Já fez LIKE no CNN Portugal?

Coluna militar de 64 quilómetros será o último passo de Putin para tomar Kiev?

São centenas de veículos e milhares de soldados que há dois dias estão a caminho da capital ucraniana. Mas com que objetivo?

Na segunda-feira, foi detetada uma gigantesca coluna militar que saiu da Bielorrússia com destino a Kiev. São mais de 60 quilómetros de extensão, com milhares de soldados russos, que vão em centenas de carros a caminho da capital da Ucrânia. O que significa este passo e qual a sua importância estratégica?

Para o general Leonel de Carvalho, que falou à CNN Portugal, esta movimentação serve como uma força de dissuasão, à margem das negociações que continuam a decorrer entre ambas as partes. De acordo com o militar, a Rússia não tem intenção de fazer um ataque em larga escala em Kiev, não só pela dificuldade que isso acarretaria, levando a muitas baixas humanas, mas também porque não quer destruir cidades.

PUB

“A Rússia está a evitar ter muitas baixas, até porque isso afetaria a opinião pública no país”, refere, acrescentando, porém, que a “intenção será mesmo tomar a cidade”.

O major-general Carlos Branco concorda, e sublinha que a pretensão do exército russo é uma capitulação de Kiev sem que se chegue a uma batalha efetiva no terreno.

É por isso que, segundo o militar, a Rússia tem atacado alvos muito direcionados, como foi o caso da torre de televisão, ou como poderão ser os casos dos serviços de informação e outras infraestruturas estatais, que Moscovo já disse serem alvos. 

“A coluna militar insere-se naquilo que é a tática russa: cercar as cidades mais importantes. O objetivo é cercar Kiev e obter a capitulação sem combates”, diz, mencionando que a capital ucraniana está a mostrar resistência, mas que já vive com racionamento de meios, ainda que mantendo os serviços básicos.

Como se compõe a coluna militar?

PUB

A dimensão de 64 quilómetros é reveladora, mas os especialistas referem que não será bem assim. Além de haver um grande espaçamento em algumas das zonas da coluna militar, muitos dos veículos que a compõem são de logística ou de transportes.

"Esses 64 quilómetros não são todos de viaturas de combate, algumas transportam tropas e outras mantimentos e logística", refere Leonel de Carvalho.

É isso que destacam os vários especialistas norte-americanos que têm analisado a situação, e que alertam que nem todos os veículos visíveis têm capacidade militar.

Pelo caminho, e de acordo com as imagens recolhidas pela Maxar, várias casas foram vistas a arder, não havendo uma relação oficial entre a passagem da coluna militar e esse facto.

*Comprimento da coluna militar russa que vai a caminho de Kiev (Maxar/AP) *Approximate convoy endpoint - pontos onde se inicia e termina a coluna *Stretch of convoy - extensão da coluna *Houses burning - casas a arder

PUB

E se a Rússia avançar mesmo?

Para os dois militares ouvidos pela CNN Portugal, uma invasão armada em larga escala a Kiev é, por esta altura, pouco provável, mas não impossível, até porque, como diz Leonel de Carvalho, “é muito difícil prever o que vai acontecer”.

Para o general, esta estratégia faz parte do plano inicial, ainda que exista uma “constante adaptação” aos objetivos definidos.

Leonel de Carvalho define esta como a primeira fase, a de dissuasão, mas admite um passo à frente, que teria como objetivo a tomada da cidade, que poderia demorar “muito tempo”.

“Seriam ataques diversos, atacar a cidade em várias frentes, ganhando alguns metros na frente”, explica, referindo que “Vladimir Putin não estava a contar com este tipo de resistência”.

“Não acredito que a Rússia tome Kiev sem muitas baixas, o que só poderá tomar num ataque de uma escala muito intensa, com meios aéreos e terrestres”, que, segundo o general, não interessa à Rússia.

Carlos Branco concorda com esta visão, e diz que a oeste, como é o caso de Kiev, quase todos os ataques têm sido para inviabilizar infraestruturas, mas também para cortar as linhas de abastecimento. É o que se verifica na capital ucraniana, onde as condições de vida já começaram a piorar, sem acesso a alguns bens.

PUB

O major-general não exclui um “ataque feroz”, mas diz que, para já, vai acontecer uma disposição no terreno, mostrando poder ao inimigo.

“Um ataque a Kiev não é a intenção primária, mas pode vir a acontecer que a situação se altere e eles tenham de entrar de outra forma”, diz, apontando “alguma cautela” na forma como a Rússia tem abordado as diferentes cidades.

Porque não ataca Kiev a coluna?

Com a coluna militar a avançar, ainda que lentamente, seria de supor que a Ucrânia podia tentar atacar essas movimentações. Para os especialistas ouvidos pela CNN Portugal, isso nunca acontecerá até os russos chegarem a Kiev, e há duas razões que explicam isso: falta de meios e tentativa de não escalar a situação.

Leonel de Carvalho diz que a defesa de Kiev se vai fazer no reduto da cidade, se e quando isso for necessário. O general não antevê um contra-ataque sobre a coluna militar russa, uma vez que as tropas ucranianas não têm meios para tal.

“Kiev praticamente não tem meios aéreos nem ogivas, que seriam as únicas formas de atacar”, refere.

PUB

O general lembra ainda que continuam a decorrer negociações, conversas nas quais a Ucrânia é “obrigada a participar”, uma vez que, se não aparecesse, estaria a legitimar uma ofensiva russa. No entanto, estas mesmas negociações são, para o militar, uma forma de a Rússia deixar a Ucrânia de “mãos e pés atados”, até porque não vê intenções russas de abandonar os objetivos a que se propõe.

Sobre a defesa de Kiev, diz Leonel de Carvalho, só vai acontecer quando a cidade for mesmo atacada no terreno. Aí, o exército ucraniano vai efetivar o combate, defendendo-se abrigado, a “única forma que tem”.

“Combate em campo aberto seria um suicídio. A desproporção de forças é tão grande que a única hipótese é defender e fazer pequenos contra-ataques”, afirma.

Apesar de ver menos forças do lado da defesa, o general lembra “o fortíssimo nível de moral dos ucranianos, algo essencial na defesa”. Por isso, o especialista entende que, mesmo que Moscovo tome a cidade, haverá sempre resistência a partir do interior.

Carlos Branco não é tão otimista em relação à resistência ucraniana, mas volta a lembrar que a guerra propriamente dita se faz mais noutros locais, como é o caso da cidade de Mariupol, no mar Azov, um dos principais portos da Ucrânia, e que a Rússia quer tomar para ligar por terra a Crimeia e o Donbass.

PUB