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Ucranianos cantam o seu hino e emocionam-se com o discurso de Zelensky no Parlamento: "Com esta sessão, parece que ficámos mais perto da Ucrânia"

Presidente ucraniano falou durante 15 minutos por videoconferência aos portugueses mas também aos muitos ucranianos que moram em Portugal. Nas galerias da Assembleia da República, cantou-se o hino ucraniano pela primeira vez

Quando termina o discurso de Augusto Santos Silva, as portas da sala abrem-se e começa a ouvir-se o hino da Ucrânia, tocado pela Banda Sinfónica da GNR. Todos os que estão na Assembleia da República se levantam. E das galerias ouvem-se as vozes, poucas mas fortes, dos ucranianos, de mão ao peito, a cantar o seu hino. Podemos não perceber o que dizem mas percebemos a sua emoção. No final, Valentyna limpa as lágrimas. Não terá sido a única.

Valentyna Tymchuk chegou às galerias da sala do plenário uns 20 minutos antes das 17:00, a hora marcada para a intervenção, por videoconferência, do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. Tem a bandeira do seu país gravada na máscara de pano, uma blusa branca com os bordados típicos da Ucrânia e um saco cheio de laços azuis e amarelos que vende a um euro para conseguir dinheiro para a associação que dirige, chamada Coração Bondoso.

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A associação foi fundada em 2014, após o início da guerra no Donbass: "Estamos em Portugal e muitos de nós já temos cidadania portuguesa mas lembramo-nos muito da nossa terra, falamos ucraniano e queríamos ajudar, de alguma maneira", conta Valentyna, que tem 57 anos e está em Portugal desde outubro de 2000, ou seja, há quase 22 anos. Nestes últimos oito anos, a guerra esteve sempre presente em todas as conversas e em todos os encontros dos ucranianos em Portugal, mas no final de fevereiro a situação ganhou uma nova dimensão: "Nos primeiros dias só chorava, chorava. Depois veio uma raiva enorme", conta Valentyna. "E depois começámos logo a trabalhar para ajudar." Valentyna agradece às suas patroas, que a libertaram das limpezas dias e dias seguidos para que se dedicasse a recolher bens para mandar para a Ucrânia, sempre em contacto com os familiares e com os amigos, sempre com o coração nas mãos. "A minha mãe tem 78 anos e não quis sair do país. Mas está bem, mora muito perto da Polónia", conta. "Ainda não acabou, ainda há muita coisa má a acontecer." E conclui: "Slava Ukraini".

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Microfones, cães-polícia e a banda da GNR: tudo a postos para Zelensky

Valentyna nunca tinha estado no parlamento português. Olha em volta, curiosa, enquanto os deputados vão ocupando os seus lugares. "Avisaram-me que na televisão parece maior do que é, e é verdade", conclui, rindo-se. A seu lado sentam-se outros representantes de associações de ucranianos em Portugal. Muitos deles com as blusas bordadas, parecidas à de Valentyna. "Nunca imaginámos que viríamos aqui ouvir o nosso presidente", diz Nicolau Yareme, da Igreja Greco-católica ucraniana de Lisboa, olhando em volta. Os dois ecrãs-gigantes ainda estão a mostrar imagens dos parlamento. 

Na Assembleia, desde o início da tarde, sentia-se que havia algo importante para acontecer. Há ecrãs espalhados por todo o lado e um microfone foi colocado no meio da passadeira vermelha, para preparar os discursos após a cerimónia. Continuavam a fazer-se testes aos microfones e ainda havia cabos a serem arrastados de um lado para o outro. Às 15:20, a sala do plenário teve de ser esvaziada. Apenas lá ficaram os elementos da GNR e os seus cães, que durante cerca de 40 minutos inspecionaram todos os recantos - medidas de segurança extraordinárias devido à presença da embaixadora da Ucrânia e ao simbolismo da cerimónia.

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Antes das 16:00 chegaram os 25 elementos da Banda Sinfónica da GNR, com os seus instrumentos. O sargento-chefe Vilela, que habitualmente toca clarinete mas que hoje foi nomeado como maestro, explica que ali não está a banda toda, "apenas um grupo reduzido que é escolhido para serviços marciais como este". Estão ali para tocar os hinos da Ucrânia e de Portugal no final da sessão. "Estivemos hoje a ensaiar o hino da Ucrânia. Já o tocámos algumas vezes porque somos a banda do protocolo do Estado e tocamos sempre que há a apresentação de um embaixador ou a visita de um chefe de Estado, por exemplo. Já não o tocávamos há muito tempo mas somos profissionais e rapidamente ficou pronto." Pelo sim, pelo não, os músicos trazem a pauta do hino da Ucrânia. Já do de Portugal não precisam, "todos o sabem de cor".

A banda ficou lá fora. Entretanto, cá dentro, começam a chegar os deputados e os convidados. Muitos dos deputados trazem ao peito um símbolo da Ucrânia - seja a bandeira ou um laço amarelo e azul. A sala vai ficando composta. Às 16:57 o burburinho dá lugar ao silêncio com a entrada do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, do presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, e do primeiro-ministro, António Costa. Está tudo a postos... exceto os deputados do Chega, que entram todos juntos poucos depois. São poucas as cadeiras vazias e, de entre elas, destacam-se os seis lugares deixados vagos pelos deputados do PCP, que optaram por não participar na cerimónia.

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"Estamos com ele, estamos com cada ucraniano que ele representa"

17:01 e a imagem do presidente ucraniano aparece em duplicado, dos dois lado da estátua da República. Infelizmente na sala não ouvimos a sua voz, apenas a voz da tradutora que vai traduzindo para português o que Zelensky tem para dizer aos portugueses. Para ouvir Zelensky a falar em ucraniano é preciso colocar o auricular - é o que fazem muitos dos ucranianos presentes, porque preferem ouvir diretamente a mensagem do seu presidente, na sua língua. Depois do enorme aplauso de pé para Zelensky, que falou durante quase 15 minutos, segue-se o discurso de Santos Silva. E, finalmente, o emocionante momento em que se ouve o hino da Ucrânia e depois o de Portugal. Nos ecrãs, o presidente ucraniano também está de pé, em sentido, ouvindo os hinos. Até que a sua imagem desaparece. Termina a sessão.

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Os deputados deixam a sala enquanto nas galerias se trocam abraços. "Sentimos uma grande honra por nestas circunstâncias tão difíceis para nós todos, para a comunidade, para cada ucraniano, o nosso presidente ter falado hoje aqui, no mais alto lugar de representação de Portugal", diz no final à CNN Portugal Pavlo Sadokha, presidente da Associação de Ucranianos em Portugal. "Estamos com ele, estamos com cada ucraniano que ele representa."

Um grupo de deputados da Iniciativa Liberal e Inês Sousa Real, deputada do PAN, sobem até ao terceiro andar para cumprimentá-lo, a ele em nome de todos os ucranianos, deixando palavras de apoio. Pavlo Sadokha agradece. "Também queremos agradecer a Portugal porque logo nas primeiras horas da agressão os mais elevados representantes de Portugal condenaram a invasão da Rússia e deram logo apoio à Ucrânia. Sabemos que Portugal e os portugueses estão com a Ucrânia e agradecemos muito."

Sobre o discurso de Zelensky, o representante da comunidade ucraniana em Portugal admite que "foi muito trágico ouvir o testemunho de todos aqueles acontecimentos". "Muitas daquelas coisas nós vamos percebendo através dos nossos contactos diretos com familiares e amigos na Ucrânia", conta, garantindo: "Vamos reforçar os pedidos do nosso presidente, com o apoio da nossa comunidade, com as nossas ações, com as nossas manifestações, cartas e todo o trabalho que temos feito".

Pavlo Sadokha explica o enorme simbolismo de ouvir o seu hino na casa da democracia portuguesa: "Nestes últimos dois meses, o hino nacional da Ucrânia tornou-se o hino mundial de luta pela independência e pela soberania contra o totalitarismo".  E reforça o quanto o discurso de Zelensky foi importante: "Com esta sessão, parece que ficámos mais perto da nossa Ucrânia, parece que estamos diretamente com o nosso presidente e o nosso povo". 

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