Cerca de duzentos agentes da Polícia de Segurança Nacional de Hong Kong estiveram envolvidos numa aparatosa operação policial contra um dos últimos órgãos de comunicação social independentes daquele território, o site de informação Stand News. Trata-se do mais impactante golpe na imprensa livre de Hong Kong desde o encerramento forçado do jornal pró-democracia Apple Daily, em junho.
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O enorme aparato policial da operação, na manhã desta quarta-feira (hora de Hong Kong; madrugada em Portugal), fez lembrar o método seguido no encerramento do Apple Daily - duzentos polícias, fardados e à paisana, em incursão pela redação do jornal online, apreendendo material protegido pelo sigilo profissional e pela liberdade de imprensa, e, em simultâneo, a entrar nas casas de sete pessoas com ligação ao Stand News, incluindo editores e atuais e antigos membros do board do jornal. Seis estão em prisão preventiva, e o sétimo foi questionado mas não detido (por enquanto).
Todos são acusados de “conspiração para fazer publicações sediciosas” - crime que voltou com a nova lei de segurança nacional (LSN), em vigor desde o verão de 2020 e que praticamente acabou com a imprensa livre no território.
Hong Kong orgulhava-se de um diversificado e muito competitivo panorama mediático, essencialmente privado, onde conviviam meios de comunicação social pró-democracia e órgãos alinhados com o governo do território e com o governo central de Pequim. Apenas os meios de comunicação alinhados com o Partido Comunista Chinês (PCC) têm escapado ao assédio policial e judicial desde que entrou em vigor a lei de segurança nacional - pela qual qualquer crítica ao governo, ou ao PCC, ou qualquer tipo de defesa da democracia, pode levar a acusações tão graves como sedição, conspiração ou traição. Mesmo quando a LSN não prevê um crime, os tribunais têm interpretado a lei de forma bastante abrangente, indo ao ponto de reabilitar leis coloniais para ampliar as possibilidades de acusação. Foi assim que o crime de sedição voltou à ordem do dia.
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Imagens do raide policial à redação do Stand News, partilhadas nas redes sociais pela associação de Imprensa Livre de Hong Kong, mostram os agentes a levar caixas de material jornalístico apreendido. As autoridades confirmam que tinham mandato para “busca e apreensão de material jornalístico relevante”.
Em junho, depois do encerramento do Apple Daily, o Stand News tomou medidas para evitar eventuais perseguições judiciais, como desativar os comentários, apagar algum do material que estava online e deixar de receber contribuições financeiras (para não poder ser acusado de financiamento ilegal ou de conspiração com financiadores locais ou estrangeiros). Mas nada disso evitou o raide desta quarta-feira.
Entre os detidos estão o atual e o anterior diretor do jornal, que se demitiu no mês passado. Três antigos membros do conselho editorial do jornal (incluindo uma conhecida cantora e ativista, e uma advogada que foi deputada no parlamento de Hong Kong em representação de um partido pró-democracia) foram igualmente presos.
Ronson Chan Ron-sing, editor-adjunto do Stand News e presidente da Associação de Jornalistas de Hong Kong (HKJA), também foi levado de casa para interrogatório, mas não ficou preso. Num comunicado, a associação mostrou a sua preocupação com os muitos jornalistas presos no território no último ano e meio, e exortou as autoridades de Hong Kong a respeitar e proteger a liberdade de imprensa, “de acordo com a Lei Básica”, espécie de constituição do território, negociada entre o Reino Unido e a China em 1997, quando os chineses retomaram a soberania sobre a cidade.
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