Video killed the Tv star
Embora o título da música original se detivesse sobre o vídeo ter dado tiros de sniper na testa da rádio vaticinando-a ao seu falecimento imediato, sabemos hoje que a rádio continua a reinventar-se, com ótimas audiências e tendo-se estendido ao áudio na forma de podcasts, vídeo e comunidades alargadas ou de nicho em redes sociais.
PUB
Então porque é que a Tv também não morreu às mãos do vídeo digital?
Fácil desde logo percebendo-se que a Tv é vídeo. Mas na alusão de que o vídeo digital de formato curto mataria a Tv hoje os dados mostram que o cenário de substituição não aconteceu, antes de fragmentação e convivência. Ao vermos os dados de 2023 da MediaMétrie (empresa francesa dedicada à medição de audiências e estudos de mercadona Europa) recolhidos em 9 mercados europeus (sempre relevante nestas análises olhar para os mercados em estudo e comparar-nos com o comparável), dos 100% de vídeo vistos diariamente:
É ainda preciso esclarecer que nos 20% de VOD estão as plataformas de streaming como a Netflix mas também os BVOD dos canais de TV, como o TVI Player, OPTO ou RTP Play. E no vídeo social e vídeos curtos idem... as TVs aí publicam vídeos seus, a par de youtubers e instagramers e tiktokers, com vídeos nativos para social ou mesmo criados como ‘natives’ (a título de exemplo a TVI a par da série “Morangos com Açúcar” desenvolveu uma mini série de 14 episódios neste formato).
PUB
Se o vídeo não matou a rádio, também não parece que o tenha feito à TV...
O telemóvel matou a Tv
Inverosímil, no mínimo...
Olhando para os dados mais recentes da Rescue Time mantém-se o número de horas diário em 3h15 dedicadas ao smartphone. E nem todas dessas são para ver vídeos. Mas quando olhamos para o tempo a ver televisão vemos nos dados da GFK e da MediaMétrie que em Portugal a média ronda as 5h, França 3h26 e Alemanha 3h15. E se recorrermos ao estudo da Marktest em Portugal sobre a caracterização do uso e consumo de Tv em Portugal Continental vemos que a esmagadora maioria ainda vê Tv pelo televisor.
OK, mas e a tendência?
De novo voltando aos dados de 9 países da EU da MediaMétrie, 77% dos europeus prefere ver vídeo/Tv no grande ecrã do televisor, tendo mesmo este número aumentado 2 pp’s face a 2022, incluindo junto dos jovens abaixo dos 34 anos.
Então onde está a verdade?
Na complementaridade.
Analisando os dados vemos que 20% vê apenas vídeo no televisor e 15% apenas no smartphone. São 35% que se dedicam apenas a um ecrã. Mas quando vemos Televisor e Smartphone em conjunto o número de pessoas que encaixa neste perfil é de 51%. Ou dito de outra forma, para obter taxas de cobertura de uma campanha é essencial começar pelo ecrã da Tv.
PUB
Tudo é Streaming
Claro que passámos a facilitar e designar “streaming” na referência à Netflix ou Amazon Prime Video, etc., mas hoje a esmagadora entrega da TV é também já streaming, distribuída em 97% dos lares portugueses numa larga maioria por IP/ fibra e igualmente com boa parte desses lares dotados de set-top-boxs que convertem esse sinal digital de streaming Tv nos canais que vemos diariamente, no videoclube, na lista de gravações pessoais, nos “Restart” e até mesmo nos “links” que vemos no menu da box e que nos apontam para o momento do jogo do golo para não termos de andar à procura.
Por isso será necessário passarmos a designar a Tv dita tradicional também no streaming, porque a cada ano que passa e no somatório dos seus canais e das suas apps de VOD as capacidades de navegação, visionamento e publicidade são idênticas.
Então porque sobe o investimento nas BigTech?
Pela tecnologia. Ainda que não apenas, mas em muito boa parte pela tecnologia.
PUB
Se olharmos só para canais de TV há 9080 na Europa.
E plataformas de streaming? 2819! São em média 75 plataformas de streaming em cada país!
Imaginar que alguém que queira publicitar uma marca, produto ou serviço o faça em dezenas ou mesmo centenas de canais e plataformas é impensável. Daí que a tecnologia seja chave na captação de investimento publicitário.
Sem uma plataforma agregadora em jeito de one-stop-shop, onde a marca faça o seu planeamento, investimento, controlo do mesmo e análise dos resultados, fica difícil. E aí as promessas da Google e Meta ganham força, com plataformas de anúncios únicas que apontam a centenas de milhões de utilizadores espalhados pelo mundo, num inventário aparentemente a baixo preço. Mas sem controlo de qualidade do conteúdo. Sem garantia de associação de marca. Na maior parte do tempo com a atenção fraccionada em segundos num ecrã pequeno onde só queremos fazer “Saltar Anúncio”.
De novo, avaliem-se os eCPM’s e os eCPP’s (custos por mil impressões ou mil contactos) efetivos para as campanhas, a nível de eficácia da retenção da mensagem no curto, médio e longo prazo, e não apenas pelo número de videoplays ou impressões, e falemos de forma mais correta sobre o real ROI. Já para não falar nas falácias das promessas técnicas que quem trabalha na indústria bem conhece (aliás a este respeito sugiro a leitura do Estudo “5 Crimes da Hipertargetização”, da Microsoft/Linkedin).
PUB
É um facto que existir uma plataforma de publicidade onde a marca pode gerir num só local as suas campanhas em real-time e com forte capacidade de segmentação é um argumento de peso. E essa é ainda a forte ameaça para que a transferência dos euros e dólares hoje nas BigTech demore a regressar às Tv ou aos novos players de Streaming. Mas consigam estas soluções como o PLAYCE em Portugal ou na Europa a UTIQ ou a RTL AdAlliance igualar a proposta tecnológica e é inegável que neste mix TV’s vs Google vs Meta a distribuição do investimento irá reequilibrar-se.
O que vencerá?
O conteúdo, como sempre.
Num cenário a médio prazo em que as diferenças tecnológicas se irão esbater, conta onde estão as pessoas. E estas optarão por estar onde podem ver os melhores conteúdos. E aqueles que agreguem as pessoas, numa clara função social de sincronização onde aí a batalha pende para as TVs.
Pode haver fragmentação nas plataformas, onde eu vejo e onde tu vês, mas todos anos o resultado de audiências aponta na concentração de muitas pessoas em poucos programas, e são esses títulos que fazem a diferença, seja na TVI ou na Netflix. Há depois uma “long-tail” de outros programas a consumir, mas anualmente continuamos a ver nos dados que os títulos-chave da oferta são o chamariz que agregam boa parte das audiências (mesmo no streaming e nas redes sociais veja-se a “luta” por nomes exclusivos, desde Elon Musk na X a tentar Mr.Beast ou o Spotify com o acordo milionário com o polémico Joe Rogan).
Será nos grandes títulos e marcas de programas emblemáticos que a luta se decide, quer na captação da atenção e do cliente quer na captação da subscrição e do investimento publicitário. A long-tail da oferta das outras dezenas de conteúdos é o que garante a fidelização e o volume de consumo e investimento.
Falemos nos processos de tomada de decisão e lembremos conceitos como viés contextual, ou de como o cortéx pré-frontal e o cérebro límbico interagem, o papel do hipocampo (envolvido na memória) e do gânglio basal (associado a hábitos), para só dar uma pincelada... Pensar que o paradigma da web programática onde o conteúdo e o contexto são indiferentes e agnósticos, e que a mensagem publicitária só precisa perseguir o utilizador indiferente do seu contexto, é uma falácia e é um retrocesso no progresso científico que nos trouxe até onde estamos hoje, uma verdadeira afronta ao que sabemos como marketeers e gestores – tal não é, simplesmente, verdade.
PUB