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Gerhard Schröder, o ex-chanceler alemão acusado de ser "moço de recados" de Vladimir Putin

Foi chanceler da Alemanha durante sete anos, antecedendo a Angela Merkel. Durante esse período estimulou uma relação próxima com o presidente da Rússia, relação essa que se mantém até aos dias de hoje. Alexei Navalny chamou-lhe o "moço de recados" do presidente russo

Gazprom, Nord Stream ou Rosneft. São várias as ligações de Gerhard Schröder a consórcios russos, algo que lhe valeu agora a expulsão de sócio honorário do clube de futebol Borussia de Dortmund. O que está por detrás da polémica que visa o homem que esteve à frente dos destinos da Alemanha entre 1998 e 2005?

Além dos cargos que ocupa em várias empresas russas, o ex-chanceler alemão, hoje com 77 anos, é conhecido por manter relações próximas com o presidente da Rússia, Vladimir Putin. A meio da invasão russa à Ucrânia, essas ligações acabaram por trazer consequências.

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O Borussia de Dortmund já tinha pedido que Gerhard Schröder terminasse os vínculos nas variadas empresas, mas a falta de ação do alemão motivou uma ação do clube.

É que Gerhard Schröder é, desde 2017, presidente do Conselho de Vigilância da Rosneft, uma das três maiores empresas petrolíferas da Rússia, e na qual o Estado tem 75% da participação, com o resto a dividir-se entre a Gazprom e a Lukoil, as outras duas maiores empresas do setor na Rússia. Schröder foi alvo de várias críticas da imprensa, mas não deixou a sociedade sem resposta.

"É a minha vida e sou quem decide o que fazer com ela, não a imprensa alemã", disse.

O antigo líder do governo da Alemanha tem também um cargo na Nord Stream, empresa responsável pela construção de gasodutos que fornecem gás natural, que é uma grande parte da energia consumida na Alemanha, e que é importada diretamente à Rússia.

Uma "relação de amizade"

Foi durante a construção do gasoduto Nord Stream 1 que Gerhard Schröder começou por estreitar relações com Vladimir Putin, sendo que a imprensa alemã fala mesmo numa “relação de amizade”. Foi ainda durante o mandato do antecessor de Angela Merkel que foi aprovada a construção do Nord Stream 2, um novo gasoduto que já está pronto mas cuja certificação foi travada pelo novo governo depois da invasão russa à Ucrânia.

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Vladimir Putin e Gerhard Schröder durante uma reunião do G8, em 2005 (Chris Young/AP)

A entrada do alemão na empresa russa dá-se em 2005, apenas um mês depois de perder as eleições por uma pequena margem. Com Gerhard Schröder retirado da vida política, Vladimir Putin apontou diretamente aquele nome para fazer parte dos quadros da Nord Stream, convencendo o alemão da "dimensão europeia do projeto".

Já este ano, em fevereiro, Gerhard Schröder foi nomeado para se juntar à administração da Gazprom, a maior exportadora de gás natural do mundo, e na qual o Estado russo tem mais de 50% das participações. O ex-chanceler foi anunciado como novo quadro da empresa já durante o agudizar do conflito na Ucrânia, o que motivou várias críticas no seio da política alemã. Está previsto que o cargo seja assumido em junho.

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"Um democrata sem falhas"

Começou logo em 1999, quando Vladimir Putin subiu a primeiro-ministro da Rússia, já Gerhard Schröder era chanceler há um ano. Durante os anos seguintes as relações foram-se estreitando, e um dos episódios mais claros da admiração do alemão pelo russo surge em 2004. Questionado sobre a liderança do homólogo russo, o então chefe do governo alemão disse estar "convicto de Vladimir Putin é um democrata sem falhas". Estas declarações surgiram depois de nova vitória do russo na corrida à presidência, onde obteve 71% dos votos. Seguiram-se algumas restrições à formação de partidos políticos e organizações não-governamentais.

Mas a relação entre ambos vai muito para lá do institucional. Quando ambos já lideravam os destinos dos seus países, Gerhard Schröder convidou Vladimir Putin a ir a sua casa, em Hanover, para celebrar o seu 60.º aniversário. Em sentido contrário, o alemão aceitou ir a Moscovo, onde ambos andaram de trenó na altura do Natal.

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Em 2014, menos de um mês depois do início da anexação russa da Crimeia, e por ocasião do 70.º aniversário, o alemão foi recebido em grande estilo em São Petersburgo. Gerhard Schröder definiu Vladimir Putin como um amigo fiável com quem tinha desenvolvido uma amizade baseada na confiança mútua.

"Chamem-lhe uma amizade", disse o alemão, insistindo que os dois não falavam de política.

Vladimir Putin e Gerhard Schröder com as respetivas mulheres (Pavel Kassin/Getty Images)

Dois anos mais tarde, e debaixo de fogo da sociedade alemã, o antigo chanceler encontrava mais pontos em comum com Putin: "Ambas as nossas famílias sofreram terrivelmente durante a Segunda Guerra Mundial. Eu perdi o meu pai, o irmão de Putin morreu durante a ocupação alemã de Leninegrado".

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"Vladimir Putin cumpriu todas as promessas que fez, tal como eu", afirmou.

É esta relação que o alemão parece querer continuar a defender com unhas e dentes. Exemplo disso são as declarações proferidas em 2020, quando disse que "não há factos que provem" que a Rússia estaria por detrás do envenenamento do principal opositor do regime, Alexei Navalny. Isso mesmo motivou Navalny, que ainda hoje está detido, a acusar Gerhard Schröder de receber pagamentos de Vladimir Putin, chamando-lhe mesmo "moço de recados" do presidente russo.

Apesar da pressão vinda da sociedade alemã, o ex-chanceler continua a resistir numa condenação veemente da guerra. Ainda assim, depois da invasão russa se efetivar, o antigo líder dos sociais-democratas criticou a guerra na rede social Linkedin. Mas sublinhou que “ambos os lados cometeram erros” e referiu que a NATO se expandiu demasiado depois da Guerra Fria, o que resultou numa provocação ao Kremlin.

Essas declarações terão sido a gota final para alguns dos seus colaboradores, com quatro deles a demitirem-se nas últimas semanas. Um deles foi o chefe de gabinete, Albrecht Funk, que esteve com Gerhard Schröder nos últimos 20 anos, e que bateu com a porta depois de o chefe recusar deixar os cargos na Gazprom e Rosneft.

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