Esse é um dos aspetos ingratos deste combate: vê-se estrondosamente quando falha, como aconteceu nos atentados de Paris de 2015 ou em Nice em 2016, onde se concluiu pela existência de falhas dos serviços secretos; e é invisível quando a prevenção tem sucesso.
Não é só no resto da Europa, é também em Portugal. Não somos alvo preferencial de atentados, felizmente, mas há um trabalho discreto, secreto e intenso da Unidade Nacional Contraterrorismo da Polícia Judiciária, em articulação com os serviços secretos e em ligação (muitas vezes imperfeita, diga-se) com serviços de inteligência europeus, que tem deslindado ou contribuído decisivamente em vários casos internacionais, por exemplo de portugueses ou lusodescendentes convertidos e envolvidos em redes do Daesh. Os relatórios anuais de Segurança Interna falam disso. É um trabalho muitas vezes de formiguinha que o público desconhece. Já houve aliás investigações que foram traídas por informações divulgadas que afugentaram suspeitos. Nós sabemos pouco disso, os agentes da PJ e das secretas sabem muito.
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Mas eis que esta quinta feira ao fim da tarde a PJ emitiu um comunicado oficial com o título “Impedida ação terrorista”. A notícia explodiu, claro, um rapaz de 18 anos planeara matar a eito na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, foi detido em flagrante delito (preparação de um ataque terrorista é crime) e presente ao juiz. Evitou-se uma tentativa de chacina.
Parabéns à Polícia Judiciária. Parabéns às cooperações internacionais de órgãos policiais, que neste caso envolveram o FBI. Parabéns a todos. Mas…
… porquê comunicar? Cândida Almeida disse o mesmo hoje na Renascença: “Ato terrorista falhado não deve ser divulgado". É das regras, é das práticas.
A PJ é um órgão muito respeitado em Portugal, tem excelentes inspectores, que todos os dias combatem crimes hediondos, muitas (mesmo muitas) vezes colocando a sua própria vida em risco, assistem e passam por coisas que a esmagadora maioria dos cidadãos nem sonha que existem. Este quadro de profissionais só tem um grande defeito: eles são poucos, muito poucos para a criminalidade que existe, seja no combate ao terrorismo, seja no combate ao crime informático em casos como o da Vodafone, seja no combate ao tráfico de droga, à criminalidade violenta, à corrupção, são poucos em todas as frentes e todas as frentes são muito mais do que coletivamente temos consciência.
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Tecnicamente, este é um caso de terrorismo, mas não parece ser um caso de atentado terrorista organizado, como outros na Europa, com ligações a redes criminosas ou com mimetizações de lobos solitários: será mais parecido com casos de atiradores solitários em escolas norte-americanas. Dizê-lo não é menorizar o caso, é querer dar-lhe a leitura que ele exige.
E ele exigirá muitas leituras, sobre o caso em específico mas também sobre o que ele pode representar, talvez convocando análises não apenas jurídicas e criminais, mas também de psicólogos sociais e sobre os riscos de quem se barrica em realidades paralelas na Internet. Para já, a decisão do tribunal foi manter o suspeito em prisão preventiva, ao contrário do que aconteceu em 2013 no caso do jovem que esfaqueou três colegas e uma funcionária numa escola em Massamá, que foi internado em regime fechado num centro educativo.
Precisamos de mais informações para formular análises e não fazer juízos apressados nem montar o circo na cidade. E precisamos de respostas a pergunta como a que titula este artigo, para não concluirmos que a PJ está de parabéns mas não precisávamos de saber que a PJ está de parabéns.
Hoje é um dia feliz na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, safou-se de uma tentativa de ataque terrorista. Em vez de um dia feliz, podia ser apenas um dia normal.
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