Há pessoas que ficam mais deprimidas no verão. Médicos explicam as razões e como se pode tratar

17 jul 2022, 22:00
Saúde mental

Transtorno Afetivo Sazonal é mais comum no inverno, mas também há quem sofra com a chegada do bom tempo. Três especialistas explicam as causas e os sintomas a que deve estar alerta se costuma ficar assim recorrentemente no verão

Verão e depressão parecem não combinar, mas para muitas pessoas a chegada desta estação do ano traz também tristeza e outras emoções menos positivas. Algumas estão a passar por uma depressão, outras sofrem do que se chama Transtorno Afetivo Sazonal (TAS),um problema que está relacionado  com a mudança de tempo e cujo diagnóstico nem sempre é fácil. Apesar de ser um problema mais comum no inverno do que no verão psicólogos e psiquiatras acreditam que o galopante aquecimento global fará com que cheguem mais pacientes ao consultório com esta patologia nos meses quentes do ano.

“Poderá ser cada vez mais evidente a manifestação deste problema no verão. Esta patologia tem a ver com uma questão climática, e por isso vamos começar a ver cada vez mais situações deste tipo”, explica o psicólogo Fernando Mesquita à CNN Portugal, lembrando que, no caso da depressão sazonal mais comum, no outono e inverno, a luz costuma ser o fator predominante de mal-estar. Já na depressão sazonal no verão, o maior problema é mesmo a temperatura.

“Por norma, o aumento da luminosidade e da temperatura melhora o humor, mas para alguns pode coincidir com férias, menos rotinas e uma menor agitação . Esta situação pode gerar menos energia, perda de interesse. Quando param e se confrontam com tempos mortos, ficam deprimidos”, adianta Daniela Nogueira, psicóloga clínica e psicoterapeuta.

As causas e os sintomas

Fernando Mesquita explica à CNN Portugal que quem apresenta este transtorno tem alguma suscetibilidade a quadros clínicos depressivos, sendo pessoas mais vulneráveis e com menor capacidade de socialização. O clínico diz que não há uma causa específica para o TAS e que até pode ser  genético.

“As pessoas que mais sofrem com este transtorno no verão são as que sentem alguma insatisfação com a autoimagem, têm pouca confiança. A partir da primavera e principalmente no verão, temos o corpo mais exposto e as outras pessoas também, o que faz com que haja uma comparação”, continua o especialista, que dá conta que estes fatores levam a que muitos tentem escapar aos eventos de verão, momento mais propício aos convívios.

A psiquiatra Maria Moreno, por seu lado, explica que entre os fatores que potenciam este transtorno está exatamente a vontade de as pessoas se isolarem. No entanto, acrescenta, esta doença é maioritariamente regulada por fatores genéticos.

“É muito importante investigar a presença de doenças mentais na família. Existe uma sobreposição muito importante deste transtorno com a doença bipolar. Sabemos, por exemplo, que entre 10 e 20% das pessoas com diagnóstico de depressão sazonal têm na verdade uma doença bipolar”, diz a psiquiatra, que garante que o diagnóstico correto é fundamental para um melhor tratamento.

Esta condição pode mesmo tornar-se incapacitante para alguns, que durante o inverno preparam as férias e, depois, querem cancelar. Fernando Mesquita diz mesmo que, muitas vezes, estes pacientes preparam as férias e no momento de as gozar, sentem-se mais em baixo, deprimidos.

“Os quadros depressivos vão-se instalando, não aparecem de um dia para o outro. As pessoas começam a isolar-se, a ficar mais tristes, com pensamentos destrutivos. Sentem uma tristeza profunda, choram com facilidade e têm alterações do sono ou até do apetite.”, continua o especialista.

Esta doença, que afeta maioritariamente jovens mulheres, prejudica a qualidade de vida, mas também a relação com os outros.

“O impacto na qualidade de vida pode ser mais de 20 vezes superior ao de outras doenças físicas. Na depressão existe uma distorção do mundo, de si e do futuro”, continua a especialista, adiantando que isolamento ou afastamento em relação ao companheiro/a, família e amigos são comuns e surgem desta incapacidade da pessoa de se sentir bem. 

Para Fernando Mesquita, quem sofre com o TAS não tem de justificar porque não gosta do verão ou se sente desconfortável com o calor e lembra que "devem ser respeitados".

“O que se tem de fazer é respeitar as necessidades dos outros. Não gostamos todos do mesmo, há quem não goste do verão”, sublinha.

A falta de tratamento

Se para o Transtorno Afetivo de inverno já existem tratamentos, como o de proporcionar que os doentes estejam mais tempo expostos à luz, para a patologia no verão não existem terapêuticas  específicas. Os especialistas aconselham a psicoterapia a nível da capacidade social e também da autoestima e, em alguns casos, o recurso a medicação. “É semelhante ao tratamento de uma depressão”, diz Fernando Mesquita.

Daniela Nogueira, professora de psicologia da Universidade da Maia e coordenadora do projeto aurora@covid19-eu explica que desde o início da pandemia que há mais pessoas a procurar ajuda no período do verão. “Há uma mudança. Não sabemos se se deve a um aumento da sensibilidade ou é a conjetura que faz com que as pessoas se sintam mais vulneráveis, mas há cada vez mais pacientes que nos procuram no verão”, explicou.

Muitos chegam às consultas sem saber o porquê de estarem tristes, descreve a psicóloga. “Não tenho razões para me sentir assim”, dizem, mas a verdade é que sentem.

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