que lá em casa haja um exemplo. Muitas vezes os alunos estão até altas horas da madrugada nos telemóveis”, aponta.
Mónica Pereira insiste que Fernando Alexandre podia ter ido mais longe. “Há várias escolas que fizeram a mudança e podiam ser consultadas pelo Governo para avançar com a proibição”, lembra, garantindo que as muitas vantagens têm provocado o “contágio” nas escolas que adotam este sistema livre de smartphones.
O cyberbullying diminui, a socialização e a “brincadeira saudável e livre” aumenta, as “distrações nas relações entre pares” são menores e o acesso a conteúdos pornográficos no ambiente escolar também reduz, resume a representante do movimento Menos Ecrãs Mais Vida. Ou seja, defende, adotar a “proibição completa” não parece difícil.
“As escolas podem ter caixas e cacifos para pôr os telemóveis. Se não tiverem estes equipamentos poderão implementar a regra de os telemóveis ficarem desligados na mochila na hora letiva e não letiva”, sugere.
Ainda assim, apesar de o Governo não ter ido ao encontro das pretensões do movimento, que pede a proibição “completa” e vinculativa “até ao 9.º ano pelo menos”, “haver uma recomendação para os 5.º e 6.º anos já é um passo”, reconhece Mónica Pereira.
Não são todos os telemóveis, só os "minicomputadores"
Apesar de Fernando Alexandre ter falado em telemóveis, as recomendações do Governo visam apenas os smartphones, confirmou a CNN Portugal junto de fonte do Ministério.
“Os telemóveis simples e sem acesso à Internet não são uma distração como um minicomputador de bolso como são os smartphones. Os smartphones fazem parte das crianças e os pais esquecem-se que os telemóveis existem”, acrescenta Mónica Pereira.
A representante do Menos Ecrãs Mais Vida lembra também que as escolas estão “equipadas com telefones para que as crianças possam fazer chamadas e os pais também”. Em caso de emergência, é a instituição de ensino quem deve informar o encarregado de educação – “não o filho através do smartphone”, pelo que “não há necessidade”.
Para os pais, "palavras como proibição e banir não são adequadas". É o que defende a presidente da Confederação Nacional de Associações de Pais (Confap) sobre um tema que é "há algum tempo debatido" na associação e que nunca foi "consensual".
"É consensual termos um espaço para a brincadeira, para as regras, para a cultura de utilização de telemóveis e outros dispositivos. Mas é também fundamental a recuperação de espaços lúdicos para os jovens estarem e conviverem", aponta Mariana Carvalho, que defende por isso a definição de "regras para saber usar" os telemóveis.
Para além de usados em contexto pedagódico, lembra, os smartphones também servem para "monitorização médica - como o caso da diabetes, para as entradas e saídas em muitas escolas e para a marcação de senhas".
Mariana Carvalho vai mais além, afirmando que "o telemóvel é uma ferramenta de segurança para os pais". Isto no caso das crianças "que vão de transportes públicos, porque a família não tem como os ir buscar". "Os familiares vão monitorizando através dos telemóveis e sentem-se seguros", refere.
"É uma recomendação, as escolas têm autonomia. Não quero acreditar que haja proibição da entrada de dispositivos para o recinto escolar", assume, questionando: "Vai ser proibida a entrada dos telemóveis a toda a comunidade educativa? É para todos?"