Letra Z nos tanques russos: o que pode significar e como se tornou um símbolo a favor da guerra

CNN , Eliza Mackintosh
8 mar 2022, 11:38
Soldados fardados sem insígnias são vistos ao lado de um carro de combate com o símbolo “Z” pintado de lado, na vila de Bugas, controlada pelos separatistas, na região de Donetsk, na Ucrânia.

No final de fevereiro, dias antes de as forças russas lançarem uma invasão total à Ucrânia, começaram a circular nas redes sociais vídeos e fotos que mostravam carros de combate, camiões de comunicações e lança-rockets, todos marcados com a letra “Z”, a dirigirem-se para a fronteira.

Investigadores digitais especularam sobre o que o “Z”, escrito no alfabeto romano e não no cirílico, poderia indicar sobre os movimentos seguintes de Moscovo.

Especialistas militares interpretaram o “Z” como “Za pobedy”, russo para “vitória”, ou como “Zapad”, para “Ocidente”. Alguns apelidaram os veículos pintados com o símbolo de “Esquadrão Zorro”, enquanto outros sugeriram que o “Z” poderia representar o denominado “alvo número um” do Kremlin, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky.

Um carro de combate com um “Z” pintado, numa área de Donetsk controlada pelos separatistas.

Aric Toler, um investigador da Bellingcat, - uma operação de investigação em código aberto que tem vigiado as operações militares russas desde que Moscovo fomentou a guerra no leste da Ucrânia, há oito anos, - disse a 20 de fevereiro que o grupo não fazia ideia do que significava o símbolo ”Z” e nunca o tinha visto ser usado. “Portanto, presumam o pior, acho/receio”, escreveu ele no Twitter.

Rob Lee, um especialista em política de defesa russa que rastreia os veículos “Z” desde que as tropas se começaram a concentrar às portas da Ucrânia, sugeriu que o símbolo se pode referir aos contingentes militares destacados para a luta no país. “Parece que as forças russas perto da fronteira estão a pintar símbolos, neste caso a letra ‘Z’, nos seus veículos, para identificar diferentes forças ou hierarquias", escreveu Lee, estudante de doutoramento no Departamento de Estudos de Guerra do King's College de Londres, no Twitter, a 19 de fevereiro.

Mas nos dias que passaram desde que Moscovo ordenou o ataque sangrento à Ucrânia, o que começou por ser um símbolo militar misterioso tornou-se um sinal de apoio popular à guerra da Rússia, e o que os analistas descrevem como o desenrolar de um novo e assustador movimento nacionalista.

Os russos pintaram o “Z” nos seus carros, usaram camisolas de capuz pretas estampadas com o símbolo e exibiram nas suas lapelas crachás improvisados com o “Z” - um sinal de que há algum apoio popular ao presidente russo Vladimir Putin e aos esforços deste de expandir a esfera de influência de Moscovo conquistando regiões da Ucrânia.

“As autoridades lançaram uma campanha de propaganda para obter o apoio popular para a invasão da Ucrânia e estão a receber muito apoio”, escreveu Kamil Galeev, investigador independente e antigo membro do Wilson Center, um think tank político apartidário de Washington DC, num tópico abrangente do Twitter sobre o uso do símbolo “Z” em vídeos de propaganda e pelos russos, nas redes sociais.

“Este símbolo inventado há apenas alguns dias tornou-se um símbolo da nova ideologia e identidade nacional russas”, acrescentou Galeev.

 

 

"Vamos falar sobre o que está a acontecer na Rússia. Simplificando, está a tornar-se completamente fascista. As autoridades lançaram uma campanha de propaganda para obter o apoio popular para a invasão da Ucrânia e estão a receber muito apoio. Podemos ver o “Z” nas roupas destes homens. O que significa isto?"

Enquanto o Kremlin aperta o controlo sobre qualquer notícia de vítimas ou reveses russos que chegue à Rússia - aplicando uma extraordinária nova lei que torna a disseminação de informações “falsas” uma ofensa punível com penas de prisão - os seguidores de Putin aumentam o seu apoio à guerra.

Num hospital de Kazan, uma cidade na região sudoeste do Tartaristão, na Rússia, pediram a crianças que estão a morrer de cancro que formassem um “Z” no exterior, na neve, para mostrar o seu apoio à operação militar russa.

“Os nossos pacientes e toda a equipa participaram, cerca de 60 pessoas no total. As pessoas alinharam-se para formar a letra ‘Z’”, disse em comunicado Vladimir Vavilov, presidente da instituição de beneficência contra o cancro que administra o hospital. “Na mão esquerda, temos panfletos com as bandeiras da RPL, da RPD, da Rússia e do Tartaristão, e fechámos a mão direita num punho.”

Vavilov referia-se à República Popular de Luhansk (RPL) e à República Popular de Donetsk (RPD), áreas controladas pelos separatistas no leste da Ucrânia, que Putin reconheceu no mês passado como estados independentes, como parte do pretexto para invadir o país.

O símbolo “Z” também surgiu entre os membros da câmara baixa do Parlamento Russo, a Duma.

Maria Butina foi condenada por servir como agente estrangeira não registada nos Estados Unidos, tentando infiltrar-se em círculos políticos conservadores de destaque, antes e depois das eleições de 2016. Agora, ela representa a região de Kirov para o partido político Rússia Unida, que apoia Putin, e apoiou a guerra em publicações no seu canal do Telegram.

Butina partilhou na plataforma um vídeo de si mesma a desenhar um “Z” branco na lapela do seu casaco, e atualizou o seu perfil com uma selfie com uma camisola preta com um “Z” branco.

“Continuem o bom trabalho, irmãos. Estamos convosco. Para sempre”, disse ela no vídeo, cerrando o punho.

Correspondentes do canal de notícias público da Rússia, o Rossiya-24, a reportar da Ucrânia, exibiram o “Z” nos coletes à prova de balas.

Imagens das principais cidades russas partilhadas no fim de semana mostram filas de carros com os “Z” brancos colados nas janelas, a buzinar e a agitar enormes bandeiras russas. No Campeonato Mundial de Ginástica em Doha, no Catar, o atleta russo Ivan Kuliak exibiu o símbolo no pódio, enquanto estava ao lado do ucraniano Illia Kovtun, que ganhou a medalha de ouro.

E em dois vídeos de propaganda habilmente produzidos que circulam nas redes sociais, jovens russos com t-shirts pretas e sweatshirts com capuz estampadas com a letra “Z” e a hashtag #СвоихНеБросаем, ou “nós não abandonamos os nossos (homens)”, agitam bandeiras russas e manifestam o seu apoio à guerra de Putin, cantando: “Pela Rússia, pelo presidente. Pela Rússia, por Putin!”

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