Victoria Mushtey foi surpreendida pela guerra no meio das férias. E, por isso, acabou por ficar em Lisboa. De atriz que contracenou com o presidente Volodymyr Zelensky na famosa série “O Servo do Povo” a refugiada, encarando um papel que nunca imaginou.
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Um ano depois do início da guerra, Victoria está no Reino Unido. Os pais, que tinham encontrado refúgio na Guarda, acabaram por voltar à Ucrânia e seguiram depois para a Alemanha. Mas mantém-se uma ligação com a capital portuguesa: a irmã e a tia de Victoria continuam a viver cá.
Ela decidiu sair de Portugal por causa da profissão, porque a língua era uma barreira. Até chegou a trabalhar como atriz, no Porto, ao abrigo de uma bolsa atribuída pelo Teatro Nacional São João a profissionais da cultura ucranianos refugiados em Portugal. Em julho, apresentou “Ucrânia – Palco Livre/Cinco Estações”.
E o caminho fez-se, depois, fora de Portugal, onde elogia as pessoas, a natureza, a comida, o pôr do sol, o vinho, a arquitetura. Mas não a burocracia. “Não esperava que cada passo com os documentos pudesse ser tão complicado. É também uma das razões pelas quais decidi ir-me embora”, diz à CNN Portugal. E muito menos o acesso a habitação: “Já passou um ano e as minhas familiares ainda não conseguiram encontrar um lugar apropriado.”
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Victoria tem regressado várias vezes a Kiev, onde vivia antes do conflito. “É doloroso. Não existe já o país que havia antes da guerra. É outro sítio, com novas regras e outras pessoas. É importante libertar os sentimentos de nostalgia e aceitar a nova realidade. A Ucrânia continua a ser para mim um lugar de poder e a minha casa.”
O desejo é de que a Rússia perca o conflito e pague pelos seus danos. E que a “máfia que está sentada no Kremlin seja presa”.
Ao fugir da guerra, Vlad Shishko encontrou em Portugal uma nova família. Com Valentina, Natalia e Sofia partilhou as tristezas e as angústias de ver a terra natal em conflito. Mas também os sonhos: como o de abrir um restaurante ucraniano em Lisboa. Esta vontade ainda não se concretizou, porque têm sido muitos os desafios, mais prioritários e urgentes, para resolver.
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“Ainda não tomámos a decisão de sair de Portugal. Sentimo-nos em casa. E estamos muito gratos a todos pela proteção e pela ajuda nestes tempos difíceis”, conta à CNN Portugal. Até porque, na Ucrânia, a situação é “muito difícil” e “não há nenhum sítio para onde voltar”. Eram de Kharkiv, uma das cidades mais massacradas pelos russos.
Apesar da boa vontade, a vida em Portugal tem sido repleta de barreiras: Sofia tem paralisia cerebral e não há nenhum centro por perto que possa acolhê-la, permitindo à mãe Natalia ficar mais disponível para trabalhar. Entretanto vieram também para Portugal a mãe e o padrasto de Natalia, tornando ainda mais evidente os problemas para encontrar um espaço que lhes preste apoio.
“A pior coisa de Portugal é a falta de compreensão das leis e, depois, os problemas com a papelada, o apoio social, que impedem que se resolvam questões vitais” como o apoio a pessoas com deficiência ou idosos que acabaram apanhados pela guerra e tiveram de fugir, explica Vlad.
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A derradeira vontade é a de voltar para a Ucrânia, em paz, sem que mais sangue inocente seja derramado. “Esperamos mesmo que a comunidade internacional aprenda as lições e as conclusões, para que não repitam o horror, a dor e os destinos destruídos que a guerra traz.”
Tatiana Voitseshchuk já não está em Lisboa, a cidade onde, a meio de uma escala de viagem, se transformou em refugiada de guerra. Mas o que ela construiu na capital portuguesa continua de porta aberta: a creche Baby Shark, que acolhe crianças ucranianas, permitindo que as mães possam trabalhar e reorganizar as suas vidas.
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Tatiana ganhou uma bolsa para um mestrado em Gestão Sem Fins Lucrativos em Jerusalém, cidade a partir da qual gere remotamente a creche em Lisboa. “Mas quero voltar a Portugal”, garante.
À Ucrânia também já voltou, no início do outono. “Senti-me muito mal porque entendi quão duro era viver sob a constante pressão dos bombardeamentos.” Em Kiev assistiu ao transporte de caixões e experienciou as falhas de eletricidade. “Mas estava muito orgulhosa de ver quão forte é o meu povo.”
De Portugal recorda os jacarandás de Lisboa bem como o apoio e a bondade de quem lhe deu a mão na missão de criar um espaço seguro para crianças ucranianas. Neste momento, a creche acolhe 50 crianças. Em um ano, já ajudou mais de 200 famílias. Na equipa trabalham onze pessoas, todas refugiadas, com direito a salário. A creche vai mudar de instalações em breve e continua a precisar de voluntários e de doações para manter o seu funcionamento.
Uma das histórias que a CNN Portugal encontrou na Baby Shark em maio passado foi a de Ilona Kubenko e da filha Eva. Elas continuam em Lisboa. Já o marido e pai está, como há um ano, a combater no exército ucraniano.
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Quando visitou a Ucrânia, Ilona sentiu-se feliz e vazia. Em simultâneo. “Ela sentiu-se feliz por estar em casa com a família e amigos, mas vazia por ver como tudo tinha mudado e não voltaria a ser o mesmo”, conta Tatiana. Ainda assim, Ilona quer voltar. E ficar para sempre na Ucrânia.
A paixão pelas ondas da Nazaré trouxe Andrii Afanasiev até Portugal quando a guerra começou. Um ano depois, ele, a mulher e a família continuam no país. “Vivemos em Odivelas, na casa de uma família que nos acolhe, na cave, é uma cave muito boa e renovada. Podemos ficar até encontrarmos uma casa permanente. O proprietário decidiu vender o apartamento e estamos ativamente à procura de um lugar para viver, mas é uma tarefa muito difícil.”
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Tem sido assim ao longo dos últimos meses, a saltar de casa em casa, vivendo da ajuda de terceiros. A decisão de sair de Portugal não está ainda tomada, apesar dos múltiplos obstáculos que foram encontrando. “O nosso maior problema é encontrar uma casa a um preço acessível. Se não o conseguirmos fazer, teremos de voltar para a Ucrânia”, conta à CNN Portugal.
A adaptação da filha ao jardim de infância foi dura. A menina “chorava todos os dias” e até recusava comer. As fotografias mostravam uma criança “triste e assustada”. E tudo por causa de uma língua, a portuguesa, que ela não compreendia e a isolava. A solução acabou por ser encontrada numa escola com pedagogia Waldorf – com maior foco, por exemplo, nos trabalhos manuais -, com o mesmo método de ensino que a filha tinha na Ucrânia.
A família deste fotógrafo não voltou à Ucrânia desde que a guerra começou. “Não temos dinheiro suficiente nem razões para ir à Ucrânia agora. Não nos resta nada lá, nem casa nem familiares.”
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Quando se pergunta a Andrii qual é a melhor parte de Portugal, ele responde várias vezes com a palavra “oceano”. Afinal, foi o mar português que o trouxe até cá. E a pior parte? Aí já há mais diversidade: “habitação cara”, “burocracia”, “barreiras linguísticas”. Candidatou-se a três cursos de português mas até agora, diz, não teve nenhum.
“Continuamos sem perceber quais são os nossos direitos e responsabilidades. O Governo não nos ajuda, à exceção de um apoio muito pequeno. E, depois, também há pessoas más, que tentaram enganar-nos muitas vezes, inclusive tratar-nos como mão de obra barata”, revela o ucraniano.
Uma das primeiras famílias ucranianas a chegar a Portugal na condição de refugiada foi a de Nazar. Estavam no Sri Lanka quando a guerra começou. Como não conseguiam voltar a Kiev, acabaram em Lisboa.
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Um ano depois, estão nos Estados Unidos da América, onde já viviam alguns familiares. Foi isso que ditou a decisão. “Portugal é um dos meus países favoritos, sobretudo os Açores e a área de Sintra. Penso que irei visitá-lo muitas vezes no futuro. Mas aqueles dois meses depois da guerra ter começado foram um pouco duros para nós. Não sabíamos a língua e era extremamente difícil encontrar um apartamento”, recorda Nazar.
A família nunca regressou à Ucrânia. E o pai, que estava disposto a seguir para a terra natal para combater, repensou muitas coisas sobre esta guerra. “Estava pronto para a batalha. Era claro e óbvio. Mas o que eu vi era que o mundo continuava a comprar recursos da Rússia que financiam esta guerra e, ao mesmo tempo, a dar armas e dinheiro para a Ucrânia. A própria Ucrânia fechou as fronteiras aos homens. A Rússia forçou os seus homens à guerra. Então, parece uma arena sangrenta, com combatentes escravizados pelos seus governos e forçados a morrer no campo de batalha, enquanto o mundo atira dinheiro para esta arena, come pipocas e se diverte. E eu não quero fazer parte disso.”
Em um ano de guerra, o SEF atribuiu mais de 58 mil proteções temporárias a refugiados vindos da Ucrânia. Destes, mais de 1500 acabaram por cancelar estes títulos de forma voluntária. Não é certo que todos o que fizeram esse pedido tenham voltado para a Ucrânia, mas é o cenário mais provável: porque, com a proteção, podem viajar livremente pelo Espaço Schengen – do qual a Ucrânia não faz parte.
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