Já fez LIKE no CNN Portugal?

"JMJ nunca foi promovida como forma de migração clandestina" - mas cardeal cabo-verdiano não exclui possibilidade de algum jovem optar por ficar em Lisboa

Arlindo Furtado diz confiar "na palavra dos jovens", mas pede equidade e reciprocidade na isenção de vistos para Portugal

O cardeal cabo-verdiano, Arlindo Furtado, disse esta terça-feira que não ficará escandalizado se algum conterrâneo ficar em Lisboa após a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) e pediu equidade e reciprocidade na isenção de vistos para Portugal.

"Não fico escandalizado se porventura acontecer um ou outro caso. Mas, à partida, eu confio na palavra dos jovens que se comprometeram a ir e a regressar, porque a jornada nunca foi tida, nunca foi apresentada, nunca foi promovida como forma de migração clandestina", afirmou o bispo da Diocese de Santiago, em declarações à Rádio Nova de Maria de Cabo Verde. 

PUB

Ao ser questionado sobre os cabo-verdianos que foram à JMJ e que nos primeiros dias não terão comparecido no evento, o representante da Igreja Católica cabo-verdiana disse que ​​​se a jornada fosse em Cabo Verde ninguém aventava a possibilidade de os portugueses ficarem no arquipélago africano.

"Se a jornada fosse em Cabo Verde ninguém falaria de jovens portugueses que pudessem vir a Cabo Verde e não regressar a Portugal, ficando clandestinamente aqui. Porquê? Porque os portugueses podem entrar em Cabo Verde quando querem e saem sem nenhuma restrição", salientou.

De um total de 913 cabo-verdianos, incluindo religiosos, a inspetora coordenadora superior do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) avançou que 168 não terão comparecido na Diocese Leiria-Fátima, para o evento que terminou no domingo. 

O cardeal referiu que os portugueses podem entrar e sair quando querem de Cabo Verde, mas que os cabo-verdianos não têm essa mesma facilidade, e afirmou que há uma falta de equidade, justificando que não têm tido medidas iguais para os dois lados.

PUB

"Temos que ver isso também porque nós somos todos membros da CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa]. Cabo Verde deu essa facilidade, porque é que não há alguma reciprocidade? Quer dizer, no caso dos portugueses virem a Cabo Verde não se põe esse problema, mas porque é que se põe nos cabo-verdianos em relação a Portugal?", voltou a questionar.

O cardeal referiu que há coisas que devem ser melhoradas diplomática e politicamente, que a equidade, justiça e reciprocidade devem ser vistas porque fazem parte da relação humana.

"Nós somos igualmente humanos, somos igualmente membros da mesma comunidade CPLP, somos falantes da mesma língua, uns têm certos privilégios e outros não têm. Esse problema não devia pôr-se e agora mesmo, nós cabo-verdianos, partindo de suspeições, de preconceitos, atacamos os nossos próprios concidadãos", observou.

"Para alguns, por ventura, terá sido a única oportunidade de encontrar visto para tratar de saúde, para visitar o filho que está lá ou para visitar o tio que está doente e também a conhecer o mundo. Nós somos cidadãos do mundo, nós somos o cristão que Deus, pai de todos, criou o céu e a terra e criou um mundo para todos os seus filhos e filhas", acrescentou.

PUB

Conforme disse, o cristão sabe que o mundo é para todos, para além das regras de nacionalidade, políticas, afirmando que o mundo precisa da consciência da dignidade, de fazer gestão equitativa das relações para conseguir o equilíbrio das coisas.

"Esse é um aspeto que deve ser considerado, mas espero bem que as coisas avancem, que não fique muita gente lá, que se a gente tiver mesmo que ficar, porque muitas vezes também há a ilusão de que a vida na Europa é uma vida fácil, abundante, rica. Estou convencido que alguns jovens que poderiam eventualmente ter essa ideia inicial, com duas, três semanas de presença em Portugal, são capazes de aprender muito e ver que, afinal, uma coisa é a imaginação e a outra coisa é a realidade", sustentou.

"Eu estou convencido que Portugal está consciente de que alguns peregrinos da CPLP poderiam ficar e Portugal, se calhar, está a contar com alguns deles para terminar as tarefas porque precisa de imigrantes para ocupar certas faixas de trabalho", apontou ainda.

Em julho, antes da partida dos peregrinos a Lisboa, o assistente diocesano da juventude das dioceses de Cabo Verde, diácono José Manuel Vaz, admitiu à Lusa a preocupação pela possibilidade de muitos não regressarem, numa altura de forte pressão na procura de vistos para a Europa, onde desde 2019 cidadãos de 36 países deixaram de estar obrigados a um visto de curta duração para entrar em Cabo Verde.

PUB