Vice-ministro da Agricultura da Ucrânia avisa que se os ocupantes russos continuarem a desviar cereais das regiões ocupadas poderá haver uma situação de fome
Os ocupantes russos já exportaram um total de cerca de 400 mil toneladas de cereais das quatro regiões que controlam na Ucrânia - ou seja, um terço de todos os cereais armazenados nessas regiões.
A denuncia foi feita pelo vice-ministro da Política Agrária e Alimentação da Ucrânia, Taras Vysotsky, em entrevista à Espresso TV, na terça-feira à noite.
De acordo com as declarações do governante, havia cerca de 1,3 milhões de toneladas de cereais nas quatro regiões administrativas cujo controlo foi entretanto assumido à força pelos militares russos: Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporizhia. Deste total, 400 mil toneladas já foram desviadas para fora da Ucrânia.
Não se trata de reservas estratégicas, explicou o governante ("Não havia ali reservas estratégicas"), mas de stock para consumo da população local. "Estes são, antes de mais, necessários para garantir a segurança alimentar diária, ou seja, a nutrição dos ucranianos que lá vivem, e o trabalho de campo necessário em termos de culturas de primavera", explicou o vice-ministro.
"Já temos confirmação de cada região - a região de Zaporizhia, a região de Kherson, Donetsk e Lugansk - cerca de 100 mil [toneladas de cereais] foram retiradas de cada uma", disse Vysotsky.
Na mesma entrevista, o vice-ministro responsável pela agricultura deixou ainda um alerta: se os russos continuarem a exportar cereais destas regiões, e se começarem a desviar o que resta para a alimentação das populações antes da nova colheita, pode haver uma ameaça de fome.
"O objetivo é o Holodomor"
Ontem, o chefe da administração militar regional de Lugansk, Serhiy Haidai, disse que os ocupantes têm como objetivo provocar uma grande fome na região. "O objetivo é o Holodomor", escreveu o responsável ucraniano na rede social Telegram, acusando as forças russas de terem bombardeado infraestruturas agrícolas.
O desvio de grandes quantidades de cereais da Ucrânia por parte de forças russas traz à memória um dos episódios mais traumáticos da história dos dois países no tempo da União Soviética: a Grande Fome dos anos 30 do século passado, que ficou conhecida como Holodomor (que se pode traduzir como “matar pela fome”). Tratou-se do confisco ordenado por Stalin de boa parte da produção cerealífera da Ucrânia, e a repressão dos agricultores daquela república da então URSS.
Em resultado, morreu uma enorme quantidade de ucranianos, naquilo que alguns estudiosos consideram ter sido um genocídio planeado pelo Kremlin, apostado em “dar uma lição aos camponeses” e eliminar os nacionalistas ucranianos. Há estimativas muitos díspares para a quantidade de vítimas do Holodomor, variando entre cerca de 4 milhões ou 12 milhões de mortes.