Naquele que é um dos momentos mais frágeis do Serviço Nacional de Saúde, é na ginecologia e obstetrícia que fica a nu um problema que já não é apenas sazonal, mas sim crónico e transversal a outras especialidades: faltam profissionais de saúde especializados, uma boa rede de cuidados de saúde primários, mas também organização. Quem esteve sempre com as portas abertas nestas semanas de verão fala em dificuldades e sacrifício, tem equipas exaustas e não sabe por quanto mais tempo consegue aguentar este ritmo
Maria do Céu Almeida é a voz do cansaço que as equipas de ginecologia e obstetrícia sentem um pouco por todo o país. Ao telefone, mostra urgência em dizer que é preciso reverter este cenário caótico, mas diz-se feliz por manter uma porta sempre aberta às grávidas e por se falar de “quem nunca fechou”. “Temos tido a felicidade de manter o serviço aberto”, conta-nos a diretora de obstetrícia da Maternidade Bissaya Barreto (MBB), uma das duas maternidades da Unidade Saúde Local de Coimbra e das poucas que não encerrou nos últimos meses.
“Tem sido muito desgastante e as equipas de médicos e de enfermeiros estão exaustas. Tenho equipas exaustas, que não aguentam por muito mais tempo. E o verão ainda não acabou”, lamenta Maria do Céu Almeida, lembrando que o encerramento rotativo de alguns serviços de urgência de ginecologia e obstetrícia vem já do ano passado.
A entrega de minutas de recusa à realização de mais horas extraordinárias para lá das 150 horas anuais impostas por lei entre setembro e dezembro do ano passado deixou a nu um problema que todos já conheciam e que ainda não se resolveu: a escassez de recursos humanos para completar as escalas de urgência e, por consequência, garantir o atendimento de casos emergentes e de toda a atividade programada, muitas vezes empurrada para o fundo das prioridades por não se ser capaz de dar vazão à carga de trabalho. “Tivemos muitos anos sem entrar pessoas, mas as que entram ainda não conseguem cobrir ou tapar aquelas que saíram, ainda temos um défice grande”, admite Maria do Céu Almeida, que não se coíbe de lançar o alerta: “Estamos mesmo numa situação muito complexa e explosiva”.
E o que tem falhado? “Muito” mais do que o desejado, sobretudo a nível de “falta de investimento”, atira a diretora de obstetrícia da Maternidade Bissaya Barreto, que descreve a situação nesta especialidade como “complexa”, porque “exige várias medidas e não medidas avulsas” que precisam de “tempo para que essas medidas se reflitam na realidade”.
“A obstetrícia tem uma atividade que não é muito programável, a resposta tem de ser nos timings corretos, aqui contam os nove meses. Tem de existir equipas estáveis, isto não é só fazer um parto, são nove meses de seguimento”, diz a médica, que aponta a falta de acesso aos cuidados de saúde primários - também eles a braços com um problema crónico de falta de médicos de medicina geral e familiar - como um dos grandes calcanhares de Aquiles do SNS e um dos gatilhos para o caos que se vive na obstetrícia.
As duas maternidades de Coimbra - a Bissaya Barreto e a Daniel Matos -, o Hospital São João e o Centro Materno-Infantil do Norte foram das unidades que estiveram sempre abertas e quem está no terreno não nos esconde o cansaço de todo um jogo de cintura diário para garantir não só o atendimento das grávidas que chegam ao hospital, mas também o bem-estar e o equilíbrio de quem cuida delas.
Elsa Calado, diretora do serviço de urgência da Ginecologia e Obstetrícia e chefe de equipa do serviço de urgência no Centro Hospitalar Universitário São João, tem as escalas “até ao final do ano” quase completas. “Falta alguns ajustes”, diz-nos. Com “quatro elementos fixos” na equipa de urgência, a especialista diz que o segredo está na “antecipação”. “Mesmo em termos de vida pessoal, antecipar o trabalho para todos os colegas, a coordenação, é o segredo”, conta-nos, embora reconheça que há dificuldades e ainda aspetos a melhorar para fazer face aos recursos escassos.
“Todos nós temos essa noção, de que aqui estamos satisfatoriamente bem. Há falhas, há pessoas que ficam doentes, os recursos humanos são muito limitados. Há, de facto, algum desânimo, mas pelo que se passa fora”, admite Elsa Calado.
É quem já não deveria fazer urgências que mantém as portas abertas em Coimbra
Nos primeiros 20 dias de agosto, os hospitais de Coimbra realizaram 75 partos de grávidas da região de Leiria, mas a viagem de quase 80 quilómetros foi já recorrente no final do ano passado. “Não temos só grávidas em trabalho de parto, temos também os episódios de urgência e isso aumentou bastante e a urgência tem estado muito cheia”, adianta-se Maria do Céu Almeida.
Na primeira quinzena de agosto, foram atendidos 1.513 episódios nas urgências de obstetrícia e ginecologia, 88 por dia, a maior parte (54%) de grávidas fora da região. “Recebemos também muito [grávidas] de Santarém, das Caldas [da Rainha], de Abrantes e até mais a sul, pontualmente, mas fomos recebendo de todo o lado”, continua a diretora de obstetrícia da Maternidade Bissaya Barreto (MBB).
A grande afluência às urgências (independentemente da especialidade) tem sido um dos temas mais debatidos dentro dos vários governos, mas nem mesmo a criação de uma linha de apoio à grávida parace ter melhorado a situação. Pelo contrário, sentem-se confusas. Paulo Moura acredita que “as grávidas recorrem muito à urgência” porque “sentem-se frágeis, inseguras”. “Compreendo que se sintam assim, não se pode estar a dizer que é um uso abusivo ou distorcido da urgência, mas as pessoas sentem-se inseguras e com dificuldade de acesso [a cuidados de saúde]. É fácil para quem está dentro do sistema saber o que é uma urgência ou não é, mas quem não está não sabe”, diz o médico, que critica que todo o processo de acesso, seja para urgência ou parto, seja, neste momento, um momento de stress para as grávidas.
“Uma grávida não sabe quantos quilómetros vai fazer e em que terra vai ter [o bebé]. Isto é uma angústia tremenda, mas a nossa obrigação é manter isto aberto e receber as grávidas venham de onde vierem”, vinca Paulo Moura.
O diretor de Obstetrícia da Maternidade Daniel Matos - que diz que o funcionamento da especialidade em Coimbra poderia ser ainda mais eficaz se as duas maternidades já estivessem fundidas “num serviço em conjunto” - lamenta o estado a que a situação da ginecologia e obstetrícia chegou, mas mantém-se otimista. “Espero que venham dias melhores e haja possibilidade dos quadros se recomporem, é preciso planear e que se defina uma rede de referenciação de hospitais para que haja estabilidade”.
Nas duas maternidades de Coimbra a motivação das equipas trabalha-se pelo sentimento de “dever”, de “responsabilidade” em relação à zona centro por serem “um hospital de fim de linha”, recebendo pacientes de “Aveiro, Viseu, Guarda, Castelo Branco, Covilhã e Leiria”, como enumera Paulo Moura. Porém, o médico sabe que o cenário atual é o principal entrave para que as equipas se mantenham motivadas, por muito empenhadas que estejam em fazer a diferença. E isso, confidencia, deixa-o “preocupado”.
“É difícil fazer as escalas [de urgência], as pessoas estão cansadas, o trabalho aumenta com o encerramento dos outros hospitais”, adianta Paulo Moura, diretor do serviço de Obstetrícia da Maternidade Daniel Matos, também em Coimbra. Ainda assim, destaca o espírito de sacrifício da sua equipa: “dois terços dos médicos [das maternidades da ULS Coimbra] têm 60 anos ou mais, mas fazem horas noturnas, já não é obrigação deles, mas fazem, sabem que somos [uma maternidade] de retaguarda” e, para muitas grávidas, o único recurso.
“É difícil, é evidente que isto não deveria ser só correr atrás destas situações, isto quebra horizontes, não é muito motivador para os profissionais, isso é o que me preocupa, as pessoas gostam de ter projetos, investigar, e esta pressão constante da escala de urgência não é muito atrativa para fixar os profissionais. Tudo o que se ouve na obstetrícia não é muito motivador para os jovens profissionais, isso é o que preocupa mais, o tudo se resumir a esta questão”, lamenta o médico.
Porto volta a dar cartas na antecipação
Já não é a primeira vez que o Hospital São João é visto como referência no que toca ao planeamento e à capacidade de (quase) sair ileso dos cenários de caos. Ainda antes de o Executivo ter apresentado o plano de verão, já esta unidade tinha tudo planeado para a estação que agora se vive - e até se mostrou disponível para receber grávidas de todas as partes do país. E até antes de chegar o inverno, já há um plano de contingência desenhado e escalas de urgência feitas.
“As coisas estão muito pensadas e são estruturadas, e são antecipadas as dificuldades. Em cada área que nós consideramos que [a atividade] tem de ser assegurada, temos pessoas, temos uma equipa a trabalhar nisto”, destaca Elisabete Barbosa, diretora clínica dos cuidados hospitalares da ULS São João, que diz mesmo que “grande parte dos sucessos aqui no Norte é que nós funcionamos muito com urgências metropolitanas”. “Nós temos especialidades como urologia, oftalmologia, otorrino, psiquiatria, em que já temos urgências metropolitanas com vários esquemas distintos, não há um nível único e universal, mas modelos partilhados, temos profissionais que se deslocam aos nossos hospitais, o que nos permite, de facto, ter sempre uma resposta assegurada para os utentes”, continua Elisabete Barbosa, que falou com a CNN Portugal por vídeochamada em simultâneo com Elsa Calado. Este modelo metropolitano vai agora ser aplicado nos serviços de Obstetrícia em Lisboa e Vale do Tejo e na península de Setúbal, como foi esta quarta-feira anunciado pela ministra da Saúde, Ana Paula Martins.
Embora reconheça que “as realidades no país são distintas”, a clínica dos cuidados hospitalares da ULS São João destaca que se trata de “um hospital de primeira linha e, portanto, tem necessariamente de se preparar para quando não há resposta”, mesmo que isso implique ser mais rápido que as recomendações da Tutela. “E nós conseguirmos responder”, vinca, dizendo que tal apenas tem vindo a ser possível graças “à antecipação e ao planeamento”. “Com a experiência do final do ano anterior, cada vez temos mais diálogo entre os vários serviços do Norte e conseguimos resolver estes problemas”, diz, em tom de concordância, Elsa Calado.
Este verão, “30% a 40%” dos partos realizados no São João foram de grávidas fora do Porto, diz a diretora do serviço de urgência da Ginecologia e Obstetrícia e chefe de equipa do serviço de urgência do São João, frisando que tal não aconteceu tanto por encerramentos de unidades à volta, mas sim porque há grávidas que “escolhem” o São João, como acontece com as de Penafiel, uma tendência que vem já do final do ano passado. “Vinham de bom grado e notou-se mesmo até que estavam felizes, estavam bem e tivemos um feedback muito bom, para nós foi muito bom. Claro, não quero que se repita, não só por condições físicas mas também por recursos humanos, que ainda são sempre muito, muito limitados, mas foi uma experiência muito positiva, confesso”, continua.
A questão dos recursos humanos é também levantada pela diretora clínica dos cuidados hospitalares da ULS São João. Elisabete Barbosa apressa-se a dizer que, mesmo estando o São João numa situação confortável a nível de carga de trabalho, “as dificuldades e a falta de recursos humanos são transversais a todos os hospitais, não é? E não estamos a falar só de médicos, que também tem a equipa de enfermagem e também assistentes operacionais de tudo”.
Ainda assim, as médicas do São João mantêm-se otimistas, motivadas e com vontade de motivar. “Eu sou uma pessoa motivada por natureza e otimista. Eu acordo de manhã com vontade de ir trabalhar. O facto de nós estarmos motivados, conseguimos motivar a equipa”, diz a diretora clínica dos cuidados hospitalares e, em tom de concordância, a diretora do serviço de urgência da ginecologia e obstetrícia: “Eu nunca gostei tanto de vir trabalhar como agora. E o que me motiva é mesmo ter consciência de que estamos a fazer cada vez melhor. E cada vez melhor e partindo já de um nível bom”.
“Os médicos e os profissionais não se motivam só por questões monetárias, motivam-se por projetos, por melhorarmos as condições, por criarmos condições para formação, para investigação e isso é muito importante para termos as equipas motivadas e alinhadas com aquela que é a visão da instituição”, vinca Elisabete Barbosa.
O Centro Materno-Infantil do Norte (CMIN), que faz parte da Unidade Local de Saúde de Santo António, também recebeu grávidas de Leiria e, em apenas 15 dias, nasceram 14 bebés de mães daquela região, seis dos quais por cesariana, como noticiou o Jornal de Notícias. Apesar do trabalho extra, Rosa Zulmira, diretora do serviço de ginecologia do CMIN, diz que não houve reforço de pessoal, mas, em declarações ao jornal, deixa claro que é preciso mudar este ‘modus operandi’: “Eu espero que isto [fecho de urgências] seja resolvido atempadamente, com a segurança e a qualidade que a gravidez exige, e que estes quilómetros não tenham de ser novamente galgados para se ter um filho”.
Alberto Caldas Afonso, diretor do Centro Materno-Infantil do Norte e presidente da comissão que vai reorganizar as urgências obstétricas, fala-nos na importância do planeamento atempado, revelando que também já tem as escalas feitas até ao final do ano e garante que há sempre o cuidado de “preservar” a vontade das pessoas, destacando que os colegas “assumem” o trabalho uns dos outros para que todos possam ir de férias. “Há uma relação de compromisso que é respeitada”. Além disso, o facto de esta unidade não necessitar de prestadores de serviço ajuda a que haja “estabilidade”, algo que diz que não resulta em muitos hospitais que ficam dependentes destes trabalhadores externos que, “por não terem um vínculo” ao hospital, acabam por não estar sempre presentes, o que “torna muito difícil” assegurar as escalas.
No entanto, Caldas Afonso diz que “obviamente que há cansaço” dentro da sua equipa, mas apressa-se a dizer que “estamos reajustar com as folgas, temos de gerir isso”, até porque “a existência de cansaço, a partir do momento que coloca em causa o desempenho, não pode existir”.
Coimbra e Porto têm escapado às recusas a mais horas extra. "Mas é só entregar a primeira" que o cenário muda
Nem na Maternidade Bissaya Barreto nem na Maternidade Daniel Matos - que, no total, têm oito elementos fixos na equipa de urgência, quatro em cada unidade - houve pedidos de recusa à realização de mais horas extraordinárias do que as contempladas por lei.
“Temos conseguido manter a equipa sem recusas [às horas extra], apesar do extremo cansaço”, afirma Maria do Céu Almeida, embora admita que “de um momento para o outro [a urgência] pode atingir a rutura”. E isto porque, volta a dizer, “tanto médicos, como enfermeiros e assistente operacionais, tão todos muito exaustos, cansados, são muitas horas extra para assegurar os serviços de urgência”, um esforço que, por consequência, deixa outras atividades desfalcadas.
“Isto repercute-se na atividade assistencial, na consulta, na ecografia. As pessoas que fazem noite têm de folgar. É difícil manter a consulta e as ecografias, é um trabalho diário. A urgência torna-se muito exigente e absorvente, exige muitos recursos humanos”, acrescenta Paulo Morais. “Não podemos fazer mais”, adverte o médico. Também Maria do Céu Almeida diz que “é muito difícil gerir tudo, o serviço de urgência em obstetrícia é uma parte importante da atividade assistencial dos médicos, mas temos toda uma outra parte assistencial não urgente que fica prejudicada por causa da urgência”.
Em Coimbra, apesar de as duas maternidades não estarem “dependentes de prestadores de serviço”, o que, segundo Maria do Céu Almeida, “traz grande estabilidade”, a verdade é que se não fosse o esforço dos mais velhos, possivelmente Coimbra entraria para a lista dos encerramentos. “Se [os médicos com mais de 60 anos] não fizessem urgência já tínhamos fechado”, alerta a diretora de obstetrícia da Maternidade Bissaya Barreto, que revela “dificuldades” em contratar. “Temos tido abertura para poder reforçar o quadro, é atrativo estar nuns serviços, noutros não. E as pessoas gostam mais de ginecologia do que de obstetrícia”.
O Centro Materno-Infantil do Norte também não recebeu qualquer recusa a mais horas extra, diz-nos Caldas Afonso, destacando que “o que é importante é que as pessoas se sintam envolvidas, que haja bom ambiente” para que queiram manter-se nas equipas e fazer esforços uns pelos outros.
“O grande desafio é fixar os profissionais de saúde no SNS. E é nisso que estamos a trabalhar, as pessoas têm de se sentir felizes, senão não vão lutar. Mas temos de atuar de maneira rápida, não pode acontecer no próximo ano o que temos assistido [este ano]. Nenhum de nós é suficientemente rico para poder prescindir de um SNS, em qualquer momento da vida precisamos de um SNS forte”, atira Alberto Caldas Afonso, diretor do Centro Materno-Infantil do Norte.
No São João “já houve essa manifestação”, revela Elisabete Barbosa, sem adiantar quantos médicos e enfermeiros o fizeram. Mas, mesmo sabendo que os profissionais estão “motivados” - e que há a indicação da tutela para uma “incremento da remuneração” para blocos de mais de 40 horas -, a diretora clínica dos cuidados hospitalares da ULS São João admite que a entrega de minutas de recusa a mais horas extra “é um risco” e “temos que pensar que isso pode acontecer”.
Elevada carga de trabalho leva a demissão na MAC
Os constrangimentos nos serviços de urgência Ginecologia e Obstetrícia não são apenas sazonais, são já crónicos, alertam os especialistas, que se apressam a lembrar - ou a mostrar que não esquecem - o caos vivido no final do ano passado e que se foi alastrando pelos primeiros meses de 2024 até se chegar a mais um verão caótico.
O verniz estalou logo em outubro e o cenário agravou-se na altura das festividades, com a região de Lisboa e Vale do Tejo a ser a mais afetada e a Maternidade Alfredo da Costa das poucas de portas abertas, o que acabou também por acontecer neste verão nesta região. Só nesta maternidade lisboeta foram feitos uma média de 95 partos por semana durante o mês de agosto, correspondendo a um crescimento de 22,7% face ao período homólogo de 2023. Por ser uma porta sempre aberta em Lisboa, a MAC tem registado uma média semanal de 442 atendimentos na urgência em agosto, acima da média de julho (320), e uma média de 13 partos por dia, 15 ao fim de semana (11 partos, em média, no mês homólogo de 2023).
A pressão nos serviços de ginecologia e obstetrícia da MAC levou mesmo a que o coordenador Carlos Marques apresentasse a demissão devido à elevada sobrecarga de trabalho. À Lusa, Rosa Valente de Matos, presidente da ULS São José, tinha alertado que o "grande esforço" que os profissionais da MAC estavam a fazer não seria possível manter por muito mais tempo, lembrando que só no dia 12 - quando encerraram cinco urgências de Ginecologia e Obstetrícia - a maternidade tinha realizado 25 partos, o número mais alto desde 2013, ano em que num dia de janeiro se registaram 22 partos.
A pressão é, porém, transversal a quem esteve sempre de portas abertas, um trabalho que aumenta, mas cuja quantidade de mão-de-obra não acompanha. “Tivemos até 2022 uma diminuição progressiva da taxa de nascimentos, a taxa de natalidade foi diminuindo e fomos ficando mais maduros em termos de quadros, agora [a natalidade] tem aumentado, e cada vez mais, mas não aumentam as equipas, nem as camas nas enfermarias”, afirma Maria do Céu Almeida.
Os encerramentos alternados dos serviços de urgência e maternidades transitaram de 2023 para 2024 e têm vindo a ser a aposta, mas também um gatilho para um maior estado de stress e ansiedade das grávidas, que passaram a ter de ligar para uma linha de apoio no SNS24 para saber onde teriam vaga para serem atendidas em caso de urgência ou parto. E já não são raras as vezes em que a sala de partos é, na verdade, uma ambulância: este ano, já nasceram 41 bebés em viagens de ambulância a caminho dos hospitais, mais de metade no verão.