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Um Fundo de (Não) Garantia Salarial

Um dos meus desejos para o ano de 2022? A mudança de posição do Fundo de Garantia Salarial quanto ao (não) pagamento de indemnizações por resolução com justa causa.

São vários e preocupantes os casos de trabalhadores que, após terem resolvido o contrato de trabalho com justa causa por falta de pagamento das suas retribuições, conseguem receber, em situações de insolvência ou de plano especial de recuperação, o pagamento da respetiva indemnização do Fundo de Garantia Salarial (FGS). Este organismo entende que este direito legal dos trabalhadores só se coloca mediante a existência de uma sentença específica.

O problema existe! E afeta vários trabalhadores, tantos deles já vergastados com o não recebimento dos seus salários há vários meses, em situações de franca indigência. Os números demonstram-no. Urge, portanto, uma mudança de paradigma na atuação do Fundo de Garantia Salarial.

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Um trabalhador pode resolver o seu contrato de trabalho com invocação de justa causa, tendo direito a indemnização, se houver falta culposa do pagamento pontual da sua retribuição, considerando a nossa lei como tal o não pagamento que se prolongue por um período de 60 dias. A indemnização pode variar entre 15 a 45 dias de retribuição-base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, sendo proporcional em caso de fração de ano. Contudo, a lei estabelece um valor mínimo de indemnização: 3 meses de retribuição-base e diuturnidades, se o contrato de trabalho for por tempo indeterminado e todas as retribuições que se venceriam até ao final do contrato, sendo o contrato de trabalho a termo.

Ora, em caso de insolvência do empregador, ou de processo especial de revitalização, ou ainda de processo extrajudicial de recuperação de empresas, os trabalhadores poderão recorrer ao FGS, para tentarem ver pagos (nem que seja em parte) os seus créditos laborais. Nesses casos, o FGS adianta aos trabalhadores o pagamento dos créditos laborais que se encontram em dívida, sendo, atrevo-me a generalizar, na maioria dos casos, a única hipótese que têm de receber o que quer que seja. O FGS é, por isso, considerado como um mecanismo de proteção dos créditos laborais, é essa a sua génese e razão de ser, bem mais efetivo do que a atribuição ao trabalhador de preferência no pagamento em caso de venda dos bens do empregador. E foi para garantir essa antecipação e efetividade de pagamento que o mesmo foi criado.

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O FGS não assegura, no entanto, a totalidade do pagamento dos créditos laborais, já que, por um lado, só são pagos os créditos vencidos nos 6 meses anteriores ao início dos processos que acima referi e, por outro, tem uma limitação quantitativa (limite máximo global equivalente a 6 meses de retribuição, com o limite máximo mensal correspondente ao triplo da retribuição mínima mensal garantida).

Para poder ser pago pelo FGS, o trabalhador tem de apresentar o requerimento em formulário próprio no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho (prazo que se suspende em determinados casos), devendo juntar, consoante os casos, uma declaração do administrador de insolvência ou do administrador judicial provisório a comprovar os créditos que reclamou no processo.

Sucede que não resulta da lei a exigência de uma sentença a reconhecer os seus créditos laborais, no caso, a indemnização por resolução com justa causa, seja a sentença de reconhecimento ou graduação de créditos no processo de insolvência, seja a homologação do plano de revitalização, seja uma sentença do Tribunal do Trabalho (ainda mais, quando o valor da indemnização corresponde ao valor mínimo).

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Exige-se, unicamente, que os créditos tenham sido reclamados. Nada mais!

São vários os motivos que se podem apontar para esta opção expressa do nosso legislador e um deles foi apontado pelo próprio trabalhador no “Linha Aberta” – a sentença pode demorar muito tempo a ser proferida.

Com efeito, quando o FGS impõe ao trabalhador uma exigência que não tem fundamento legal, está, acima de tudo, a violar a lei e a negar-se a si próprio como mecanismo de proteção do trabalhador. E, com isso, está o FGS a prejudicar aqueles que deveria proteger e que dele carecem de proteção, impondo o recurso aos Tribunais, onerando estes e o trabalhador com o dispêndio injustificado de tempo e recursos.

No início de uma legislatura formulamos sempre votos para o novo ciclo que se avizinha, pelo que é um dos meus desejos a mudança de posição por parte do FGS quanto ao pagamento de indemnizações devidas na sequência da resolução pelo trabalhador do contrato de trabalho com invocação de justa causa. Espero, então, que seja este novo ciclo, também neste caso, um ciclo em que estes problemas se resolvam, bem e com a rapidez que a sua gravidade impõe! A bem da justiça, a bem de todos!

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