A tarefa mais difícil do Ocidente na Ucrânia: convencer Putin de que está a perder

CNN , Análise de Stephen Collinson
17 fev 2023, 08:00
Vladimir Putin (AP)

Terminar a guerra na Ucrânia em termos aceitáveis para o seu presidente Volodymyr Zelensky exigirá que o Ocidente convença o líder russo Vladimir Putin de que está a perder.

Boa sorte com isso.

Antes do aniversário da invasão russa, na próxima semana, os líderes norte-americanos e ocidentais preparam-se para uma demonstração de unidade e força destinada a estabelecer de uma vez por todas que a NATO está no conflito por muito tempo e até à derrota de Moscovo.

"A Rússia perdeu - perdeu estrategicamente, operacionalmente e taticamente", disse o presidente do Estado-Maior Conjunto Mark Milley na terça-feira. O secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, advertiu na quarta-feira que "Putin deve perceber que não pode vencer", ao justificar as razões que o levaram a apressar o envio de armas e munições para a Ucrânia. E Julianne Smith, embaixadora dos EUA na NATO, afirmou à CNN que Washington estava a fazer tudo o que podia para "continuar a exercer pressão sobre Moscovo (e Putin)".

E num artigo de opinião na CNN, o general reformado dos EUA e ex-chefe da CIA, David Petraeus, antecipou que o conflito terminaria numa "resolução negociada" quando Putin percebesse que a guerra é insustentável no campo de batalha e na frente interna.

A ofensiva retórica e diplomática do Ocidente aumentará ainda mais quando a vice-presidente Kamala Harris se dirigir à Conferência de Segurança de Munique esta semana. Enquanto isso, o presidente Joe Biden visitará, na próxima semana, a Polónia e um Estado na linha da frente da NATO e do ex-Pacto de Varsóvia, reforçando o seu legado de oferecer a liderança mais eficaz da aliança ocidental desde o fim da Guerra Fria.

Ver a guerra pelos olhos de Putin

Pela maioria dos padrões objetivos, Putin já parece estar a perder. Os seus objetivos de guerra de esmagar a soberania ucraniana, capturar Kiev, derrubar um governo eleito, provar o poderio russo e cortar as relações da Ucrânia com o Ocidente saíram pela culatra. A Rússia é um Estado pária e a sua economia está em ruínas devido às sanções internacionais. Putin está a ser considerado um criminoso de guerra. E longe de estar isolada do Ocidente, a Ucrânia encontra-se agora na extraordinária posição de ser efetivamente um Estado da NATO apoiado pelos EUA e pela Europa, cuja sobrevivência, mesmo que haja um eventual acordo de cessar-fogo, irá provavelmente exigir décadas de apoio ocidental.

No entanto, a lógica ocidental sobre o que está a acontecer na guerra pode apenas disfarçar a percepção da mentalidade de Putin. O líder russo há muito que vê o mundo através de uma lente estratégica e histórica diferente. Muitos observadores estrangeiros, embora não o governo dos EUA, convenceram-se que não era do interesse da Rússia invadir a Ucrânia - mas Putin foi em frente na mesma. Ele não mostra sinais de poder ser dissuadido por um ano de derrotas e um impressionante fluxo de armas e munições sofisticadas da NATO para a Ucrânia. Ele está a tirar presos das celas para a frente de batalha, condenando-os à morte em avanços fúteis ao estilo da Primeira Guerra Mundial, apesar de as forças russas já terem sofrido perdas maciças.

Esta guerra também não é uma mera disputa territorial da qual ele provavelmente desistirá de ânimo leve. Nasce da sua crença de que a Ucrânia não é um país e deve ser absorvida pela Rússia. A sua sobrevivência no poder pode também depender de não ser visto como tendo perdido. E enquanto o Ocidente diz que está em guerra a longo prazo, Putin já está em guerra na Ucrânia desde 2014, após a anexação da Crimeia.

Um conflito congelado que dure muitos mais anos e impeça a Ucrânia de se tornar um todo pode ser uma posição sustentável para ele. Ele já demonstrou que é indiferente a grandes perdas humanas. E, a julgar pela sua retórica, acredita estar envolvido numa luta geopolítica titânica com a NATO, vital para o prestígio da Rússia. A questão é saber se o Ocidente tem um apetite semelhante a longo prazo.

Uma fase crucial da guerra

Tudo isto explica porque é que os estrategas ocidentais veem a próxima fase da guerra como crítica, uma vez que as forças russas se preparam para uma aparente ofensiva primaveril e a Ucrânia aguarda a chegada dos tanques ocidentais recentemente prometidos, com que espera virar a maré.

A unidade e a permanência da NATO confundiram os céticos, em grande parte devido à liderança de Biden. Mas as condições políticas em Washington e nos países aliados não são estáticas e podem moldar o pensamento de Putin.

Na Câmara dos Representes dos EUA, por exemplo, alguns membros da nova maioria republicana estão nervosos. O deputado republicano da Florida, Matt Gaetz, exigiu na semana passada o fim da ajuda à Ucrânia e que os EUA exigissem que todos os envolvidos "chegassem imediatamente a um acordo de paz". Uma maioria bipartidária para salvar a Ucrânia ainda existe na Câmara e no Senado. Mas não é certo que Biden possa garantir pacotes multimilionários de ajuda para a Ucrânia perpetuamente. E a ajuda dos EUA pode estar em sérias dúvidas se o ex-presidente Donald Trump ou outro republicano ganhar as eleições de 2024.

Assim, embora os apoiantes da Ucrânia esperem avanços no campo de batalha, meses sangrentos de luta parecem mais prováveis.

A CNN noticiou esta quarta-feira que os EUA e os seus aliados acreditavam que era pouco provável que a ofensiva russa viesse a resultar em grandes ganhos no campo de batalha. "É mais ambiciosa do que realista", disse uma alta patente militar dos EUA. Há também dúvidas se as forças ucranianas têm capacidade para romper as defesas russas entrincheiradas nas áreas leste e sul de forma que possam ameaçar as pontes terrestres de Putin para a Crimeia. E Stoltenberg afirmou quarta-feira, na reunião dos ministros da defesa da NATO, em Bruxelas, que o conflito estava a tornar-se numa "guerra de atrito", pedindo aos aliados que apressassem o envio de munições para a Ucrânia.

Putin não pensa que está a perder

O mundo exterior sabe que Putin não está a contemplar uma derrota ou uma saída da guerra devido à total ausência de qualquer quadro diplomático para as negociações.

Stoltenberg também reconheceu que não há perspetivas de que esta situação mude tão cedo.

"O presidente Putin não mostra nenhum sinal de estar a preparar-se para a paz. Pelo contrário, ele está a lançar novas ofensivas e a visar civis, cidades e infraestruturas críticas", afirmou Stoltenberg em Bruxelas.

Fiona Hill, importante especialista em Rússia e Putin, que trabalhou na Casa Branca de Trump, disse numa audiência da Comissão de Serviços Armados do Senado na quarta-feira que havia poucos sinais de que a determinação de Putin estivesse a diminuir.

"Penso que este é um quadro bastante sombrio, em parte porque Putin não se sentiu dissuadido em primeiro lugar", apontou Hill. "A outra coisa é que Putin também sente que tem muito apoio do resto do mundo, incluindo da China... Pode muito bem levar países como a China a pressionar a Rússia para que haja qualquer ruptura na determinação de Putin."

Mas a perspetiva de a China pressionar Putin para o fim da guerra era remota mesmo antes do solavanco nas relações EUA-China causado pelo voo do balão-espião chinês pelos EUA.

E mesmo que Pequim possa ficar embaraçado com o desempenho de Putin na Ucrânia depois de os dois lados terem declarado uma parceria "sem limites" no ano passado, poderá ver uma vantagem em ver os EUA preocupados com uma guerra por procuração contra a Rússia, à medida que aumenta o seu desafio ao poder americano na Ásia.

No entanto, a secretária de Estado Adjunta dos EUA, Wendy Sherman, avisou Pequim na quarta-feira que uma aposta a longo prazo em Putin só trará decepção.

"Vai acabar com um nó na garganta", argumentou Sherman, num evento no Brookings Institution, think thank norte-americano, embora tenha admitido que os EUA estavam preocupados com o estreitar dos laços entre a China e a Rússia, numa altura em que está a travar confrontos simultâneos com cada potência.

"Os ucranianos vão representar um fracasso estratégico para Putin. E isso vai criar muitos problemas para aqueles que estão a apoiar esta invasão horrível daqui para a frente", disse.

O problema, porém, é que ainda não há sinais de que Putin esteja de acordo.

Relacionados

Europa

Mais Europa

Patrocinados