Profissão: “agente estrangeiro”. A rede de jornalistas perseguidos por Moscovo que tenta contar a verdade aos russos a partir da Europa

Profissão: “agente estrangeiro”. A rede de jornalistas perseguidos por Moscovo que tenta contar a verdade aos russos a partir da Europa

Reportagem
Helena Lins

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André Lico

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Afonso Alexandre

A lista de “agentes estrangeiros” da Rússia tem 15 páginas. São 493 nomes, que tanto podem ser de meios de comunicação como de jornalistas ou ativistas pelos direitos humanos. O termo remonta à União Soviética e faz lembrar insinuações de espionagem e de “inimigos do povo”. 

Em 2012, organizações não governamentais russas que recebiam fundos do estrangeiro passaram a integrar, por lei, esta lista. No final de 2019, Vladimir Putin alargou a definição legal de quem é considerado um “agente estrangeiro”. E voltou a fazê-lo em 2022, com a invasão da Ucrânia. Hoje abrange “todos aqueles que se encontram sob influência externa ou que recebem apoio do exterior”. O regime define quem se enquadra neste critério e a classificação abrange agora opositores e dissidentes, isolando-os da sociedade russa.

Ninguém quer estar associado a um “agente estrangeiro”. Os meios de comunicação perdem parceiros e publicidade. Os jornalistas têm de indicar explicitamente que são considerados um agente estrangeiro em qualquer conteúdo publicado ou partilhado, incluindo nas redes sociais. Têm, ainda, de apresentar ao governo declarações financeiras e relatórios sobre as suas atividades a cada seis meses e passar por auditorias anuais. Quem não cumprir a lei pode ser multado e arriscar ser preso.

Um meio de comunicação pode ainda ser considerado uma “organização indesejável”. Nesse caso, deixa de poder operar na Rússia e qualquer pessoa com um “envolvimento contínuo” com a mesma fica sujeita a processos e prisão. Medidas que têm sido caracterizadas por críticos do Kremlin como uma perseguição à liberdade de expressão na Rússia. Centenas de jornalistas fugiram para poderem continuar a trabalhar. Eis a história de sete.

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Kirill Martynov: “Acabámos por estar muito confortáveis no coração da ditadura”

“Agente estrangeiro” na Rússia, Kirill Martynov é editor-chefe do jornal Novaya Gazeta Europe, na Letónia

A repressão aos jornalistas não é novidade na Rússia de Vladimir Putin. Desde 2000, seis jornalistas do jornal de investigação mais prestigiado da Rússia, o Novaya Gazeta, foram mortos sem nunca se apurar verdadeiramente por quem nem porquê. Kirill Martynov via as suas caras todos os dias, nos retratos pendurados na sala de reuniões da redação, no centro de Moscovo. “Eles [Kremlin] nunca declararam abertamente que querem destruir os meios de comunicação independentes. Foi sempre como um jogo. E os meus colegas que trabalham há mais tempo dizem que o último ano foi a parte mais difícil da nossa história porque eles declararam o jornalismo um alvo e criaram uma forma muito simples de destruir toda a profissão.”

Uma história com 30 anos, interrompida pela entrada das forças russas na Ucrânia. A 24 de Fevereiro, Roskomnadzor, o regulador das comunicações russo, advertiu os jornalistas para utilizarem apenas fontes oficiais de informação. A 5 de Março, Vladimir Putin aprovou uma lei que condena até 15 anos de prisão quem disseminar “notícias falsas” sobre o que as autoridades descrevem como “operação especial militar” na Ucrânia. A maioria dos jornalistas a trabalhar em meios de comunicação independentes foram classificados como “agentes estrangeiros”. Milhares de sites foram bloqueados, licenças de emissão e de distribuição foram suspensas.

“Quando se vive em Moscovo, damo-nos conta de que nos transformamos em pessoas que de alguma forma já normalizamos a ditadura. Tivemos um belo campeonato de futebol apenas há 5 anos. E temos muito bons serviços, por isso acabas por estar muito confortável no coração da ditadura.” Mas este conforto foi-se tornando insuportável. “Nos primeiros dias da guerra já se sentia que estávamos a viver numa cidade sob algum tipo de ocupação militar. Era uma sensação nova e estranha. As pessoas não estavam felizes, os russos não estavam felizes com esta ideia de Putin começar uma guerra.” Kirill Martynov estava pronto para deixar Moscovo desde o primeiro dia da invasão. “Eu só precisava de uma razão para o fazer.” Ao oitavo dia, cruzou a fronteira com a Letónia para manter vivos os valores pelos quais os colegas morreram. O Novaya Gazeta ainda funcionou durante 32 dias depois da invasão, mas acabou por parar para não arriscar a vida dos colaboradores.

Entretanto, Kirill Martynov criou o Novaya Gazeta Europe, em Riga. Em colaboração com as autoridades locais trouxe vários jornalistas e as suas famílias para a Europa. Apesar de países como a Letónia, Lituânia e República Checa terem fechado fronteiras aos cidadãos russos desde o início da guerra, facilitam a obtenção de vistos para jornalistas dissidentes. 80% do financiamento vem agora de fundações que apoiam o jornalismo independente russo como, por exemplo, o Friends of Novaya Gazeta Europe (Amigos da Novaya Gazeta Europe), criado na Suiça. “Putin quer que nós sejamos propriedade sua. Ele acha que qualquer pessoa com um passaporte russo e qualquer pessoa que entenda russo, é propriedade do estado e sua propriedade pessoal. As mulheres devem cuidar das crianças, crianças para o governo, para o estado. Os homens devem combater e, se não combaterem, se não apoiarem a guerra, são traidores. E, nesta situação, a única forma de não sermos uma propriedade dele, é assumirmos a nossa parte da responsabilidade pelo que aconteceu no país. E eu acho que a minha responsabilidade pessoal é muito grande.”

Ekaterina Kotrikadze: “Cada hora que passávamos na Rússia tornava-se mais perigosa”

Apresentadora do canal de televisão Dozhd, na Letónia, Ekaterina Kotrikadze é considerada por Moscovo um “agente estrangeiro

Ekaterina Kotrikadze nasceu em Tbilisi, era a Geórgia ainda uma república socialista soviética. Aos 7 anos já tinha a certeza que queria ser jornalista; no mesmo ano, a Geórgia proclamava a independência da União Soviética. Aos 24, viu a Rússia invadir o seu país. “É preciso ver a guerra para perceber que acontece. É preciso passar por ela.” A guerra entre a Rússia e a Geórgia durou cinco dias mas, quinze anos depois, Ekaterina ainda está desiludida com a reação da comunidade internacional. “Eu sei o que estou a dizer. Ainda estou muito desiludida com o mundo.”

O avanço das tropas russas para a Ucrânia não surpreendeu a apresentadora do último canal de televisão independente russo, mas também não a preparou para o que aí vinha. “Foi muito difícil fazer as malas e tomar uma decisão uma hora depois de ter estado no ar. Às nove da noite estava em casa e de manhã estava sentada num avião. Não arrumámos nada. A estação de televisão foi deixada para trás. A única coisa com que nos podíamos preocupar era com as pessoas. Tivemos uma longa conversa com toda a equipa durante a noite, procurámos bilhetes para nós e para os nossos colegas enquanto discutíamos se era seguro ficar. E a maioria dos nossos colegas tinha a certeza, tanto quanto eu, que cada hora que passávamos na Rússia tornava-se cada vez mais perigosa para todos nós.”

A 2 de Março, Ekaterina Kotrikadze saiu da Rússia com os filhos e com o marido e editor-chefe da televisão Dozhd, Tikhon Dzyadko. Estiveram alguns meses na Geórgia para repensar o presente e o futuro. “Eu recebia centenas, milhares de mensagens dos espetadores a pedir algum tipo de emissão.” Acabaram por relançar o canal no Youtube, uma das poucas plataformas ainda permitidas na Rússia e, no verão, mudaram-se para Riga, onde voltaram à televisão por cabo depois da Letónia lhes conceder uma licença de emissão.

“O que eu consigo ver do meu lugar é que ele [Putin] ainda acha que tem uma hipótese de ganhar a guerra. Talvez ele até tenha a certeza que pode ganhar esta guerra. Ele está pronto para utilizar qualquer ferramenta que ele tenha, qualquer uma, incluindo armas nucleares táticas. Tenho a certeza de que ele pode fazer isso se ele vir a oportunidade e se achar que isso realmente pode mudar a situação. Ele está obcecado. Ele vai tentar ocupar Kiev. Isto é absolutamente inevitável. E ele só vai parar quando for parado. E isso é o melhor que podemos fazer. Tentar abrir os olhos daqueles que por engano achavam que isto era algo justificável.” 

Tikhon Dzyadko: “Milhões de pessoas na Rússia estão ansiosas por ter informação independente”

Editor-chefe da televisão Dozhd, na Letónia, Tikhon Dzyadko também está na lista russa dos “agentes estrangeiros”

Na família de Tikhon Dzyadko a tradição de oposição à repressão é longa. Os pais são ativistas pelos direitos humanos,  os avós maternos estiveram exilados na Sibéria, o bisavô materno foi executado durante o estalinismo. Os irmãos são jornalistas, como ele. Talvez por isso pareça tão calmo, sério e assertivo em tempos conturbados. No dia em que o visitamos na redação da televisão Dozhd, em Riga, na Letónia, Tikhon coordena uma emissão especial sobre a visita do presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, ao Parlamento Europeu.

Mas ser o editor-chefe do último canal de televisão independente da Rússia traz também outras responsabilidades. Jornalistas de todo o mundo querem entrevistá-lo, especialmente agora que faz um ano desde o início da guerra na Ucrânia. Tikhon parece ter tempo para tudo e para todos. Recebe uma equipa de um jornal finlandês, enquanto nos deixa à vontade para gravar os bastidores do canal que reconstruíram do zero fora da Rússia.

“É um processo longo, difícil e muito caro, mas percebemos que muitas pessoas na Rússia, milhões de pessoas, estão ansiosas por ter informação independente. Por isso temos de continuar a fazer o que fizemos nos últimos 12 anos”, diz Tikhon Dzyadko. Com apenas 5% da infraestrutura que tinham em Moscovo e ajuda de colegas na Letónia e noutros países europeus montaram uma nova redação, um novo estúdio e uma nova sala de controlo. “Como podem ver, o espaço é pequeno”, foi a primeira coisa que Tikhon disse ao receber-nos. 

A equipa com uma centena de pessoas está espalhada por vários países. Em dezembro, a Letónia suspendeu a licença de emissão por cabo por “possível apoio às forças armadas russas”. “Na Letónia há uma situação interna muito, muito difícil. 30% da população é russófona e isso é uma questão muito sensível para muitos políticos aqui. Eu acho que a televisão Dozhd tornou-se uma vítima desses problemas internos. E nós também cometemos alguns erros”, explica Tikhon sem se alongar.

Na altura, o órgão regulador da Letónia citou três supostas violações: não transmitir na língua local, uma das reportagens referir-se às forças armadas russas como “o nosso exército” e o canal mostrar um mapa onde a Crimeia aparece como parte da Rússia, o que lhes custou uma multa de 10 mil euros. A suspensão da licença foi lamentada por várias organizações, incluindo os Repórteres Sem Fronteiras.

No início deste ano, a Holanda emitiu uma licença de emissão que vai permitir ao canal Dozhd comunicar para os russos na Europa “e é por isso que a maioria da equipa está a mudar-se para lá, para Amesterdão. Ao mesmo tempo, estamos a recorrer da decisão do tribunal porque achamos que não foi correta, mas se compararmos este problema com tudo o que está a acontecer no mundo, não é nada. Estamos agradecidos ao governo da Letónia que nos ajudou a estabelecer-nos”.

Alesya Marokhovskaya: “Uma pergunta dolorosa para todos os jornalistas russos”

Alesya Marokhovskaya é jornalista de investigação no site iStories na República Checa

Alesya Marokhovskaya decidiu aos 21 anos que queria trabalhar com jornalismo de dados. Aos 25, juntou-se à equipa do site de investigação iStories ou Important Stories, onde é editora do departamento de investigação de dados. Aos 26 foi classificada como “agente estrangeiro”.

A guerra na Ucrânia mudou a sua vida por completo. A viver em Praga, na República Checa, tenta manter-se estável e segura. “Neste momento, não consigo planear o meu futuro. Consigo, talvez, no máximo até um mês. Isto porque ninguém sabe o que se passa.”

“Neste momento acho que preciso de tempo para me sentir eu própria aqui, e não como uma estrangeira, talvez como uma pessoa que irá ficar a viver aqui. Mas não tenho planos neste momento e tenho muito medo de os fazer.”

Concentrar no trabalho ajuda, mesmo quando não tem a certeza se contribui para alguma mudança na Rússia. “É uma pergunta muito dolorosa para todos os jornalistas russos. Porque, quando um colega estrangeiro nos pergunta, «qual é o impacto do teu trabalho?», eu não sei. Eu só penso que temos o nosso público, que nos segue, lê os nossos artigos e vê os nossos vídeos. Isso é importante.”

Trabalham para tentar chamar a atenção de mais pessoas. Tudo o resto são contas que Alesya não se atreve a fazer. “Se eu tentar contabilizar as minhas vitórias, mudei isto, mudei aquilo, acho que vou falhar. Vou achar que não é suficiente.”

Alesya Marokhovskaya tem família na Rússia, e, apesar de temer pelo futuro deles, não tem dúvidas sobre o seu papel. “Não tenho a certeza de que eles não irão tocar na minha mãe, no meu irmão, não tenho certeza nenhuma. Tenho muito, muito medo, mas o que é que eu posso fazer? É a escolha da minha família ficar na Rússia e eles sabem tudo o que se passa. A minha escolha é ser quem eu sou.”

Irina Dolinina: “Escrevíamos porque não podíamos não fazê-lo”

Irina Dolinina também é jornalista de investigação no site iStories na República Checa

Durante anos, Irina Dolinina questionou-se sobre se o seu trabalho de investigação estaria a fazer alguma diferença. "Escrevíamos porque não podíamos não fazê-lo. E se nos calássemos seria pior. Mas não fazíamos diferença nenhuma e a sociedade não queria saber dessas investigações. Infelizmente, não estávamos a tornar a Rússia melhor”.

Mas depois da guerra da Ucrânia e, sobretudo depois da mobilização parcial, mudou de opinião. “Pessoas que nunca leram estes meios de comunicação começaram a escrever-nos.” Utilizam sites em espelho, que copiam a aparência e o conteúdo do site original para um outro endereço e servidor de forma a ludibriar os bloqueios da Rússia. Também recorrem a VPNs, redes privadas virtuais que escondem a identificação e localização dos utilizadores. O seu uso entre os russos mais do que duplicou desde a invasão.

Pelos dados do YouTube e dos sites, os jornalistas conseguem perceber também um aumento de utilizadores em países como África do Sul ou Holanda, onde tradicionalmente não tinham muitos leitores. Os desafios de trabalhar no exílio são muitos… desde as redações improvisadas até à sobrevivência financeira, os meios de comunicação reinventam-se para continuar a informar o público na Rússia. Muitos deles começaram a produzir também conteúdos em inglês, uma forma de chegar a novos públicos e a novos financiamentos.

Roman Anin: “O meu avô passou 15 anos preso num Gulag”

Roman Anin também consta da lista russa de “agentes estrangeiros”. É editor-chefe no site iStories na República Checa

Quinze anos de investigações no Novaya Gazeta, que incluíram os Panama Papers e os Pandora Papers. Um processo criminal, um burnout, uma bolsa de estudos nos Estados Unidos e a conclusão de que não havia um meio de comunicação ideal na Rússia. Assim nasceu o iStories, ou Important Stories, há três anos, pelas mãos de Roman Anin.

Roman juntou jovens jornalistas. No início, faziam investigações para serem publicados em meios de comunicação como o Novaya Gazeta ou o Meduza, “mas as nossas histórias tornaram-se cada vez mais populares e começámos a ver-nos como um meio de comunicação. Por outro lado, percebemos que algumas das nossas histórias eram tão perigosas para os nossos parceiros que eles, na verdade, não queriam publicá-las. Começámos a publicá-las nós próprios”.

Foram um dos primeiros meios de comunicação russos a ser considerado “organização indesejável”. O editor-chefe arrisca seis anos de prisão, os jornalistas quatro. Os leitores também não escapam. “Qualquer leitor que partilhe uma história nossa pode ser multado e depois condenado a quatro anos de prisão”. Por isso, diz, há um aumento de leitores, mas não de partilha de conteúdos. “É uma espécie de batalha: quando as autoridades tentam tornar o nosso trabalho impossível, nós tentamos ser criativos e alcançar mais pessoas. Neste momento, diria que é muito difícil dizer quem está a ganhar.”

Desde os primeiros dias do iStories, o foco da equipa é conquistar leitores nas cidades pequenas e regiões remotas da Rússia. Roman chama-lhes “as pessoas que estão no deserto da informação, que não têm acesso a meios de comunicação independentes”. Por isso, fazem investigações a nível local. “Quando olhamos para as estatísticas vemos que apenas 15% do nosso público vem de Moscovo e São Petersburgo, enquanto 85% vem das outras regiões”. 

A família de Roman vem da Ucrânia, “foi distribuída para a Moldávia e depois mudaram-se para a Rússia”. Uma história comum na União Soviética, explica. Talvez por isso não sinta de forma tão pessoal o facto de a Rússia o considerar um criminoso ou, talvez, a resistência lhe esteja no sangue. “O meu avô passou 15 anos preso num Gulag durante os tempos de Estaline. Foi preso quando tinha 17 anos apenas por recusar-se a assinar um documento falso contra o chefe da fábrica onde trabalhava. Admiro-o porque acho que aos 17 anos eu não conseguiria fazê-lo.”

Yuriy Bershidsky: “O que posso fazer sozinho?”

Jornalista no jornal online The Insider, Yuriy Bershidsky vive agora na Letónia

Aos 60 anos, Yuriy Bershidsky aproveitou o passaporte letão que tinha por parte da avó e mudou-se para Riga. Passa os dias mergulhado na propaganda russa para desconstruí-la em artigos que publica no jornal online The Insider. “[A propaganda] é, curiosamente, bastante eficaz. Na maior parte dos casos é muito fácil refutar as mentiras, mas refutamos com argumentos lógicos. E eles não apelam à lógica. Eles, de facto, levam as pessoas à esfera emocional”. 

A idade confere-lhe um outro olhar sobre a história; um olhar de quem viveu a juventude na União Soviética e a idade adulta no caos que se seguiu. “Não sou tão otimista ao ponto de pensar que a Rússia se tornará rapidamente parte do mundo civilizado. Isso é improvável. Foi o mesmo momento histórico em que parecia que estávamos perto disso. A União Soviética entrou em colapso, pessoas com slogans liberais chegaram ao poder, eram amigos do Ocidente… Não durou muito. Esses funcionários do passado soviético apenas se cansaram de usar essas máscaras e começaram a discutir com o Ocidente novamente”. 

Apesar da visão pessimista - partilhada por todos os jornalistas com quem falamos - Yuriy continua o seu trabalho. “Nos anos 60 ou mesmo no final dos anos 50, havia um maravilhoso teatro estudantil em Moscovo, na Universidade Estatal de Moscovo. Numa apresentação eles tinham uma cena maravilhosa. Um ator entra num palco vazio, olha em volta e levanta as mãos. «O que posso fazer sozinho?». Aparece um segundo ator, também olha em volta e repete, «O que posso fazer sozinho?». Vem o terceiro, o quarto… Todos com a mesma frase. E, no final, o palco está cheio de atores que entoam em uníssono «O que posso fazer sozinho?». Aqui não há nada que eu possa fazer, mas é importante manter a chama”.

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