AUTÁRQUICAS || Um dos votos começou por ser validado mas o Tribunal Constitucional mandou anulá-lo; outro dos votos teve o destino oposto. Com as candidaturas da CDU e do Chega separadas por um voto na eleição para a Câmara de Lisboa - e esse voto dá direito a um vereador -, Bruno Mascarenhas (Chega) avançou com um recurso para tentar aumentar a vantagem
Num dos votos, a cruz está quase toda feita fora do quadrado respetivo à candidatura da CDU, mas um traço ainda preenche uma parte da zona válida. No outro voto não há nenhuma cruz mas sim um visto - ou um sinal de "certo" - colocado na candidatura do Chega. O primeiro foi considerado aceite e o segundo foi dado como “nulo” pelo Tribunal Constitucional, que reviu ambos os boletins após um recurso da candidatura de João Ferreira, da CDU, deixando a eleição de um vereador na Câmara de Lisboa separada por um voto.
Na manhã de segunda-feira, a candidatura de Bruno Mascarenhas (Chega) avançou com um contrarrecurso para o mesmo Tribunal, prolongando o impasse eleitoral que mantém em suspenso, há semanas, os resultados do Chega e da CDU para a Câmara de Lisboa. E tudo por causa destes dois boletins
Em declarações à CNN Portugal, Bruno Mascarenhas garante que o tribunal devia “rever a sua decisão [sobre o boletim com o voto na CDU], já que há cinco acórdãos anteriores do Constitucional que consideraram que este tipo de voto é nulo”. “Além disso, esse mesmo boletim foi tido como nulo em duas outras ocasiões: primeiro na secção original em que foi depositado o voto e depois durante a assembleia de apuramento geral”.
Assim, confirma aquele que será vereador do Chega na Câmara caso o partido fique mesmo à frente da CDU, o recurso incide principalmente sob o destino destes dois votos - os quais, além da repetição determinada pelo Constitucional da recontagem dos boletins da secção número 28 da assembleia de voto da freguesia de São Domingos de Benfica, podem acabar por determinar qual dos partidos conseguirá eleger mais um vereador na maior autarquia do país.
No caso do voto que foi validado para a CDU, o mesmo teve origem na seção n.º 4 da freguesia de Santa Maria Maior. Entendeu o Tribunal Constitucional que este boletim foi considerado válido após ter sido “assinalado com uma cruz parcialmente dentro do quadrado correspondente à lista” da candidatura de João Ferreira - voto esse que, “sem transcender as linhas horizontais que isolam aquela candidatura, excede os limites do quadrado correspondente”.
No caso do boletim com o voto da CDU, e segundo um acórdão do Tribunal Constitucional publicado na sexta-feira, a cruz encontra-se “colocada parcialmente sobre o quadrado respetivo, inteiramente distanciada dos quadrados das demais candidaturas, estando um dos segmentos de reta colocado sobre o quadrado e o outro tocando no vértice do quadrado". “De resto, os caracteres do desenho da cruz — em tamanho grande e com os traços revelando uma escrita trémula — parecem evidenciar tratar-se justamente dos casos que o legislador quis abranger com [esta] norma.”
Já no caso do voto que foi retirado à contagem do Chega em Lisboa, os juízes do Palácio Ratton descrevem-no como um boletim “assinalado com dois segmentos de reta fazendo um vértice [V]” e justificaram a sua decisão com base no perigo de o mesmo vir a “criar dúvidas quanto à interpretação da vontade eleitoral”, tal como pôr “decisivamente em causa o sigilo do voto, permitindo a identificação do eleitor a partir do desenho escolhido”.
Além da mudança na validação destes votos, o acórdão do Tribunal Constitucional decidiu também ordenar que se proceda à recontagem dos votos da secção de voto n.º 28 da assembleia de voto da freguesia de São Domingos de Benfica, por estar em causa uma disparidade entre os resultados constantes da ata do apuramento local e aqueles que constam do edital do apuramento local do sistema informático ‘VPN Eleitoral’. Há, segundo os juízes, “uma dúvida fundada e séria sobre a existência de um lapso com reflexos no resultado eleitoral, que apenas pode ser dissipada pela recontagem dos votos daquela secção de voto”.
Já antes, também em São Domingos de Benfica, tinham ficado 61 boletins da modalidade de voto antecipado por contabilizar, já que os mesmos foram impressos sem o quadrado que permitia votar no Chega. Um erro que foi assumido pela Câmara de Lisboa.