Se a Alemanha não está bem economicamente, a Europa também não conseguirá estar e, consequentemente, Portugal. Sector representa 10% da indústria manufatureira no velho continente
O anúncio de que a Volkswagen está a considerar o fecho de fábricas e despedimentos na Alemanha como parte de um plano de redução de custos, para fazer face a uma “situação extremamente tensa”, segundo o gigante automóvel, está a gerar algum alarme na Europa. A concretizar-se, a decisão de fechar uma fábrica seria a primeira desde 1988, quando a empresa fechou a fábrica em Westmoreland, nos Estados Unidos. Já na Alemanha, a Volkswagen nunca fechou uma fábrica nos seus 87 anos de história.
E o possível encerramento de fábricas da Volkswagen na Alemanha pode afetar o desempenho da Autoeuropa em Portugal, alerta Paulo Mota, professor na Faculdade de Economia da Universidade do Porto, em entrevista ao Top Story da CNN Portugal.
“Estas notícias que conhecemos agora da Alemanha não são animadoras para a economia europeia e, por consequência, para a economia portuguesa. E isso acontece fundamentalmente por duas razões. Em primeiro lugar, porque há um efeito naturalmente direto destes desenvolvimentos na Alemanha e em Portugal pela via do investimento direto estrangeiro. Estamos a falar do que poderá acontecer com a Autoeuropa. Por outro lado, sabe-se que a Alemanha é um motor da economia europeia e que afeta a nossa procura externa. Por isso, um pior desempenho da Alemanha, e neste momento a Alemanha está numa situação de ligeira recessão, vai afetar as nossas exportações", justifica Paulo Mota.
Uma opinião corroborada pelo economista João Rodrigues dos Santos, que recorda que a indústria automóvel em Portugal representa cerca de 5,5% do PIB, além de 62 mil postos de trabalho. O economista lembra também que "a indústria automóvel representa cerca de 7% do PIB da União Europeia" e "representa cerca de 13 milhões de postos de trabalho, ou seja, 6% da força de trabalho da UE", pelo que o possível encerramento de fábricas e despedimentos por parte da Volkswagen terá impacto.
E se a economia alemã fraquejar, Portugal poderá ser arrastado. "A Alemanha é o terceiro país mais importante para as exportações portuguesas, é a maior economia da União Europeia e, quando a Alemanha treme, a Europa treme e Portugal também treme", sublinha.
João Rodrigues dos Santos aponta ainda que "a Alemanha tem sido bastante prejudicada pelas sanções impostas à Rússia" e que, para além disso, existe uma "outra variável, que temos vindo a ver crescer paulatinamente, a variável China".
"Não é só a Volkswagen que está com problemas"
No entanto, Abel Mateus, antigo economista sénior do Banco Mundial, considera que a quebra na indústria automóvel é um problema geral na Europa, "não é só a Volkswagen que está com problemas".
"Em termos conjunturais, repare-se que não é só a Volkswagen que está com problemas. O preço das ações da Volkswagen caiu cerca de 24% nos últimos três meses, mas, por exemplo, se a gente olhar para o grupo Stellantis, da Peugeot, caiu mais de 50%. Portanto, é um problema geral da indústria automóvel europeia e que representa, como se sabe, 10% da indústria manufatureira europeia."
Abel Mateus lembra ainda que "a Europa não tem acesso fácil e direto a muitas das matérias-primas que são necessárias, como o lítio e outras matérias ricas para a produção das baterias elétricas, o que leva a um problema muito sério para o futuro de continuar a eletrificação dos veículos a preços competitivos".
Hélder Barata Pedro, secretário-geral da ACAP, considera que "é normal que alguns grupos de construtores automóveis mudem de estratégia", uma vez que a "indústria automóvel é uma indústria global que está a passar por um processo de disrupção com a questão da descarbonização que temos na União Europeia com metas muito objetivas e concretas".
Para o responsável da Associação Automóvel de Portugal, "a notícia de um grande construtor europeu, mas mundial também, que anunciou uma minirrestruturação" pode ter impacto a nível europeu, porque não se "pode ser alheio à situação económica da Alemanha, o principal país em termos económicos e industriais na União Europeia"
"Na Europa tivemos uma retirada abrupta dos incentivos para veículos elétricos no final do ano, o que levou, no último mês, a uma queda de cerca de 36% das vendas de elétricos na Alemanha. Agora, recentemente, temos a notícia de que o governo alemão vai reintroduzir um pacote bastante alargado de incentivos para veículos elétricos para empresas. Tudo isto são situações que, digamos assim, estão em perigo", aponta o secretário-geral da ACAP.