Entre a indiferença e o protesto, a revolta e a impossibilidade: Qual o perfil de um abstencionista em Portugal?
Perfil

Entre a indiferença e o protesto, a revolta e a impossibilidade: Qual o perfil de um abstencionista em Portugal?

REPORTAGEM
Joana Moser

Há quem não vote por pura indiferença. Há quem acredite que o seu voto não fará a diferença. Mas há quem se abstenha com consciência e como forma de protesto. Será que existe um verdadeiro perfil de um abstencionista? Com alguns testemunhos e com a ajuda de especialistas, a CNN Portugal atreve-se a traçar um perfil

Patrícia é uma "revoltada por natureza". João é "contra o voto secreto". Mateus vive fora e diz que o sistema é “pouco prático”. Abel é simplesmente “contra o sistema”. Uns nasceram antes da democracia, outros nunca viveram sem ela, mas há uma coisa que os une: desde que podem votar optaram por nunca o fazer. 

E não foram os únicos. Nas últimas eleições legislativas, em 2022, a taxa de abstenção foi de 48,6%, considerando residentes em Portugal e no estrangeiro. Agora, a crise política obriga os portugueses a mais um ato eleitoral. Será que a taxa de abstenção vai aumentar ou reduzir?

“É arriscado fazer previsões porque há contraditórios”, afirma João Cancela, investigador do IPRI-NOVA. Por um lado diz que “quando as eleições são mais incertas e disputadas existe mais participação eleitoral". Por outro lado sublinha o efeito da saturação eleitoral. “Houve eleições há relativamente pouco tempo, há muitas pessoas que se desligam”, diz, defendendo que este fator pode levar com que a abstenção se mantenha ou suba. 

João Cancela, investigador na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, tem vindo a estudar o fenómeno da abstenção ao longo dos últimos anos. À CNN Portugal traçou o perfil de um abstencionista com base na idade, instrução, rendimentos e género. Contudo, diz que, por falta de dados fiáveis, é difícil confirmar se, de ano para ano, são sempre as mesmas pessoas que se abstêm de votar.

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"Revoltada por natureza"

Patrícia Silva

Patrícia Silva tem 53 anos e nunca votou. Assume-se como “revoltada por natureza” e diz que está indignada com as injustiças do país. É de Viseu e é cuidadora de um senhor de 92 anos. 

Para Patrícia não faz sentido votar, mas a mulher reconhece que as pessoas achem estranho. A principal razão para a abstenção de Patrícia é o descontentamento perante o estado do país. “Há velhotes a morrer abandonados, escolas sem aquecimento para as crianças, lares é o que se vê”, diz a abstencionista. Além disso, Patrícia sublinha que não confia nos políticos e nas pessoas que estão à frente do país. “Não vou perder tempo a ir votar em alguém que não vai mudar nada”. 

Apesar de se abster de votar, Patrícia permanece informada e ativa na discussão política. “Choca-me a quantidade de jovens que defende o Chega”, partilha, confessando que a única vez que sentiu vontade de votar foi para evitar a ascensão do partido. No entanto, a sua desconfiança nos políticos e a crença de que o voto não fará diferença mantém-na afastada das urnas.

“Sou daquelas pessoas que reclamam. Uma pessoa paga impostos para ter o mínimo”. Apesar de já ter ouvido muitas vezes que por não votar, não pode dar a sua opinião, Patrícia descredibiliza esse argumento e continua a expressar-se. “Tenho empatia pelas pessoas, partilho a minha opinião no meu dia-a-dia, no meu trabalho”, diz.

A cuidadora refere que só consideraria votar caso a abstenção não continuasse a subir e se “acreditasse piamente que algo mudasse". “Mas tinha de ser alguém que confiasse mesmo”, acrescenta.

Patrícia partilha da mesma opinião para as eleições autárquicas. É de Viseu e já foram várias as vezes que reclamou à Câmara Municipal, sobretudo na altura dos incêndios. “Atrás da minha casa há um terreno grande que até cobras tem. No verão chegam a atravessar a rua”, conta, explicando que todos os anos reclama com a GNR e ninguém limpa o terreno em causa. O problema é a política de cunhas existente em Portugal: “É sempre o mesmo problema, neste país temos de recorrer a cunhas”. Aliás, foi assim que resolveu o problema na sua rua. “Era preciso limpar a minha rua, ninguém o fez, até que pedi diretamente ao presidente da Câmara Municipal de Armamar, que é meu amigo de infância. 24 horas depois estava tratado. É triste ter de mendigar uma coisa destas ao presidente”. 

É com base na revolta, indignação e descredibilização do valor do voto, que Patrícia continua a tomar a decisão de nunca votar. “Não tenho vontade de ir votar, é só para os políticos encherem os bolsos. Saem de lá ricos e com processos em cima”, desabafa a mulher que, desde que o pode fazer, há 35 anos, não exerce o seu direito de voto. 

“O meu voto não faz a diferença, a minha abstenção não faz a diferença, nem envia nenhuma mensagem concreta”. Patrícia não acredita que a abstenção envie uma mensagem ao Governo, para ela é apenas uma demonstração da total descrença na política do país. Termina a conversa criticando o facto de aqueles que votam censurarem os abstencionistas, insistindo que a abstenção é também uma forma de protesto.

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"Sou contra o voto secreto e não encontrei um partido que defenda com convicção"

João (nome fictício) tem 23 anos e desde que pode votar que se abstém de o fazer. É de Lisboa e apesar de ter crescido numa família politicamente envolvida, escolheu não votar. “Nunca votei. Não tenho orgulho nisso, até tenho pena, mas há algumas coisas com as quais não concordo”, conta o jovem. 

A sua abstenção foca-se essencialmente em duas razões: é contra o voto secreto e não encontrou um partido que defenda na totalidade. “Sou contra o voto secreto”, afirma convictamente o jovem licenciado em Marketing. Para João deve-se defender aquilo em que se acredita “com unhas e dentes”. “Não devemos viver numa sociedade onde temos medo de dizer aquilo em que acreditamos”. A seu ver, o voto secreto mostra medo de defender convicções.

A solução de João seria as listas de votos serem públicas. “Qualquer cidadão poderia ter acesso ao voto de qualquer pessoa”, explica o jovem, considerando que a sua solução traria uma maior sensação de responsabilidade ao ato eleitoral. “Existe uma grande diferença em mostrar o voto ou estar disponível para consulta para um público em geral”, acrescenta. 

João acredita que o voto deve ser dado com orgulho, sem medo de revelar as escolhas políticas que se defende. “No dia em que votar, fá-lo-ei com orgulho e sem medo de dizer em quem votei, seja uma pessoa ou um partido”, diz o jovem. “Temos de dar a cara por aquilo que votamos”, acrescenta. Assim, João defende que se deveria repensar no método de voto para atrair certos membros do grupo dos abstencionistas. 

Outra razão pela qual decide não votar é o facto de não ter encontrado nenhum outro partido que pudesse “defender com unhas e dentes”. E é por isso que opta por se abster. Diz que desde 2018 (ano em que começou a poder votar) não houve nenhum partido que representasse totalmente as suas visões. 

Mas João mostra alguma preocupação: tem receio de cair no desinteresse por continuar sem encontrar um partido com o qual se identifica a 100%. “Há cinco anos que tento encontrar alguém em quem votar e ainda não consegui encontrar”. O jovem reconhece-se como dentro do grupo dos abstencionistas quem nem sequer procura, mas reforça que nem todos são assim. 

É que nem todos são indiferentes: alguns, como ele, optam conscientemente por se abster. João insere-se no grupo dos abstencionistas que em 2022 chegou aos 48,6% da população. Um grupo malvisto, diz: “A abstenção devia ter mais respeito e voz na nossa sociedade”, frisa, explicando que além das pessoas que estão fartas e não votam porque não se importam, há quem conscientemente opte por se abster.

O jovem conta que compreende quem diga que se deve votar no partido que mais se aproxima à sua visão, mas também entende que a política de hoje em dia devia retratar e abordar mais as pessoas. “Na prática a política atual acaba por se focar em joguinhos com muita teoria e pouca prática”, diz João, lembrando a frase popular: “Prometem, prometem, mas não fazem nada”. Diz ainda que acredita que até o façam, “fazem é pouco”. “Não se importam com as pessoas. A política é um jogo de egos”, acrescenta. 

João nunca participou numa eleição, nem em eleições autárquicas, apesar de considerar a governação local melhor do que a legislativa. “Quanto mais pequena for a localidade, menos pessoas precisam de representação, é uma governação mais direta”, diz, admitindo a possibilidade de votar numa localidade mais pequena. “Se vivesse nesse contexto, a minha perspetiva seria diferente, se calhar até votava. Acabo por ser afetado por viver na capital do nosso país”, destaca.

“Seja que governo for, ao ter uma abstenção tão grande, tem de perceber que algo não está correto”, diz João, considerando que a sua abstenção transmite uma mensagem ao Governo. Contudo, diz que o próprio executivo escolhe difundir a mensagem da grande abstenção de Portugal da forma que mais lhe convém. “É uma falha do Governo que deveria trabalhar melhor para estimular as pessoas”. Defende ainda que as escolas deviam ter uma disciplina que ensinasse sobre política e que explicasse porque se vota. “Não percebo como é que nas escolas não existe uma disciplina sobre aquilo que nos vai influenciar na nossa vida toda”.

No que toca ao voto útil, João acha que é um “ato de cobardia”. A seu ver não tem nada que ver com inteligência. “O voto não deve ser uma tomada de posição conformista”, sublinha, lembrando o quanto se lutou para que se pudesse votar. “Essa oportunidade não deve ser desperdiçada com um voto útil”, refere

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"Resido fora do país, o processo é confuso e pouco prático"

Mateus (nome fictício) fez a licenciatura em Espanha e foi trabalhar para os EUA. Tem 23 anos e nunca exerceu o seu direito de voto pela impraticabilidade que é votar enquanto se reside fora de Portugal.

“Nas primeiras eleições em que pude legalmente votar estava a estudar em Marbella, mas a minha residência oficial era em Lisboa”, explica o jovem, que se viu impossibilitado de votar nas eleições legislativas de 2019. Mais tarde, Mateus conta que percebeu que os emigrantes têm direito a votar antecipadamente através dos Consulados. No entanto, o Consulado mais próximo era em Sevilha, a três horas de distância. 

“Se houvesse outra forma mais acessível teria votado”, conta, apelando à criação de um sistema de voto online. “Todos os sítios em que vivi eram mais remotos e longe dos Consulados”, explica, dizendo que as longas deslocações afastam muitos emigrantes das urnas. “Acabei por me abster mais pela dificuldade de voto, do que pela indiferença”. 

O jovem reconhece que por residir fora do país vive as eleições com uma intensidade diferente. “Vivendo num ‘setting’ internacional acabas por te distrair um bocado”, confessa. “Mas as notícias mais importantes chegam depressa”, conta Mateus, lembrando que a demissão de António Costa foi capa do NY Times (Mateus trabalhou nos EUA dois anos, antes de recentemente voltar a Portugal). 

Mateus confessa que não é politicamente ativo, mas que continua a ter a sua interpretação da gestão política em Portugal. Em conversas informais, por vezes contém-se e não partilha a sua opinião. “Não voto e acompanho pouco, por isso evito entrar em grandes conversas políticas”. 

Agora regressado a Portugal, por estar numa fase de transição de trabalho, ou seja, continua a ter residência no estrangeiro, vê-se impossibilitado de votar nestas eleições. “Teria de voar de propósito aos EUA para votar no Consulado local”. Mateus frisa que a possibilidade de votar online ou de se apresentar no país de origem não deve ser negada a ninguém. “Neste momento estou cá, devia ter a possibilidade de votar”. 

Questionado sobre se conhece o processo de voto por via postal, Mateus responde com sinceridade: “Não”. Para votar por via postal, Mateus teria de fazer essa opção junto da respetiva comissão recenseadora no estrangeiro, até à data da marcação da eleição. Depois receberia o boletim de voto para a morada indicada no caderno de recenseamento, assinalava com uma cruz a sua opção de voto, dobrava o boletim em quatro, colocava-o no envelope verde e fechava-o. De seguida, teria de colocar esse envelope verde dentro de um outro envelope branco, juntamente com uma cópia do seu cartão de cidadão. Por fim, enviaria o envelope para o Ministério da Administração Interna antes do dia da eleição

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“Sou contra o sistema”

Abel Ribeiro Chaves (FOTO: Bazaar do Vídeo)

Nas primeiras eleições totalmente livres em Portugal, Abel Ribeiro Chaves foi um dos eleitores que decidiu não votar – fez parte da taxa de abstenção de 16%, a mais baixa da história da Terceira República. Não o fez em 1976, finalizado o período da Revolução de Abril, nem o fez nunca ao longo dos quase 50 anos de democracia.

“Nunca votei. Sempre achei que o sistema estava mal pensado, a começar pela seleção das pessoas”, explica Abel, dizendo que não lhe faz sentido que os eleitores sejam chamados a votar em listas que são previamente escolhidas por outros. “Vota-se num partido que tem uma lista de pessoas que alguém julgou ser capazes de representar uma fatia da população. Não estou de acordo”, afirma.

Outra razão para Abel se abster é o facto de considerar que o sistema está feito de maneira a que haja um menor número de pessoas a votar. “O dia das eleições calha sempre a um domingo e muitas vezes calhou em vésperas de feriado”, relembra. Para o empresário, se o sistema quisesse realmente que as pessoas votassem teria certos cuidados: “demonstraria maturidade, sobretudo para que as pessoas acreditassem no que os políticos dizem, e alargaria o prazo de voto". 

“O prazo e horário que o sistema permite é muito limitado”, defende Ribeiro Chaves, frisando que as pessoas têm cada vez horários mais complicados. “Há países na Europa que permitem que a pessoa vote durante um período maior”. Abel apoia a tese de que o aumento do período de eleição diminuiria a taxa de abstenção. 

“Somos sempre governados pela minoria”, afirma convicto o abstencionista, defendendo que o partido que ganha as eleições com maioria, na verdade ganha com minoria se se contar com a abstenção. 

Abel Ribeiro Chaves diz que se mantém atento e informado sobre a política do país, mas não se considera no direito de partilhar a sua opinião publicamente. Por outro lado, diz que dentro do seu ciclo fechado partilha a opinião sobre o estado do país. “Não estou de acordo com a forma que o sistema está instituído e organizado, parece-me muito pouco claro”.

O empresário descreve a situação atual do país como “estranha” e teme que Portugal corra o risco de vir a ter novas eleições em outubro. “A decisão de convocar eleições e destituir o Governo foi uma decisão fora do tempo, corremos o risco de não se chegar a acordo e não se encontrar um Governo com apoio parlamentar”, defende. “É um ciclo que custa ao país, não só dinheiro, mas também a própria economia, que é o que mais me preocupa”, acrescenta. 

Ribeiro Chaves diz que nunca ponderou se a sua abstenção envia algum tipo de mensagem ao Governo, mas acredita que mostra um desinteresse absoluto no sistema e na estratégia instituída para que as pessoas votem.

Para além do aumento do período de voto, o empresário sublinha que deveria haver uma melhoria na atitude política. “A atitude da classe política, que está gasta, é sempre a mesma. Toda a gente promete e diz que faz, mas não passam de promessas vazias. Não há consistências, as figuras políticas não denotam competência de maneira nenhuma”. 

Tal como Patrícia Silva, Abel Ribeiro Chaves demonstra revolta perante o sistema. “Hoje em dia tudo é obscuro, vêm-se a descobrir casos de interesses, amigos e até patrocinadores que financiam os partidos para obter vantagens em negociações futuras”. Diz que conta pelos dedos os políticos que tinham sentido de Estado, missão, de servir o outro e de sacrifício. Nestas eleições completará o 49º ano de abstenção.

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O que dizem os especialistas?

Contrariando uma tendência de décadas, a abstenção nas eleições legislativas baixou pela primeira vez em 2022. Mesmo assim, quase metade dos eleitores inscritos optaram por não ir às urnas. Um problema há muito identificado, mas que tarda em ser resolvido.

Em entrevista à CNN Portugal, o politólogo João Pacheco justifica a alta abstenção do país como reflexo do crescente descontentamento da população. “Os partidos estão desgastados na sua relação de credibilidade e de proximidade com os eleitores”, explica, acrescentando que “o foco está na fidelização de militantes e não na ligação com os eleitores”. 

João Cancela,  investigador do IPRI-NOVA, partilha da mesma opinião, referindo o efeito de saturação eleitoral existente. Não passou muito tempo desde as últimas eleições legislativas. Foi em 2022 que o Partido Socialista, liderado por António Costa, venceu as eleições, atingindo a maioria absoluta. E em 2021 tivemos eleições presidenciais, que ditaram o início do segundo mandato de Marcelo Rebelo de Sousa. Por outro lado, “há uma grande fragmentação eleitoral que, para estas eleições, pode trazer grandes mudanças no peso dos partidos com assento parlamentar”.

“É difícil saber se são sempre as mesmas pessoas que se abstêm”, afirma João Cancela, explicando que não há dados fiáveis. Contudo, há um conjunto de dados que tornam possível traçar (mais ou menos) o perfil de um abstencionista. No que toca à idade, as pessoas mais velhas, tendencialmente, votam mais. “Em média, o segmento populacional que mais vota são pessoas com mais de 55 anos e mais de 60. Estes são os eleitores mais assíduos”, diz. João Pacheco concorda, dizendo que apesar da fadiga política, os mais idosos são os que participam mais pois “reconhecem a fragilidade da democracia". 

Já os jovens, em contrapartida, são os eleitores menos assíduos. Para ambos os especialistas, os jovens ainda têm de ganhar consciência política. João Cancela diz que a principal razão para a abstenção dos jovens é a falta de identificação partidária. 

Outro padrão identificável nos abstencionistas é a desigualdade de voto de pessoas com níveis mais altos de instrução. “Tendencialmente, as pessoas com menos educação abstêm-se”, afirma João Cancela, destacando que as pessoas com rendimentos mais altos votam mais. 

“Atualmente não há diferença estatística significativa”, diz, referindo-se ao fator gênero. Contudo, antigamente era comum que fossem mais homens a votar, explica. Assim, no perfil de um abstencionista temos alguém jovem, com menos instrução e poucos rendimentos. Isto de um ponto de vista de variáveis democráticas de caracterização social. Para João Cancela existem ainda determinadas atitudes que importam para a análise do perfil de um abstencionista. 

Em primeiro lugar há pessoas mais desligadas da política, pelo simples facto de não se identificarem com nenhum partido, explica o especialista. “Geralmente, essas pertencem à fatia dos jovens”. Contrariamente às pessoas de gerações mais velhas, que tendem a identificar-se com partidos. “Podem não votar sempre no mesmo partido, mas desenvolveram uma identificação”, afirma João Cancela, explicando, ainda que nas gerações mais jovens isso não se comporta da mesma forma, estão menos vinculadas e menos propensas a votar. 

Este desencanto político, sobretudo dos jovens, é, segundo o politólogo João Pacheco, agravado pela transformação dos políticos em celebridades, resultando numa maior desilusão por parte dos eleitores. “Os protagonistas políticos têm uma espécie de leitura de fãs, são estrelas”. Assim, “havendo uma linha ténue entre o político e a celebridade, haverá maior desilusão perante os eleitores", desenvolve. “Cada vez mais a comunicação é feita enquanto celebridade, ao invés de decisor, o que traz picos de reconhecimento, mas também um desgaste mais acelerado”.

O politólogo salienta os 900 anos de história de Portugal, destacando os 50 anos de participação eleitoral democrática. “É pouco, mas já dá para estabelecer uma tendência”, diz João Pacheco, explicando que, além das causas sociais, o grande problema do sistema político e partidário é a quebra de reputação dos partidos e dos políticos. 

João Cancela traça assim o perfil de um abstencionista como alguém mais jovem, menos instruído, das regiões mais periféricas, com menos rendimentos, sem identificação partidária e mais desligado da política. 

Perante a crise política atual, João Pacheco antecipa um aumento da contestação nas próximas eleições. "Se será pela via da abstenção ou pela via do reforço dos partidos de protesto, vamos ver”. Assim, considera que nestas eleições o protesto não será tanto pela ausência ou abstenção, mas sim pelo voto de confiança.

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