China alinha com a Rússia: parceria “sólida como uma rocha”

8 mar 2022, 05:10
O presidente da China, Xi Jinping, e o presidente da Rússia, Vladimir Putin. (Greg Baker/Pool Photo via AP, File)

Ministro dos Negócios Estrangeiros da China reafirma “amizade sem limites” entre a China e a Rússia, e aponta todas as críticas aos Estados Unidos e à NATO

Ao fim de duas semanas de retórica ambígua, dando uma no cravo e outra na ferradura, nas últimas horas a China colocou-se do lado da Rússia, contra os EUA e a NATO. Em declarações aos jornalistas à margem da sessão do Congresso Nacional Popular da China, o responsável pela diplomacia chinesa, Wang yi, reafirmou a “amizade sem lilmites” entre os dois países e garantiu que parceria entre Pequim e Moscovo está “sólida como uma rocha”, sem “interferências de terceiros”.

As “interferências de terceiros” serão uma referência à forma como os EUA e diversos países ocidentais têm insistido para que a China condene a invasão da Ucrânia e se demarque da violação do direito internacional promovida por Vladimir Putin. Em vez disso, a China optou por se colocar do lado da Rússia e declarar ao mundo a aliança entre os dois países.

“Como membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, China e Rússia são os mais importantes vizinhos próximos e parceiros estratégicos um do outro. Os laços China-Rússia são uma das relações bilaterais mais cruciais do mundo, e nossa cooperação não só traz benefícios e bem-estar aos nossos povos, mas também contribui para a paz mundial, estabilidade e desenvolvimento", disse o responsável pela diplomacia chinesa. 

“Apesar da situação internacional ser precária e desafiadora, a China e a Rússia vão manter o seu foco estratégico e avançar firmemente na nossa ampla parceria estratégica coordenada, para uma nova era”, afirmou Wang, recuperando a linguagem da declaração conjunta emitida por Xi Jinping e Vladimir Putin quando ambos se encontraram em Pequim, no início dos Jogos Olímpicos de Inverno, numa altura em que as tropas russas já se concentravam na fronteira com a Ucrânia.

Nessa altura, enquanto os dois líderes declaravam uma “amizade sem limites”, os EUA avisavam a China para os planos de invasão da Ucrânia, pedindo a Pequim que travasse a agressão russa. Segundo informação divulgada entretanto pelo New York Times, a China não só nada fez para travar a agressão, como até partilhou com a Rússia a informação que tinha recebido dos serviços secretos dos EUA.

 

Ataque à NATO e aos EUA

 

Ao mesmo tempo que reafirmou a “amizade eterna” entre a China e a Rússia, o principal diplomata chinês atacou os EUA e a NATO, acusando a Administração Biden de estar a tentar estabelecer uma versão da NATO no Indo-Pacífico. 

"O verdadeiro objectivo da estratégia dos EUA para o Indo-Pacífico é estabelecer uma versão da NATO no Indo-Pacífico", disse, acrescentando que a China tinha "todo o direito" de fazer o que fosse necessário para defender os seus próprios interesses.E reiterou a “mensagem inequívoca de que a China e a Rússia estão juntas na oposição às tentativas de reavivar o espírito da Guerra Fria”.

A acusação do MNE chinês terá a ver com o QUAD, fórum quadrilateral de segurança que junta as quatro maiores democracias do Indo-Pacífico, EUA, Japão, Austrália e Índia. Ao mesmo tempo que se tem focado na situação no Leste da Europa, a atual administração norte-americana tem promovido bastante o QUAD, numa tentativa de cerrar fileiras face ao crescimento da influência chinesa nesta área do globo.

 

Mediador pró-russo?

 

O alinhamento chinês com a Rússia surgiu num momento em que Pequim se volta a posicionar como possível mediador do conflito no Leste da Europa. Após conversações por telefone entre o chefe da diplomacia chinesa e o seu homólogo ucraniano, na semana passada, a Ucrânia confiou que Pequim ajudaria a travar a guerra, tendo em conta os seus apelos à paz e à capacidade de pressão que a China tem sobre Putin.

Poucas horas depois de Wang Yi se ter colocado do mesmo lado da barricada que a Rússia, o representante permanente da China nas Nações Unidas lamentou o número cada vez maior de vítimas civis neste conflito e defendeu que a segurança dos mais fracos implica que sejam permitidos corredores seguros para passagem de auxílio médico. E adiantou que a Cruz Vermelha chinesa está disponível para ir para o terreno.

Por outro lado, na mesma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU, que decorreu na noite passada em Nova Iorque, o embaixador chinês repetiu que a China está “profundamente preocupada” com aquilo a que chama “sanções unilaterais à Rússia”.

A China já por duas vezes se absteve em votações da ONU, incluindo uma resolução do Conselho de Segurança que condena a invasão e um apelo à Rússia para que retire as suas tropas da Ucrânia. Apesar de por uma vez Wang Yi se ter referido ao conflito como “guerra”, Pequim evita esta palavra, e opta normalmente pela expressão vaga “situação na Ucrânia” - foi essa, outra vez, a formulação utilizada na longa conferência de imprensa desta segunda-feira.

 

Taiwan é diferente da Ucrânia

 

A ambiguidade da China desde o início deste conflito traduz-se, por um lado, na recusa em condenar a Rússia, afirmando que compreende as preocupações de Moscovo face ao alargamento da NATO para o Leste, e, por outro lado, na defesa da soberania territorial e da intangibilidade das fronteiras. Esta preocupação com a manutenção das fronteiras reconhecidas internacionalmente relaciona-se com a questão de Taiwan, a ilha que tem auto-governo desde 1949, mas que continua a ser reconhecida como território chinês. 

Xi Jinping tem defendido a reintegração de Taiwan na China, ainda que seja pela força, e o ataque da Rússia à Ucrânia tem sido visto como um possível ensaio de uma ação militar chinesa em relação à ilha rebelde.

O governo de Taiwan tem alertado para esse paralelismo, e afirmou esta semana que a resistência da Ucrânia tem sido uma inspiração. Mas, apesar destes paralelismos, o MNE chinês recusou esta segunda-feira que as situações sejam comparáveis.

A questão de Taiwan, disse Wang, é muito diferente da situação da Ucrânia, pois Taiwan é um "assunto puramente interno", e não um conflito entre dois países. O ministro dos Negócios Estrangeiros da China aproveitou para apontar o dedo ao "flagrante duplo padrão, caso alguns respeitarem a soberania da Ucrânia mas prejudicarem repetidamente a soberania da China sobre Taiwan".

Uma acusação direta para os Estados Unidos, que são o principal aliado diplomático, económico e militar de Taipé. Segundo o governante chinês, "certas entidades" nos EUA estão a empurrar Taiwan para o perigo, com o objetivo de utilizar a ilha para travar a ascensão da China. Uma estratégia que terá “consequências insuportáveis” para os EUA, prometeu Wang.

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