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As medidas elogiadas e as medidas "risíveis", "absurdas" e "desrespeitosas": as reações de professores e diretores ao plano do Governo para a falta de professores

Ministro da Educação, Fernando Alexandre, apresentou um conjunto de medidas para fazer face à falta de professores e acabar com alunos sem aulas por períodos longos. Professores, diretores e sindicatos aplaudem algumas das iniciativas do Governo e apresentam fortes reticências a outras

Há medidas que merecem aplausos, outras que são “risíveis” e outras em falta. É assim que professores, diretores e sindicatos reagem ao conjunto de medidas apresentado esta sexta-feira pelo ministro da Educação, Fernando Alexandre, para fazer face à falta de professores e acabar com alunos sem aulas por longos períodos de tempo.

“Destacamos algumas medidas positivas, mas verificamos a inexistência de outras que indicámos nos nossos comunicados e no nosso manifesto que seriam muito importantes. Entre elas, verdadeiras ajudas de custo, menor tributação aos incentivos monetários e valorização salarial”, começa por denotar o movimento cívico de professores Missão Escola Pública, em declarações escritas à CNN Portugal.

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“A maioria das medidas revela pouco conhecimento do terreno e da realidade que se vive nas escolas, como atesta a tentativa de recrutamento de professores aposentados pagando-lhes pelo menor índice remuneratório da carreira”, resume Cristina Mota, porta-voz do movimento.

O Governo quer recrutar 200 professores aposentados dos grupos de recrutamento deficitários, como Informática, Português ou Matemática. Em troca, propõe o pagamento pelo índice 167. O movimento Missão Escola Pública dá “sinal vermelho” a esta medida que classifica de “risível”: “tentar atrair professores desgastados, desvalorizados, desmotivados, que nem o tempo de serviço viram recuperado e quer pagar-lhes um salário de professor contratado é tão absurdo quanto desrespeitoso”.

Medidas com “sinal verde”

Há medidas que o Missão Escola Pública identifica como positivas, como a contratação de 140 técnicos superiores para apoio administrativo aos diretores de turma ou o alargamento dos três meses para um ano do “período da substituição dos docentes cuja junta médica indica incapacidade para exercício de funções todo o ano letivo”.

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Outras das medidas que merecem o elogio do movimento são o recrutamento de bolseiros de doutoramento ou o acesso à profissão a docentes e investigadores doutorados, embora duvidem “que haja interessados”.

Manuel Pereira, presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE) também considera haver medidas positivas, embora “careçam de regulação”. Uma dessas medidas é o recrutamento diário de docentes, quando até aqui era feito semanalmente. “Acreditamos que essa aceleração limita os problemas na demora das substituições e, a par com a atração dos novos licenciados, será uma das soluções a implementar”, defende Manuel Pereira, que regista também “a forma frontal e responsável como o problema da falta de professores e do número de alunos sem professores, foi apresentado. Sem subterfúgios e sem desculpas”.

“As medidas identificadas são ambiciosas e inovadoras, mesmo que algumas mereçam esclarecimentos adicionais. O plano é pragmático e parte do princípio de que, de imediato, algumas soluções só são possíveis com os recursos existentes. É o caso do incentivo ao prolongamento da atividade letiva para além da possibilidade de aposentação, com estímulo pecuniário”, acrescenta ainda o dirigente escolar.

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Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP) considera que “o sucesso das medidas preconizadas terá a ver diretamente com o grau de adesão a quem se destinam: professores aposentados, de carreira, contratados, imigrantes e "aspirantes" à docência”. “A maioria das medidas serão colocadas em prática a curto prazo, existindo uma que terá reflexos a médio e longo prazo: a atribuição de bolsas a alunos que ingressem na licenciatura e mestrado em Ciências da Educação/Ensino”, analisa.

Filinto Lima considera ainda que “a meta apontada é muito ambiciosa (redução em pelo menos 90% do número de alunos sem aulas desde o início do ano letivo em relação a 2023/2024), mas exequível com o esforço de todos”.

“Faltam ali uns +”

O secretário-geral da Federação Nacional de Educação (FNE) frisa que há medidas “positivas” e outras que o “preocupam”. Aludindo ao nome do programa [Plano + Aulas, + Sucesso], Pedro Barreiros diz que “temos ali + aulas e + sucesso, mas faltam ali uns +: mais condições, mais juventude e mais valorização”.

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Pedro Barreiros esperava mais do plano do Governo. “Quando o ministro nos disse que quer fazer uma revisão da carreira e dos índices remuneratórios, pensei que essas medidas já fizessem parte deste plano”, sublinha.

O dirigente sindical diz que as medidas apresentadas esta sexta-feira “deviam ser acompanhadas de medidas de médio e longo prazo”. “É verdade que há uma urgência nacional de resolver este problema de falta de professores. E isto é para resolver no próximo ano letivo. Era importante que apresentasse medidas de médio e longo prazo para daqui a cinco, seis ou sete anos não estejamos a sobreviver à custa de medidas de emergência”, reforça.

“Há jovens que até gostariam de ser professores, mas quando olham para a carreira dizem ‘eu para ali não vou’, muitas vezes até são os pais e os professores a dizerem ‘livra-te!’”, acrescenta, considerando que as duas mil bolsas anuais para estudantes que ingressem em licenciaturas e mestrados de Ciências da Educação ou Ensino não resolvem os problemas no futuro: “É preciso mais investimento na formação de professores e que o Governo faça desde já algo para garantir que, em vez dos 1200 professores, daqui a cinco anos estejamos a formar 3 mil ou 4 mil. Porque este ano vão para a reforma 5 mil docentes”.

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Medidas como o recrutamento de professores aposentados podem ter um efeito pernicioso e contribua para o envelhecimento da profissão docente. “Já existem 343 professores com mais de 70 anos a dar aulas. E nós não queremos isso. Tem de se investir é num convívio intergeracional para os mais novos aprenderem com os mais velhos e rejuvenescer o corpo docente. Não queremos os nossos alunos só com avós. Também queremos os nossos alunos com professores de uma geração mais próxima da deles, até para a motivação dos alunos”, destaca.

Fenprof critica falta de ambição

A Federação Nacional dos Professores (Fenprof) classificou como “pouco ambicioso” o programa apresentado pelo Governo, alegando que a meta de reter e atrair 3.400 docentes para as escolas representa apenas 10% das necessidades.

“Como indicam estudos realizados, até final da década serão necessários mais 34.000 docentes no sistema. O programa que o Governo apresenta não vai além de 10% daquela necessidade”, alertou a federação num comunicado em que faz uma “primeira apreciação” às medidas aprovadas em Conselho de Ministros.

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Na reação, a Fenprof considera que se trata de um programa “pouco ambicioso” para dar resposta a um problema “que se tem vindo a agravar e que, no futuro próximo, se tornará ainda mais preocupante”.

Em comunicado, a estrutura sindical assinalou o “reconhecimento pelo Governo” que, em setembro de 2023, mais de 320 mil alunos não tinham os professores todos e que, em 31 de maio, eram mais de 20 mil os alunos que estavam nessa situação.

Em relação às medidas previstas para 2024 e 2025, a Fenprof alegou que algumas colidem com o Estatuto da Carreira Docente, alertando que a sua aprovação está sujeita à negociação coletiva, como as previstas para as horas extraordinárias, cuja aceitação “terá de ser voluntária”.

A federação adiantou ainda que concorda com outras medidas, caso da contratação de técnicos superiores para apoio administrativo às direções de turma, a possibilidade de contratação diária, a partir da Reserva de Recrutamento, e a substituição por um ano de docentes com incapacidade por esse período, devidamente atestada por junta médica.

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No que respeita a medidas com impacto quantificado, a Fenprof considerou que não será atraindo aposentados para as escolas que se “dará o inadiável rejuvenescimento da profissão docente, indispensável para assegurar o futuro”.

“É pouco crível que se retenham mil docentes que estão para se aposentar, pagando até 750 euros, quando, depois de se aposentarem, poderão receber até 1.604,90 euros”, adiantou ainda a Fenprof, que salientou também ser “destituído de qualquer laivo de ambição prever recuperar 500 docentes quando abandonaram o sistema, na última década e meia, cerca de 20 mil”.

“O problema da falta de professores só se resolve quando, de uma vez por todas, o Governo decidir tomar medidas de valorização da profissão docente, tornando-a atrativa”, reiterou a Fenprof.

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