Mulher de 70 anos consegue controlar o VIH há 15 anos sem medicamentos. Cura funcional inspira cientistas

CNN Portugal , DCT
11 ago 2022, 08:30
VIH/Sida

Não é um caso único, mas há apenas só mais um paciente a conseguir o feito. A cura funcional do VIH é ainda uma novidade, mas os cientistas acreditam que pode abrir portas ao tratamento da doença

Uma mulher espanhola de 70 anos tem conseguido controlar o vírus da imunodeficiência humana (VIH) de forma espontânea, isto é, sem o recurso a fármacos antirretrovirais. A paciente tem apresentado uma carga viral indetectável há 15 anos e os cientistas acreditam que este exemplo de cura funcional poderá abrir caminho a um maior entendimento sobre a doença, até porque já foi possível descobrir qual o mecanismo biológico deste feito: o segredo está nas células que servem de escudo-protetor do sistema imunitário.

A chamada ‘paciente de Barcelona’ foi diagnosticada em 2006 com uma infeção aguda do VIH. A mulher começou a tomar a terapêutica habitual para o combate ao vírus - os antirretrovirais - e foi, depois, incluída num ensaio clínico levado a cabo pelo Hospital Clínic de Barcelona, em Espanha, e cujo objetivo era perceber o poder que o sistema imunitário pode ter no combate à ação do vírus. 

Uma parte dos pacientes deste ensaio receberam apenas os antirretrovirais e a outra parte recebeu uma série de tratamentos imunomoduladores adicionais, incluindo o imunossupressor  ciclosporina A (usado, por exemplo, para doenças autoimunes como a artrite), conta o El País. A ‘paciente de Barcelona’ fez parte do grupo que recebeu imunossupressores e apresentou uma carga viral indetectável do vírus no plasma nove meses depois de ter parado com os antirretrovirais, deixando o seu sistema imunitário ‘trabalhar’ sozinho.

Uma vez que a mulher foi a única no grupo de 20 a apresentar tais resultados, os cientistas decidiram aprofundar a questão e procurar qual o mecanismo biológico que está na origem da remissão da doença: e são as células que desencadeiam as respostas imunitárias as protagonistas desta história.

Os investigadores começaram por analisar os linfócitos T CD4+, que são o principal alvo do VIH e cuja função é auxiliar outro tipo de células, e notaram que estes eram capazes de replicar o vírus, o que sugeria que a entrada do vírus nos linfócitos T CD4+ não causaria danos nos pacientes. Além disso, realizaram culturas com outras subpopulações de células sanguíneas e notaram um grande controlo da replicação do vírus. E foi aqui que se fez ‘luz’.

Após realizarem testes in vitro, os cientistas descobriram que eram “as células chamadas ‘Natural Killer’ [‘assassinas naturais’, em tradução livre] e também linfócitos T CD8+” as responsáveis pela resposta da paciente, descreve Sonsoles Sánchez-Palomino, um dos autores do ensaio. 

Os linfócitos T CD8+ são células do sistema imunitário adaptativo que são capazes de induzir a morte de células infetadas Já as células ‘Natural Killer’ são as que o organismo usa para desencadear uma reação imunitária quando entra em contato com o vírus, conseguindo controlar a sua ação - e no caso da ‘paciente de Barcelona’ foi possível perceber que são as células ‘assassinas naturais’ que têm memória e também as que se chamam T Gamma-Delta as responsáveis pela capacidade espontânea de controlar o vírus, tornando-o indetectável e intransmissível.

Segundo a CNN Brasil, há um outro paciente que conseguiu controlar o VIH de forma espontânea e através do sistema imunitário, mas ainda não são conhecidos detalhes, apenas se sabe que recebeu um transplante de células-tronco, sendo considerado a quarta pessoa conhecida a entrar em remissão do VIH no mundo. Contudo, o recurso a transplantes, apesar de promissor, não é para todos.

O vírus da imunodeficiência humana fica no organismo desde o primeiro momento do contágio e não há ainda uma cura, os medicamentos que são usados permitem manter o vírus latente e com uma carga viral indetectável, anulando o risco de contágio e de complicações, sendo a sida a mais gravosa, mas cada vez menos comum graças aos fármacos.

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