"Há agentes de influência russa infiltrados" em ONG que apoiam refugiados. CNN Portugal teve acesso à queixa feita por ucranianos às secretas

29 abr 2022, 15:06

Numa informação enviada à secretária-geral do Serviço de Informações de República Portuguesa, representante dos ucranianos avisa que "há agentes de influência russos infiltrados em Portugal", podendo colocar em causa a segurança de quem foge da guerra e das famílias que ficaram na Ucrânia a lutar contra a Rússia

A Associação dos Ucranianos em Portugal garante que há, neste momento, neste país, infiltrados pró-Putin em Organizações Não Governamentais (ONG) que apoiam os ucranianos, e já alertou as secretas portuguesas.

Numa carta enviada no dia 2 de abril, à secretária-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), Graça Mira Gomes, a que a CNN Portugal teve acesso, o presidente daquela associação explica que a situação “é muito grave e pode pôr em causa a segurança dos ucranianos refugiados de guerra que vão chegando a Portugal, dos familiares deles na Ucrânia e a segurança da Ucrânia em tempos de invasão russa”.

Segundo refere o presidente daquela associação de ucranianos, no documento que enviou ao SIRP, em causa estão “organizações diretamente ligadas à embaixada da Rússia”, apesar de “nos estatutos” aparecerem como “multiculturais” e que são vistas como representantes dos ucranianos. “Alguns meses antes da invasão russa ao território ucraniano, estas organizações, de repente, limparam toda a informação que mostrava ligação com a embaixada da Rússia em Portugal nas suas páginas web e redes sociais”, explica, acrescentando que, para “agravar”, estas organizações em Portugal são reconhecidas pelo Alto Comissariado dos Migrações (ACM).

A Associação de Ucranianos em Portugal acusa ainda o Alto Comissariado para as Migrações de recomendar aos refugiados ucranianos que chegam a Portugal que procurem auxílio nestas organizações ligadas à Embaixada da Rússia, acabando por continuar a ser “alvos de agentes russos”, mesmo estando em fuga “da agressão russa na Ucrânia”. Segundo o documento, o papel destas organizações passa por influenciar a comunidade ucraniana e “desinformar a sociedade portuguesa”, acerca da realidade social e política na Ucrânia, de forma a convencer o ocidente de que a Ucrânia faz parte do território russo.

“O principal papel político destas organizações e destes agentes de influência russos infiltrados em Portugal é o de influenciar a comunidade ucraniana, desinformar a sociedade portuguesa e ocidental sobre a história da Ucrânia, da realidade social e política na Ucrânia, convencer os países ocidentais, que o território da Ucrânia sempre pertenceu à Rússia e que o povo ucraniano é tão só uma parte integrante e étnica dentro da nação russa”, pode ler-se na queixa enviada à embaixadora Graça Mira Gomes.

A associação acusa ainda as organizações, alegadamente “reconhecidas pelo Alto Comissariado dos Migrações”, de terem tentado “limpar toda a informação” que mostrava as suas ligações oficiais à embaixada da Rússia em Portugal. A Associação dos Ucranianos em Portugal e a Embaixada da Ucrânia em Portugal garantem ainda ter tentado alertar “por várias vezes” o ACM e os respetivos Secretários de Estado sobre a “comunidade ucraniana em Portugal estar representada pelas associações que fazem parte das instituições de propaganda russa”.

O presidente da Associação questiona também o Alto Comissariado para as Migrações acerca dos apoios recebidos por grupos que “falaram mal” da Ucrânia e que agora recebem dinheiro que era destinado a ajudar as pessoas desse país.

“Estamos a receber inúmeros alertas da comunidade ucraniana em Portugal que estas organizações de repente mudaram, aparentemente apenas, de cor política e começaram a receber apoios dos portugueses para a Ucrânia. Os ucranianos em Portugal estão a perguntar: Os que sempre eram pró-Putin, que falaram mal da nossa pátria, agora estão a receber apoios, que tem como destino a Ucrânia?”, questiona a Associação dos Ucranianos em Portugal.

Seis organizações não são reconhecidas pela Ucrânia

À CNN Portugal, no dia 6 de abril, Pavlo Sadokha garantiu que das oito associações que constituem o colégio eleitoral da comunidade ucraniana em Portugal junto do Alto Comissariado para as Migrações (ACM), “só duas é que são reconhecidas pela embaixada da Ucrânia em Portugal”. As outras, disse,  ainda que sejam reconhecidas pelo órgão do Governo, têm ligações com “redes internacionais de propaganda e desinformação, nomeadamente a agência Rossotrudnichestvo e a fundação Russki Mir” . 

A agência Rossotrudnichestvo é um órgão de divulgação da cultura russa a nível mundial e em Portugal organiza, por exemplo, ações dedicadas à aprendizagem do cirílico e dá, juntamente com a Embaixada da Federação, bolsas de estudo a quem queira estudar em universidades russas. Funciona sob jurisdição do ministro dos Negócios Estrangeiros de Putin, Sergey Lavrov, que tem consistentemente afirmado que a Rússia está a conduzir uma “operação militar especial”, não uma invasão, para “desmilitarizar e desnazificar a Ucrânia”. Já a fundação Russkiy Mir, criada por Vladimir Putin em 2007, tem estado presente em Portugal pelo menos desde 2011 e foi responsável pela abertura do Centro de Estudos Russos na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. 

“Nós sabemos que existem estas agências que um ano antes do início da anexação da Crimeia têm feito um papel de desinformar o mundo sobre a política da Rússia contra a Ucrânia. Especialmente preparando a atual invasão russa”, afirmou ainda Sadhoka à CNN Portugal, acrescentando que a Associação de Ucranianos em Portugal tem “medo de que os refugiados que venham de zonas de conflito, com trauma e fragilidades, possam ser alvos fáceis destas organizações para lhes dar informação estratégica e vital da resistência ucraniana e depois transmitir ao Kremlin”.

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