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Deputado do PS acumula cargo com presidência das Águas do Interior Norte. Comissão parlamentar diz que há "incompatibilidade e impedimento"

Parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados foi conhecido esta quarta-feira e tudo começou com uma denúncia anónima. Deputado Carlos Silva (à esquerda) já admitiu pedir renúncia da presidência da empresa municipal

O deputado do PS Carlos Silva está em situação de “incompatibilidade e impedimento” por não ter abdicado do seu cargo como presidente do Conselho de Administração da Sociedade Águas do Interior Norte (AdIN), cargo que mantém desde 2021. É esse o entender de um parecer feito pela Comissão de Transparência e Estatutos dos Deputados (CTED) que refere que o facto de o socialista se manter à frente daquela empresa pública mesmo tendo sido eleito nas legislativas de março “configura um impedimento do regime jurídico de exercício de funções por titulares de cargos políticos”.

Este parecer surge depois de uma denúncia anónima ter chegado ao presidente da Assembleia da República no dia 2 de maio. Nela, pedia-se que se avaliasse a “existência de uma eventual ilegalidade quanto ao exercício em simultâneo, por parte do Senhor Deputado Carlos Silva, do mandato parlamentar e do cargo de Presidente do Conselho de Administração”, segundo consta no documento a que a CNN Portugal teve acesso. 

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Essa denúncia anónima viria a ser remetida para um grupo de trabalho da CTED sobre Registo de Interesses que, depois de a analisar, apresentou este parecer, concluindo “que existe incompatibilidade e impedimento no exercício cumulativo pelo Senhor Deputado Carlos Silva do mandato de Deputado com as funções de Presidente” daquela empresa pública.

Na base da decisão do parecer, elaborado pelo deputado social-democrata Hugo Carneiro, estão dois artigos que apontam para a existência de incompatibilidades dentro do estatuto dos deputados. Um deles é o artigo 20.º, que “veda de forma expressa, gerando uma incompatibilidade (...) a integração pelos deputados em órgãos sociais de empresas municipais”, segundo o entender do parecer. 

O outro é o artigo 21.º que proíbe, por outro lado, os deputados de terem participação em procedimentos de contratação pública. No entender do parecer, a empresa em que Carlos Silva tem o cargo de presidente do Conselho de Administração faz parte do leque das “entidades adjudicantes”, ou seja, empresas maioritariamente financiada por entidades públicas como autarquias. 

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Neste caso, os acionistas da AdIN são oito autarquias, segundo os estatutos da empresa: Freixo de Espada à Cinta, Mesão Frio, Murça, Peso da Régua, Sabrosa, Santa Marta de Penaguião, Torre de Moncorvo e Vila Real. A empresa é também responsável pela gestão dos serviços municipais de abastecimento público de água e de saneamento de águas residuais urbanas destes municípios. 

Para Paulo Veiga e Moura, advogado especialista em contratação pública, a existência deste tipo de impedimentos surge pela necessidade de "evitar que quem já é deputado ainda vá ocupar cargos nos órgãos sociais das empresas públicas, numa espécie de domínio de lugares públicos". "Independentemente das razões", acrescenta, "enquanto a lei estiver em vigor tem de ser cumprida e respeitada".

Esta quinta-feira, em consequência do parecer, o socialista afirmou que não se manterá no cargo da empresa municipal, "tendo já renunciado". "Tendo para o efeito remetido aos respetivos órgãos de gestão da empresa a minha renuncia ao desempenho das funções não executivas e não remuneradas", afirmou em resposta a um e-mail da CNN Portugal. 

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No entanto, na defesa apresentada à Comissão de Transparência e Estatutos dos Deputados, Carlos Silva refere que quando soube que tinha sido um dos dois eleitos do PS pelo círculo de Vila Real foi “despoletada pelos acionistas da empresa uma alteração da sua orgânica interna, que visou esvaziar o Conselho de Administração de poderes executivos e criada a figura do Diretor Executivo”. 

Refere ainda que o seu cargo como presidente do conselho de administração não é remunerado e que também não recebe qualquer tipo de “abono, ajuda de custo ou subsídio”. O deputado sublinha também ter tido “consciência de estar no cumprimento de todo o enquadramento legal” que lhe “é aplicável” e, por isso, permaneceu “no exercício do aludido cargo de Presidente do Conselho de Administração da AdIN de forma não executiva e não remunerada.”

Por outro lado, o facto de o deputado ter prescindido de auferir rendimentos da empresa pública ou de exercer poderes executivos “não torna, por si só, a sua atividade legislativa livre de pressões”, considera João Massano, presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados. "Pode, por exemplo, tornar-se um alvo de influências externas decorrentes da participação em procedimentos de contratação pública da própria empresa", acrescenta.

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