Ele passou sete anos a dar a volta ao mundo a pé. Mas o seu maior desafio foi regressar a casa

CNN , Tamara Hardingham-Gill
6 out, 15:00
Tom Turcich (CNN)

Quando regressou à sua cidade natal, acompanhado da sua adorada cadela Savannah, após sete anos de viagem, o aventureiro Tom Turcich, de Nova Jérsia, não podia estar mais esperançado em relação ao futuro.

Ele a sua companheira de quatro patas foram recebidos por uma grande festa de regresso a casa em Haddon Township, a 21 de maio de 2022, com Turcich a tornar-se oficialmente a décima pessoa a dar a volta ao mundo a pé e Savannah a reclamar o título de primeiro cão a fazê-lo.

Durante a viagem, ambos caminharam juntos em seis continentes e 38 países, incluindo o Chile, Panamá e Cazaquistão.

Companheira constante

O aventureiro Tom Turcich passou sete anos a dar a volta ao mundo com a sua cadela Savannah. Mas a vida mudou para sempre depois de regressarem. Fotografia: Tom Turcich

“O final foi incrível”, conta Turcich à CNN Travel, lembrando como os amigos, familiares e conhecidos apareceram para os receber. “Basicamente, metade da minha vida foi dedicada àquela ideia de caminhar pelo mundo e finalmente concretizá-la… cruzar a meta foi como um paraíso”, descreve.

Turcich já tinha revelado como as mortes das suas amigas, Anne Marie, que morreu num acidente de jet ski, e Shannon, que morreu num acidente de carro, foram os incentivos de que ele precisava para se lançar nesta viagem, e ficou emocionado ao ver que os pais das amigas estavam lá para o receber.

“Ter os pais da Anne Marie e da Shannon à minha espera foi muito especial”, afirma. 

Os três meses seguintes foram de grande emoção para Turcich, que demorou a digerir o seu feito incrível.

“Foi uma sensação indescritível. Tudo era perfeito”, diz.

Mas, à medida que o entusiasmo começou a desvanecer-se, Turcich começou a aperceber-se de que uma grande parte da sua vida tinha acabado ali e deu por si no seu ponto mais baixo.

“Eu apercebi-me disso quando estava a levar a Savannah ao parque”, recorda. “Que tudo continua. A vida continua”

“Esta coisa que consumiu toda a minha vida tinha chegado ao fim. Mas a vida continua, e é possível viver sem um grande propósito. E depois tornou-se tudo muito difícil”, confessa.

Turcich, que chegou a ser comparado a Forrest Gump, a personagem interpretada por Tom Hanks no filme que estreou em 1994, percebeu que tinha de seguir em frente e continuar a fazer “coisas que não significam tanto” como uma volta ao mundo a pé.

“É mesmo desafiante deixar de ter este ponto singular onde concentrava todos os meus esforços e depois ficar sem rumo”, diz.

De acordo com Turcich, as coisas chegaram a um ponto crítico quando ele se mudou para Seattle com a sua companheira, Bonnie Snyder, que conheceu já no final da sua viagem, em novembro passado.

“Caí naquela que foi provavelmente a primeira depressão que alguma vez tive”, afirma, descrevendo como se sentia perdido sem ter um propósito claro.

Uma perda de partir o coração

Turcich e a sua noiva, Bonnie, com os seus cães, Savannah e Cleo, que já morreram. Fotografia:Tom Turcich

Quando já estava a sair da escuridão, a sua adorada Savannah morreu.

Turcich recorda-se como tinha acabado de regressar de umas férias com a companheira, que estava de luto pela morte do seu cão, Cleo, quando soube que Savannah estava gravemente doente.

Embora ela já estivesse a ter “crises” de saúde durante alguns meses, Turcich não estava nada preparado para lidar com esta notícia.

“Os rins dela estavam a falhar. Não havia nada que os médicos pudessem fazer. Tiveram de a abater”, recorda.

Turcich ainda está a aprender a lidar com a perda, que parece o encerramento de um capítulo que ele já estava com dificuldades em deixar para trás.

“Ainda sinto um pouco de culpa”, admite. “Fiquei muito mal no primeiro mês. Ela era a minha melhor amiga, de certa forma.”

“Ela era o único ser que viveu comigo aquilo que eu vivi. Penso que muita da dor que eu sinto é… Passámos tanto tempo juntos e passámos por tanta coisa”, recorda.

Depois de ter assumido o papel de “protetor” de Savannah perante mau tempo e “locais estranhos” quando estavam em viagem, Turcich tem dificuldade em aceitar que não foi capaz de a proteger desta vez.

“Mas ela viveu uns ótimos nove anos. Estou grato por isso”, acrescenta, recordando como Savannah o motivou vezes sem conta durante aquela jornada.

Inicialmente, Turcich decidiu aceitar o desafio de viajar pelo mundo a pé depois de ler sobre Steven Newman, distinguido na lista dos Guinness World Records como a primeira pessoa a dar a volta ao mundo a pé, e sobre o aventureiro Karl Bushby, que tem vindo a caminhar o globo a pé desde 1998.

Turcich partiu nesta viagem no dia 2 de abril de 2015, pouco antes do seu 26.º aniversário, com apenas um carrinho de bebé com equipamento de caminhada, um saco-cama, um computador, uma câmara fotográfica e uma caixa de plástico que usava para guardar a comida.

Embora tenha embarcado nesta viagem sozinho, Turcich adotou Savannah, que era um bebé na altura, de um canil em Austin, Texas, durante a primeira etapa da sua viagem, de New Jersey ao Panamá.

Turcich explica que sentiu que ter um companheiro canino ao seu lado, que pudesse “estar atento” durante a noite, poderia fazer toda a diferença, o que veio a confirmar-se mais tarde.

Uma história de aventuras

Depois de ter sido o “protetor” de Savannah enquanto estiveram em viagem, Turcich tem tido dificuldade em aceitar que desta vez não a conseguiu proteger. Fotografia: Tom Turcich

Num dia normal, os dois caminhavam juntos entre 29 a 38 quilómetros.

Os requisitos do Guinness World Records para uma circum-navegação a pé são cerca de 30.000 quilómetros e quatro continentes - objetivos que Turcich conseguiu alcançar. 

Questionado se acredita que teria conseguido completar a viagem sem Savannah, Turcich afirma que não tem a certeza.

“Não teria sido tão bom”, diz. “Não teria sido tão divertido. Eu não teria sido capaz de aproveitar tantos momentos… Ela foi, sem dúvida, o ponto forte da caminhada. Não consigo imaginar-me a fazê-lo sem ela, em retrospectiva.”

Turcich escreveu um livro de memórias, The World Walk, sobre as suas experiências durante esta incrível viagem.

Embora o processo de escrita do livro, lançado este mês, tenha sido uma experiência catártica, Turcich diz que o seu principal objetivo era encorajar as pessoas a serem “um pouco mais curiosas sobre os lugares e um pouco mais confiantes no mundo” e, mais importante ainda, garantir uma leitura divertida.

“Queria tirar o meu ego do caminho e criar um livro que os leitores pudessem apreciar”, diz. “Contar apenas uma boa história de aventura sobre um homem e o seu cão a dar a volta ao mundo.”

Embora tenha visitado muitos países, há dois em particular a que Turcich diz estar muito ansioso por regressar - Turquia e Geórgia.

“Adoro esses dois países. E acho que ambas as capitais, Tbilisi e Istambul, são muito interessantes”, assume.

Turcich admite ter ficado muito impressionado com a “democracia jovem e vibrante” da Geórgia. “Sentimos que as pessoas se preocupam realmente com o seu país e isso dá-nos uma espécie de energia”, afirma. “Esta corrente que atravessa tudo e que não existe em todos os países”, acrescenta.

Quanto à Turquia, Turcich diz que adora o clima, a “confluência de todas as culturas” e a comida.

“A Bonnie nunca lá esteve”, explica. “E ela é uma grande fã de comida, por isso sei que ela iria gostar.”

A maior lição

O livro de memórias de Turcich, “The World Walk”, que será lançado a 7 de outubro, inclui uma mensagem especial para Savannah. Fotografia: Tom Turcich

Uma das maiores lições que Turcich diz ter retirado da sua aventura foi perceber “quão pequenos e inconsequentes” somos no grande plano das coisas.

“Acho que já o sabia na teoria”, diz. “Mas depois vamos lá para fora e vemos como o mundo é grande. E como estas forças realmente muito maiores do que a força de vontade e o desejo de qualquer pessoa afetam a vida de alguém.”

“O quanto a geografia e a cultura afetam a vida de uma pessoa. E como nos vemos refletidos em todos estes lugares diferentes e em todas estas pessoas diferentes, e percebemos que somos apenas uma pessoa entre todas estas pessoas”, observa.

Livro de memórias de Tom Turcich

Embora esteja entusiasmado por ter conquistado o título de décimo homem a dar a volta ao mundo a pé, Turcich sublinha que esse nunca foi realmente o seu objetivo.

“A World Walk nunca teve que ver com um recorde ou algo do género”, garante. “Foi puramente egoísta, no sentido de: 'Quero ir ver o mundo. Quero conhecer o mundo. Qual é a melhor forma de o fazer?’ E foi a andar”,explica

Desde que completou o desafio, há mais de dois anos, Turcich tem sido contactado por outras pessoas que esperam conseguir o mesmo feito.

“Eu digo sempre: 'Está bem, é uma ideia louca, mas se estiveres mesmo decidido a fazê-lo…’ Acho que dar a volta ao mundo, se realmente o quisermos fazer, é uma forma incrível de viver a vida. E estou muito, muito satisfeito por o ter feito. É uma ótima maneira de conhecer o mundo e de mudar”, afirma.

“Se tiveres esse fogo dentro de ti para o fazer, acho que é fantástico. [Mas] não é definitivamente para toda a gente”, acrescenta.

Turcich já fez algumas férias desde que regressou, incluindo visitas à Sicília e a Malta com Bonnie, e admite que ainda se está a habituar à ideia de ir a destinos por curtos períodos de tempo.

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