Quando lhe foi diagnosticado um cancro terminal em 2020, Iain Ward tinha a certeza de uma coisa: não estava interessado em nenhuma “festa de piedade”.
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Os médicos tinham descoberto um tumor cancerígeno a crescer no seu cérebro, depois de o irlandês ter participado num ensaio médico voluntário. Depois dos testes, foi-lhe dito que tinha cerca de cinco anos de vida.
Mas fale agora com este jovem de 33 anos e ouvirá um homem com uma perspetiva invejável da vida; alguém que aceitou o seu destino mas que está determinado em usá-lo para o bem.
Desde o seu diagnóstico, Ward dedicou a sua vida a angariar o máximo de dinheiro possível. Atualmente, viaja de bicicleta pelos Estados Unidos com uma amiga, Adee Phelan, para participar em ações de caridade a favor da saúde mental e contra o cancro.
Iain Ward dedicou a sua vida a angariar tanto dinheiro quanto possível em ações caridade.
Além da sua pedalada grotesca - que Ward descreve como uma “viagem gigantesca” -, ele também quer bater os recordes mundiais de maior quantidade de dinheiro angariado por uma única pessoa a correr uma maratona, e o de maratona mais rápida de alguém vestido de personagem de videojogo.
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“Eu podia ficar muito zangado com a má mão de póquer que me foi dada, mas, ao mesmo tempo, é quase arrogante da minha parte não olhar para a outra mão de póquer espantosa que em simultâneo me foi dada”, conta ele à CNN. E acrescenta: o seu cancro deu-lhe clareza sobre a vida.
A dupla, com uma pequena equipa de apoio, partiu de Nova Iorque no mês passado e estima que demorará cerca de dois meses a percorrer os quase 5.500 quilómetros até Los Angeles, na Califórnia [atravessando assim os Estados Unidos de uma costa à outra].
Ward tem estado a documentar momentos da sua viagem nas redes sociais, que “explodiram” em popularidade nos últimos meses.
O “Rei da Quimio” [no original, thekingofchemo] tem quase cinco milhões de seguidores no TikTok, onde publica vídeos de motivação e de humor sobre a sua viagem.
No entanto, apesar de angariar dinheiro para caridade, Ward não está à procura de doações. Em vez disso, ele quer que o sigam nas redes sociais.
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Dessa forma, ele pode conseguir que as grandes corporações lhe paguem pela publicidade dos seus produtos, que ele depois doa para caridade.
“A prioridade é apenas conseguir um canal de rede social tão grande que seja incontornável, que não possa ser ignorado”, diz ele.
“Gosto de pensar que isto acabará por tornar-se fácil, quase como uma apresentação robotizada, onde se pode simplesmente mostrar os números e os resultados, e depois terei muito dinheiro doado para a investigação do cancro”.
“Estranha sorte”Apesar do seu diagnóstico, Ward diz que valoriza a “estranha sorte" que o tem acompanhado ao longo da vida.
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Isto pode parecer uma declaração chocante, num homem com cancro terminal, mas a filosofia de vida de Ward não lhe permite pensar nos aspetos negativos.
Ward está grato por os médicos terem sido capazes de diagnosticar a sua doença antes de ter experimentado quaisquer sintomas - afinal de contas, foi isso que lhe permitiu enfrentar estes desafios.
Ele diz estar também grato por fazer parte do “clube de elite” para se submeter e sobreviver a uma craniotomia - um procedimento cirúrgico que remove uma parte do osso do crânio para expor o cérebro.
Houve também boa sorte na forma como ele acabou por estar a viajar de bicicleta pelos EUA.
Antes, ele tinha procurado angariar dinheiro para uma corrida épica pelo país, quando Phelan o contactou através do Instagram.
Phelan sofre de depressão e estava a planear atravessar os EUA de bicicleta para angariar dinheiro para a saúde mental e sugeriu a Ward que se juntasse a ele durante uma semana.
No seu primeiro encontro juntos, tornou-se claro que, em vez disso, os dois iriam enfrentar juntos todo o desafio - apesar de Ward admitir que não é grande fã de ciclismo.
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Fanático por “fitness” - gosta particularmente de levantar pesos -, Ward diz que não treinou muito para o projeto, mas que estava ciente dos principais desafios que poderiam apresentar-se.
“Espero que isto não pareça arrogante, mas tenho experiência suficiente para saber que a coisa mais difícil que vamos fazer não tem nada a ver com a capacidade física", diz ele sobre a viagem.
“Será sim a tolerância de ter um rabo realmente dorido, e para isso não se pode treinar.”
“Provavelmente não vamos ter de suar muito, exceto quando atravessarmos o deserto, quando nos aproximarmos do Verão”.
“Se vamos fazer umas cinco horas por dia, não vamos correr duramente. Vai ser uma viagem gigantesca. Não vai ser uma corrida”.
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Uma pequena equipa para fazer um documentário acompanha o par durante toda a sua viagem e Ward, que tem muito à-vontade frente à câmara, está a desfrutar do processo de filmagens.
O objetivo é vender o documentário, na esperança de que o seja como uma série à Netflix, o que poderá então ser usado para angariar ainda mais dinheiro para caridade.
Paragens no Grand Canyon e em Las Vegas ainda estão para vir e Ward parece estar a adorar cada minuto. Isso é claro nos seus vídeos nas redes sociais.
Mas ao mesmo tempo que transmite um otimismo inflexível nas redes sociais, ele admite que houve momentos desde o seu diagnóstico em que as coisas se tornaram demasiado pesadas – mesmo se fugazmente.
Ward lembra-se das “emoções negativas que me inundaram” quando o médico lhe contou sobre a gravidade da sua doença, e ocasionalmente recebe uma “estalada na cara” quando se vê a ler sobre a esperança de vida das pessoas na sua condição.
Mas mergulhar em tais coisas não é uma opção para Ward, que é tão hábil em dominar a sua mente como o seu corpo.
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“Enterro a minha cabeça na areia sobre toda a situação”, admite Ward. “Mas penso que o faço por uma razão lógica”.
“Não posso simplesmente olhar para um trabalho de investigação e depois mudar as taxas de sobrevivência. Por isso, se não posso mudá-lo, acredito que não devo concentrar-me nisso. Tendo em conta que há coisas que posso controlar e mudar, opto por me concentrar nelas".
Controlar a sua vidaNa entrevista com a CNN, o conceito de controlo torna-se um fio condutor ao longo das suas respostas.
Até certo ponto, o seu diagnóstico roubou-lhe o controlo da sua vida, mas Ward não quer ser definido pela sua doença.
Nesses momentos de solidão, quando é só ele e a bicicleta, ou só ele e os seus passos, Ward tem tempo para refletir sobre tudo o que foi aparecendo no seu caminho.
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“Trata-se de poder percorrer o caminho que se escolhe na vida”, diz, concordando que o controlo é, de certa forma, semelhante à liberdade.
“Mas por vezes o seu caminho na vida é como um caminho-de-ferro", acrescenta. “Só é preciso seguir em frente e, qualquer que seja a forma como o faça, isso irá naturalmente guiá-lo nessa direção, em vez de estar num carro onde tem o controlo efetivo do volante.”
“Penso que, na verdade, essa é uma metáfora bastante adequada”.
Ward tem grandes planos para depois de terminar a sua travessia dos EUA. Há a “pequena questão” de quebrar recordes mundiais em maratonas e ele também quer, um dia, circum-navegar o globo apenas pela força humana (de bicicleta, correr, caminhar).
Estes são planos grandiosos, segundo os padrões de qualquer pessoa, mas Ward diz ter a determinação e o entusiasmo para torna-los realidade.
Claramente, Ward tem ainda muita vida por viver.
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