Guerra, crise, pandemia, ataques informáticos. A vida mudou radicalmente em três anos. Por isso mesmo há palavras e expressões que aparecem no novo programa de Governo, que vai ser discutido esta quinta e sexta-feiras na Assembleia da República, que nunca tinham aparecido antes ou cuja frequência era muito menor. Outras há que, de forma surpreendente, são esquecidas ou relegadas.
A saúde mental foi um tema referido por apenas duas vezes no anterior programa do Governo. Para a próxima legislatura essa é uma questão mais premente: são 17 as menções ao termo, num ganho de importância claramente relacionado com a pandemia de covid-19, durante a qual milhares de pessoas sofreram de problemas como ansiedade, depressão ou outros.
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Em sentido contrário, a procriação medicamente assistida parece ter perdido relevância: das cinco vezes que apareceu no programa anterior passou a uma, num ponto em que fala do acesso e qualidade dos cuidados de saúde, não sendo exclusivo da procriação medicamente assistida. Em sentido contrário, em 2019 havia um tópico específico para esta questão, que se destinava a “promover um melhor acesso à procriação medicamente assistida e aos cuidados materno-infantis”.
Ainda no domínio social, também a violência doméstica perde peso: são 9 referências em 2022 contra as 14 de 2019.
Ucrânia e ciberataques, sinais dos novos tempos - mas e os combustíveis?É sem surpresa que verificamos que a Ucrânia não tinha uma única referência no programa de Governo em 2019. Apesar de haver uma anexação da Crimeia por parte da Rússia, o Ocidente convivia serenamente com a situação. A 24 de fevereiro tudo mudou e a invasão ordenada por Vladimir Putin obrigou à alteração da visão ocidental. Portugal não foi exceção e o Governo ainda foi a tempo de incluir a questão, ainda que muito ao de leve, no seu programa.
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São três as referências à Ucrânia, falando-se sempre numa “invasão” por parte da Rússia, em alinhamento com a generalidade da comunidade internacional. Se o problema é mencionado em referências ao papel de Portugal na crise dos refugiados e na atuação da NATO, há um tema que parece ficar de fora, pelo menos nesta ligação.
É que, além do drama humanitário, há uma crise económica, a começar pelos combustíveis, que já se faz sentir nos bolsos dos portugueses. Desde 23 de fevereiro, o preço da gasolina e do gasóleo aumentou quase 30 cêntimos, esperando-se já novas consequências, como no preço dos alimentos.
Nem a Ucrânia nem as alterações climáticas motivam o Governo a utilizar a palavra "combustíveis". De resto, o termo não aparece uma única vez em todo o documento, acontecendo o mesmo com gasolina e gasóleo.
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A crise energética causada pela guerra no Este da Europa aparece poucas vezes nas 182 páginas de programa, sendo que no capítulo chamado “boa governação” o Governo compromete-se a defender empresas e famílias “contra os aumentos exponenciais do preço da energia e dos bens alimentares”.
Outra palavra que não surge uma única vez é "inflação", um fantasma que pode chegar em força este ano, mas que o Governo não fala no seu programa.
Portugal não está envolvido na guerra na Ucrânia no terreno, mas ainda antes da invasão russa surgiram ameaças que faziam pensar sobre a interferência de países e indivíduos estrangeiros na vida e segurança de outros países. É o caso dos ciberataques, que este ano já tiveram dois episódios de grande relevância: logo em janeiro o ataque à Impresa, que detém a SIC, e um mês mais tarde o ataque à Vodafone, que deixou parte do país com as telecomunicações em baixo, em alguns casos durante dias.
Terá sido por isso que o Governo decidiu aumentar a presença dos termos cibersegurança e ciberdefesa, sendo que, pela primeira vez, referiu a importância da cibersegurança das empresas, numa referência clara ao que aconteceu àquelas duas organizações.
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São duas ideias que já constavam do programa do Governo para o período entre 2019 e 2023, mas que, com a queda do Executivo, não chegaram a ver uma aplicação totalmente efetiva.
O Governo pretende fomentar o conhecimento dos direitos fundamentais e a adesão aos valores de cidadania por parte dos mais novos. Como? Através da programação de jogos eletrónicos, o gaming.
Outro ponto: e se Portugal fosse um “destino mundial para rotas pedestres e cicláveis”? É o que o Governo quer, com a eliminação de obstáculos ao transporte de bicicletas nos transportes públicos, além de uma expansão da rede de bicicletas partilhadas.
O objetivo é “dinamizar a criação de uma rede de cidades portuguesas amigas da bicicleta”, algo que ajudaria Portugal no objetivo de se tornar um país sustentável em termos de energia.
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