Dormir mal diminui a eficácia das vacinas, sobretudo nos homens

CNN , Sandee LaMotte
19 mar 2023, 11:00
Sono

"Em geral, as mulheres têm uma resposta imunitária mais forte, incluindo à vacina da gripe"

Se estiver a marcar uma consulta para ser vacinado – seja para a covid-19, para a gripe ou para viajar para outro país – certifique-se de que tem uma longa e repousante noite de sono antes de ir ao médico.

Dormir menos de seis horas na noite anterior a receber a vacina pode limitar a resposta do seu corpo à vacina, reduzindo a proteção contra o vírus ou bactérias, revela um novo estudo.

"Dormir bem não só amplifica como também pode prolongar a duração da proteção da vacina", diz a autora Eve Van Cauter, professora emérita do Departamento de Medicina da Universidade de Chicago, em comunicado.

Mas houve um pormenor estranho nas conclusões do estudo: o impacto da falta de sono na resposta imunitária a uma vacina só foi cientificamente relevante nos homens.

"Investigações que utilizaram medidas objetivas de privação do sono, como um laboratório do sono, encontraram uma diminuição na capacidade de resposta à vacina que foi particularmente e estatisticamente relevante nos homens, mas não nas mulheres", disse o coautor do estudo, Michael Irwin, ilustre professor de Psiquiatria e Ciências Biocomportamentais na Escola de Medicina Geffen da UCLA.

Porque é que a imunidade de um homem seria afetada quando a de uma mulher não o era?

"Existem diferenças conhecidas entre os sexos na resposta imunitária a antigénios invasores, como os vírus, e também a antigénios próprios, como nas doenças autoimunes”, diz Phyllis Zee, professora de Neurologia e diretora do Centro de Medicina do Sono e Circadiana da Escola de Medicina Feinberg da Universidade de Northwestern.

"Em geral, as mulheres têm uma resposta imunitária mais forte, incluindo à vacina da gripe", sublinha Zee, que não esteve envolvida no estudo. "A ciência mostra que estas diferenças refletem diferenças hormonais, genéticas e ambientais, que podem mudar ao longo da vida, pelo que estas diferenças podem ser menos proeminentes entre os adultos mais velhos."

Independentemente do seu sexo, se estiver privado de sono, com jet lag, se trabalhar num turno da noite ou se tiver oscilações no seu ciclo do sono, considere adiar a vacinação, recomenda Irwin, que dirige o Centro Cousins da UCLA para Psiconeuroimunologia e Centro de Investigação e Compreensão da Mente.

"Se eu estivesse com pacientes para lhes dar uma vacina, perguntaria se estão a ter problemas com o sono e se dormiram mal na noite anterior", diz Irwin. "Se tivessem, pedir-lhes-ia que voltassem quando estivessem completamente descansados."

O que é um sono bom?

O corpo precisa de passar por quatro fases de sono várias vezes por noite. Durante a primeira e segunda fases, o nosso corpo começa a abrandar os seus ritmos. Ao fazê-lo, prepara-nos para a terceira fase - um sono profundo, de ondas lentas, onde o corpo se restaura a nível celular, reparando danos causados pelo desgaste do dia e consolidando memórias em armazenamento a longo prazo.

O sono de movimento rápido dos olhos, também chamado sono REM, é a fase final. Estudos demonstraram que falta de sono REM, que é também aquele em que sonhamos, pode levar a um défice de memória e a maus resultados cognitivos, bem como a doenças cardíacas e outras doenças crónicas e morte precoce.

Por outro lado, anos de investigação descobriram que o sono – e especialmente aquele profundo, o tipo com maior poder de cura – impulsiona a resposta imunitária.

A maioria dos adultos precisa de sete a oito horas de sono relativamente ininterrupto para conseguir um sono reparador, de acordo com os Centros de Controlo e Prevenção de Doenças norte-americanos. Dormir seis ou menos horas por noite – o que muitas pessoas fazem, especialmente durante uma semana de trabalho atarefada – pode causar uma série de problemas de saúde.

Investigação objetiva mostrou associação

O novo estudo, publicado segunda-feira na revista Current Biology, levou a cabo uma meta-análise sobre a investigação existente sobre o sono e a função imunológica após a vacinação contra a gripe A e a Hepatite A e B.

Quando apenas foram analisados estudos que utilizaram a duração do sono relatada pelos próprios, os anticorpos tinham diminuído em pessoas que tinham dormido menos de seis horas, mas a associação entre falta de sono e imunidade após a vacinação não foi cientificamente relevante.

No entanto, quando apenas os estudos que utilizavam medidas objetivas – tais como exigir que as pessoas viessem a um laboratório do sono, ou quando eram utilizados dispositivos que pudessem rastrear o sono com precisão – a associação mostrou-se "robusta", sobretudo nos homens, diz Irwin.

Uma explicação para a diferença entre os resultados da investigação objetiva e aquela com base nos relatos dos próprios é que as pessoas normalmente sobrestimam a quantidade de sono que têm todas as noites, diz o estudo.

As pessoas que dormiram menos de seis horas produziram menos anticorpos do que as pessoas que dormiram durante sete horas ou mais, mostrou a investigação. A redução da resposta imunitária afetou mais adultos entre os 18 e os 60 anos do que pessoas com mais de 65 anos.

Isso não foi surpreendente, diz o comunicado, porque "os adultos mais velhos tendem a dormir menos em geral, (portanto) passar de sete horas de sono por noite para menos de seis horas não é uma mudança tão grande como passar de oito horas para menos de seis horas".

A mesma resposta imunitária

O estudo não incluiu a análise da resposta de anticorpos às vacinas para a covid-19 porque ainda não existem estudos adequados sobre o sono em pessoas vacinadas contra a covid, diz Irwin. Mas o especialista acredita que os resultados também se aplicariam.

"A forma como estimulamos o sistema imunitário é a mesma quer estejamos a utilizar uma vacina mRNA para a covid-19, ou uma vacina contra a gripe, hepatite, tifoide ou pneumocócica", diz Irwin. "É uma resposta vacinal ou de anticorpos prototípica, e é por isso que acreditamos que podemos generalizar à covid".

A equipa fez uma análise que mostrou que, se uma pessoa chegasse para uma vacina para a covid-19 sem dormir adequadamente, a sua resposta de anticorpos à vacina seria enfraquecida pelo equivalente a dois meses - com base inteiramente na resposta inicial do seu corpo.

"Já teria perdido dois meses de imunidade, por assim dizer, apesar de ter acabado de receber a vacina", diz Irwin. "Se tiver uma resposta imunitária fraca, é menos provável que obtenha proteção total contra a covid".

São necessários mais estudos para detetar as nuances do impacto do défice de sono no sistema imunitário, diz Zee. Ainda assim, a informação sustenta a prática atual na sua clínica do sono.

"Eu já digo aos meus pacientes para dormirem regularmente para melhorar a sua função imunológica", diz ela. "Agora temos provas ainda mais fortes para dar este tipo de conselhos".

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