Nomeou um cético das vacinas para dirigir o Departamento de Saúde e Serviços Humanos. Agora, a "Personalidade do Ano" da revista Time tem a sua própria visão
Quando publicou o seu artigo na revista The Lancet em 1998, o gastrenterologista Andrew Wakefield estava longe de imaginar que a associação falsa que fazia entre a administração de vacinas a crianças e o aumento de casos de autismo teria tanta repercussão.
25 anos depois, há quem continue a defender a teoria, ou pelo menos a deixá-la no ar, mesmo que o desmentido já tenha surgido de todas as maneiras possíveis.
Desta vez a dúvida foi levantada pelo presidente eleito dos Estados Unidos. Sim, Donald Trump afirmou que “a taxa de autismo está a um nível que ninguém achou ser possível”.
“Se olharmos para o que está a acontecer, há alguma coisa a causar isso”, reiterou em entrevista à revista Time, que o elegeu “Personalidade do Ano” pela segunda vez.
O futuro homem mais poderoso do mundo não estabeleceu uma relação direta entre as vacinas e o autismo, mas admitiu que a sua administração vai colocar em prática uma série de “testes sérios” para “saber o que é bom e o que não é bom” para as crianças.
É por isso que Donald Trump admite vir a alterar o programa de vacinação infantil nos Estados Unidos, antevendo uma “grande discussão” com o próximo diretor do Departamento de Saúde e de Serviços Humanos (HHS), Robert F. Kennedy Jr., figura conhecida por ser um cético em relação às vacinas, e que vai liderar a agência responsável pela aprovação de vacinas e pelas recomendações dadas às mesmas.
Um passado
Esta não é propriamente a primeira vez que Donald Trump faz uma ligação entre vacinas e autismo. Com efeito, o presidente eleito já tinha sugerido essa mesma possibilidade em 2007.
Na altura, e numa entrevista ao Sun Sentinel, o então apenas magnata do imobiliário referia que o autismo “não era um fator real” quando ele estava a crescer.
“E agora, de repente, é uma epidemia. Todos têm uma teoria. A minha, e eu estudo isto porque tenho filhos pequenos, é baseada nas vacinas. Damos estas injeções maciçamente de cada vez, e penso mesmo que isso faz alguma coisa às crianças”, afirmou.
Mas não foi só nove anos antes de ser presidente. Já quando tinha a Casa Branca na mira, em 2015, Donald Trump garantiu que nunca tinha levado uma vacina para a gripe. A razão era clara: “Não gusto da ideia de injetar coisas más no corpo, que é basicamente o que eles fazem”, disse, durante uma entrevista na rádio.
Declarações completamente esquecidas em 2021, quando já decorria a Operação Warp Speed, fundamental para combater a pandemia de covid-19 nos Estados Unidos. Na altura, Donald Trump chamou às vacinas “um dos maiores milagres em décadas”.
Estas declarações surgem 20 anos depois de o próprio Andrew Wakefield ter vindo admitir que o artigo original tinha dados “insuficientes” para provar a relação entre as duas coisas. Na altura, o médico admitiu ainda que tinha sido pago por famílias que acreditavam que as vacinas tinham feito mal aos seus filhos.
O caso tomou proporções tais que a própria The Lancet acabou por retirá-lo do seu repositório em 2010. À altura, o diretor da revista científica admitiu que as conclusões do estudo eram “absolutamente falsas”. Nesse mesmo ano Andrew Wakefield acabaria por perder a sua licença médica, com os reguladores britânicos a afirmarem que tinha atuado de forma “desonesta e irresponsável” na sua pesquisa.
A juntar a isso, e embora algumas teorias continuem a defender o artigo do antigo médico -sendo que o próprio também já não acredita na tese - vários estudos já esclareceram que as vacinas são seguras e que não há quaisquer ligações a casos de autismo.